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Opinião

Angola 2019 - os limites do crescimento económico poderão agravar-se

Laboratório Económico

Segundo as mais recentes abordagens sobre o comportamento da economia mundial e a sua capacidade de prosseguir numa linha de crescimento desde 2016, parece perfilarem-se no horizonte de 2019 indícios de que nova crise mundial se projecta para 2020, provavelmente mais intensa do que a maior recessão dos últimos anos, ocorrida em 2009.

Apesar de o FMI e o Banco Mundial preverem taxas de crescimento da economia mundial acima de 2,8% até 2021, economistas como Nouriel Roubini (conhecido como "economista das desgraças", lembrando que foi ele quem primeiro, e com alguma antecedência, alertou para a crise do "subprime" de 2008/2009) e Brunello Rosa da London School of Economics (1) acreditam existirem razões para um abrandamento do crescimento económico mundial a partir de 2019: a escalada da guerra comercial entre a China e os Estados Unidos (o FMI já tem estudos sobre os efeitos negativos mundiais deste conflito desencadeado por Donald Trump), o "braço-de-ferro" entre a Administração Trump e a Reserva Federal americana quanto ao aperto da política monetária, a desagregação da Europa depois do Brexit, a ascensão dos radicalismos e populismos nas democracias europeias, as incertezas quanto às eleições americanas de 2020 e o trauma da Europa dos 29, cujo PIB vai ser ultrapassado pelo da China.

Mas, em Angola, os riscos para a retoma do crescimento económico serão acrescidos pelo aumento da pobreza e a continuação do modelo de redistribuição do rendimento que ainda não sofreu ajustamentos de monta, permanecendo o essencial da desigualdade proveniente da governação anterior.

O PIB por habitante vai continuar em valores baixos até 2022, prevendo-se para 2019 um valor de 3.290 USD. Mas o mais sério é que os incrementos anuais desta grandeza vão, anualmente, diminuindo até final da presente legislatura, permitindo, portanto, concluir-se que o crescimento económico não vai gerar rendimento suficiente para distribuir mais e melhorar as condições de vida da população(2). Como já tenho afirmado, os angolanos empobrecem a cada ano que passa, um péssimo sintoma para a criação de um mercado interno de dimensão razoável que sustente a substituição das importações.

O Governo prevê uma taxa de crescimento para 2019 de 2,5%, em consonância com o FMI (o Banco Mundial corrige-a em alta para 2,9%(3)). No entanto, esta e as projectadas até 2022 necessitam de ser revistas na medida em que tiver sido registada uma recessão em 2018 (-1,7% para o FMI e -1,8% para o Banco Mundial), aguardando- se pelas informações das Contas Nacionais(4).

Nesta perspectiva, a economia provavelmente não vai crescer tanto quanto o Governo e o FMI prevêem até 2022, sendo mais consistentes as antevisões do Banco Mundial (2,6% em 2020 e 2,8% em 2021(5)). Mas, ainda assim, como obter uma taxa de 2,5% neste ano num cenário de altas taxas de juro, montante elevado de juros da dívida pública, total (30% das despesas governamentais) e interna (15% do total das despesas públicas) e um incremento de 34,5% nas verbas orçamentais alocadas genericamente a outras despesas públicas?

Vistos de outro ângulo, estes entraves ao crescimento (efeito "crowding out") tornam- se mais expressivos se comparados com a receita fiscal não petrolífera, representando os juros da dívida pública, em 2019, 102,7%. Ou seja, a dependência fiscal do Estado das receitas do petróleo acentua-se em vez de diminuir, valendo, afinal, por constatar duas coisas: a dinâmica de crescimento e de criação de riqueza (salários, lucros, etc.) do sector não petrolífero não tem correspondido ao esperado, nem às medidas que o Estado tem tomado no sentido da diversificação da economia e a Reforma Tributária não tem produzido os resultados criados pelas expectativas colocadas sobre si(6). As estatísticas aparentemente o confirmam: a fiscalidade não petrolífera vai passar de 7,9% do PIB em 2014, para 4,7% em 2019, de acordo com as estimativas do Fundo Monetário Internacional(7).

Em 2019, a dívida pública total representará praticamente 80% do PIB e 113,4% do PIB não petrolífero (se não houvesse petróleo, a economia angolana estaria praticamente falida). Uma vez mais, a dependência do petróleo e a incapacidade da economia nacional em criar mecanismos e condições que a libertem de influências nefastas e promovam o crescimento em bases sistémicas e sistemáticas. Será difícil resolver a questão cambial do País (dando-lhe a estabilidade necessária para facilitar o funcionamento da economia não petrolífera) apenas com a substituição das importações, sem se ponderar a sua eficiência.

A poupança de divisas pela redução das importações apresenta limites dados pela elevada componente importada da produção nacional, o que deve estar a influenciar (em contexto de dificuldade de acesso à moeda externa) a capacidade de crescimento do sector não petrolífero (0% em 2018 e 2,2% em 2019).

Por outro lado, as exportações não minerais continuam pífias, prevendo-se que atinjam uma cifra de apenas 221 milhões USD em 2019. Incluindo-se os diamantes, a situação não melhora substancialmente (1.351 milhões USD ), para ajudar a preencher as necessidades de financiamento da economia nacional, estimadas em 7.248 milhões USD, segmentados em défice da conta corrente e amortização da dívida externa(8). Os principais motores do crescimento do PIB até 2022, segundo a óptica oficial(9), vão ser o consumo final (público e das famílias) e a formação bruta de capital fixo.

As exportações perdem peso nestas projecções do Governo, na medida em que se estabelecem taxas de crescimento negativas para a produção petrolífera e de gás (em média anual - 2% para 2018-2022). Como é do conhecimento geral, as exportações de petróleo foram durante muito tempo o principal factor de dinamização do PIB e, a despeito das expectativas menos favoráveis, ainda continuarão a sê-lo por algum tempo (o aparecimento de outras produtos na pauta das exportações requer tempo, capacidade empresarial de competição nos mercados externos e gestão do trinómio preço-qualidade-marketing).

A dinâmica de variação da formação bruta de capital fixo está estabelecida em 2,7% ao ano, não se conhecendo o valor atribuído à sua eficiência marginal (via de regra, expresso pelo ICOR, coeficiente capital-produto). Admitindo um valor médio de 2,75 o investimento total deveria variar em média anual 8,25% (para uma taxa média anual de crescimento do PIB de 3%).

Para o consumo final (público e das famílias) o PDN 2018-2022 estabelece uma taxa média anual de variação de 3,1%. Atendendo ao reduzido valor do PIB por habitante e ao seu comportamento descendente até 2022, esta variação anual acima de 3% vai ter de ser assumida pelo gasto público, nomeadamente pela via dos salários dos funcionários públicos.

Notas
1. Quando Chega a Próxima Crise - Jorge Nascimento Rodrigues, Semanário Expresso, Caderno de Economia, 5 de Janeiro de 2019.

2. Incrementos anuais do PIB por habitante em USD: 2018 = -621; 2019 = - 400; 2020 = 97; 2021 = 6.

3. World Bank - Global Economic Prospects, 2019.

4. No entanto, tudo aponta para esse valor, atendendo às informações relativas aos comportamentos do primeiro semestre que apontavam para uma quebra geral da actividade de cerca de 7%.

5. No Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022 está prevista uma taxa média anual de crescimento do PIB de 3% entre 2018 e 2022, que necessariamente baixa para 1,96% se a recessão de 2018 for confirmada.

6. Os empresários (angolanos e estrangeiros) queixam-se das atitudes policiais dos agentes da AGT na procura de dinheiro a qualquer preço, quando as unidades produtivas se debatem com problemas graves e diversos para garantires a produção e os postos de trabalho.

7. IMF Country Report Nº 18/370, de Dezembro de 2018 e intitulado ANGOLA - Request For An Extend Arrangement Under The Extend Fund Facility.

8. IMF Country Report Nº 18/370, de Dezembro de 2018 e intitulado ANGOLA - Request For An Extend Arrangement Under The Extend Fund Facility.

9. Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022.


(artigo publicado na edição 507 do Expansão, de sexta-feira, dia 18 de Janeiro de 2019, disponível em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)