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Opinião

Produtividade - um dos grandes desafios da economia angolana

Laboratório Económico

A produtividade pode ser medida de maneiras diferentes, mas significa sempre a mesma coisa: fazer mais com os mesmos recursos ou fazer o mesmo com menos recursos.

O crescimento anual da actividade económica acontece pela combinação de capital (supostamente todos os anos aumenta o seu stock(1)), trabalho (igualmente admitindo-se o seu incremento, embora nem sempre seja positiva a relação emprego/crescimento) e melhoria da produtividade. Não existem outros factores de crescimento das economias (a terra pode ser incluída no capital numa acepção lata, sendo, porém, avisado ter presente as considerações de Adam Smith e David Ricardo quanto à lei do decrescimento da sua produtividade marginal por esgotamento ou deterioração da sua aptidão qualitativa).

Numa economia como a angolana, onde o investimento tem crescido a ritmos baixos (durante mais de uma década os aumentos significativos ocorreram no sector petrolífero - de influência e controlo estrangeiro - e nas obras públicas (investimento público) e não no investimento privado noutros sectores de actividade), pelo que se não alterou, significativamente, o stock de capital nacional (porque em última instância deve descontar-se a qualidade e o estado das construções realizadas no âmbito dos projectos do Estado, cuja duração média tem estado muito longe dos padrões de eficiência teoricamente recomendados), poderia pensar-se que tem cabido ao emprego (força de trabalho) a responsabilidade pelas taxas de crescimento da economia não petrolífera. No entanto, a taxa de desemprego nacional situa-se no intervalo 20%-26%, reflectindo, portanto, um colossal desperdício deste importante recurso de produção (2).

Ainda que se desconheça o valor da taxa de desemprego natural (ou também designada por taxa estrutural de desemprego), a conclusão, simples e imediata, é a de se estar perante uma potencialidade enorme de aumento dos ritmos de variação do PIB não petrolífero. Ou seja, com investimentos mínimos, podem obter-se ganhos significativos de crescimento da produção. Compulsando as estatísticas oficiais (e calculando-se o investimento privado não petrolífero pela combinação entre o petrolífero e o público), verifica-se que o comportamento do investimento privado não petrolífero tem sido muito errático, não sendo avisado tirarem-se ilações científicas quanto às suas causas, sem estudos aprofundados sobre este fenómeno.

Então aonde encontrar a explicação convincente para as elevadas taxas de crescimento do sector não petrolífero? Dos factores anteriormente referenciados, resta a produtividade, a quem caberia, portanto, o ónus duma explicação razoável e aceitável desses comportamentos ascendentes(3) . Entretanto, não tem sido assim.

Usando dados oficiais quanto aos valores acrescentados sectoriais e ao emprego, a conclusão vai no sentido de níveis muito baixos da produtividade aparente do trabalho e, em alguns anos, com tendências de decrescimento, permanecendo inconclusiva a questão sobre os factores explicativos do crescimento do PIB não petrolífero. Acrescente-se que nem mesmo o Governo explica as fontes de crescimento do PIB não petrolífero nas suas projecções, não usando, ao que se saiba, nenhuma função de produção tipo Cobb-Douglas(4) .

Uma possível explicação para esta dificuldade de esclarecimento categórico pode estar na qualidade da informação estatística: serão verdadeiras as informações sobre o emprego e sobre os investimentos vertidas nas Contas Nacionais?( 5) Outra explicação pode estar na medição da produtividade: as informações estatísticas disponíveis apenas consentem uma aproximação ao valor da produtividade média aparente do trabalho, que pode ser insuficiente para se concluir acerca da sua capacidade de influenciar o crescimento económico.

Os economistas medem normalmente a dinâmica da produtividade a partir da chamada produtividade total dos factores (PTF), isto é, e como lhe chamou Robert Solow "a medida da nossa ignorância", descontadas as contribuições do capital e do trabalho. Mas para isso é, como se disse, indispensável a existência de uma função de produção de Cobb-Douglas(6). Talvez mesmo em termos de PTF a sua medição padeça de obstáculos vários (metodológicos e estatísticos), mesmo nas economias desenvolvidas.

João Silvestre e Jorge Nascimento Rodrigues na sua crónica de opinião no Semanário Expresso, Caderno de Economia são de opinião que "a incapacidade de medição se possa dever ao tempo que centenas de milhões de pessoas gastam consumindo bens e serviços gratuitos na Internet"(7). Acrescentado que "estudos excelentes sobre o problema dão sinais muito contraditórios sobre o que se passa, pelo que estamos muito longe de entender as tendências que modelam o crescimento"(8).

Produtividade e emprego podem ter uma relação antinómica, na medida em que a produtividade é obtida a partir do volume de emprego. O crescimento económico de um país pode resultar de um incremento simultâneo do emprego e da produtividade, da manutenção do emprego e do aumento da produtividade ou da conservação da produtividade e do aumento da força de trabalho utilizada no processo produtivo.

A situação ideal é a primeira - havendo que respeitar determinadas proporções nos correspondentes coeficientes técnicos - equivalendo a segunda situação a um modelo intensivo em capital (físico, científico e tecnológico) e a terceira a processos de fabrico intensivos em mão-de-obra. Os ganhos de produtividade - que posteriormente serão repartidos entre os factores de produção trabalho e capital, em determinadas combinações - dependem do quantitativo de mão-de-obra, da geração tecnológica dos instrumentos e ferramentas de trabalho, da competência do capital humano e da qualidade da governação corporativa das empresas e da economia.

Para um determinado volume de produção (micro ou macroeconomicamente considerando), quanto maior o emprego, menor será a produtividade e vice-versa, quanto maior a produtividade menor a quantidade de mão-de-obra utilizada. Por isso, a gestão do binómio produtividade- emprego, nas diferentes ópticas em que se apresenta, é de capital importância exigindo, complementarmente, informação estatística abundante e confiável.


Notas

(1) Um desafio para os investigadores e os departamentos de estudo dos diferentes Ministérios ligados às matérias económicas é o do cálculo/estimativa do stock de capital fixo da economia angolana. Na ausência deste resultado, a escolha das mais actuantes e eficientes políticas de incentivo da produção e de criação de emprego fica no vazio, acabando por serem definidas em função de ideias feitas nem sempre científicas e aplicáveis universalmente.

(2) Um exercício simples de relacionamento entre o crescimento do PIB, o emprego e a produtividade ajuda a estimar os ganhos associados a um aumento da taxa de emprego (políticas activas de emprego, como acesso fácil e com redução de custos do financiamento bancário, melhoria do ambiente de negócios, fomento do empreendedorismo, formação profissional, facilitação na criação de empresas, cultura/atitude do trabalhador): variando a uma taxa media anual de 6,5% o emprego e a da produtividade (ganhos de produtividade) a 1,5%, a taxa média anual de incremento do PIB podia situar-se em 8,5%.

(3) "Apesar da revolução tecnológica, a capacidade de produção das economias desenvolvidas está quase estagnada e nos mercados emergentes está mesmo a cair", João Silvestre, Expresso, Caderno de Economia, 28 de Julho de 2018.

(4) "O Plano Nacional de Desenvolvimento 2018-2022 apresenta as seguintes estimativas de crescimento do PIB não petrolífero: 2,4% em 2018, 4,4% em 2019, 5% em 2020, 6,2% em 2021 e 7,5% em 2022, sem esclarecer de que modo serão obtidas, ou seja, quais as participações do capital, do emprego e da produtividade. A não ser que o Governo as possua e tenha decidido não divulgar.

(5) Têm sido publicamente apresentadas em artigos de opinião algumas incongruências sobre as informações oficiais de criação de postos de trabalho no país.

(6) O CEIC da UCAN está a trabalhar sobre estas questões, e apresentará no Relatório Económico de 2018 algumas conclusões sobre os factores de crescimento da economia não petrolífera.

(7) Esta constatação/observação foi feita por Robert Solow num artigo célebre intitulado "Vêm-se computadores por todo o lado menos nas estatísticas da produtividade" e parece ter sido acolhida pela literatura económica como o Paradoxo de Solow.

(8) Jorge Nascimento Rodrigues e João Silvestre, Semanário Expresso, Caderno de Economia, de 28 de Julho de 2018.