Produtos sustentáveis a partir de sucata de pneus
No México, 40 milhões de toneladas de pneus são descartados por ano. Os empreendedores locais estão a lidar com a contaminação reutilizando este material para criar revestimento, materiais de construção e um substituto do diesel
Mil milhões de pneus são produzidos todos os anos no mundo, além dos 4 mil milhões que actualmente estão em aterros sanitários, de acordo com um relatório do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD) sobre pneus em fim de vida (ELT, end-of-life tyres).
Se a Coreia do Sul, os Estados Unidos e a União Europeia têm um índice de recuperação de ELT de 85%, a história é completamente diferente nos países em desenvolvimento. No México, por exemplo, apenas 10% dos 40 milhões de toneladas de pneus descartados anualmente são reciclados. O restante acaba em aterros, rios ou nas ruas, de acordo com a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Naturais do país.
Mas algumas empresas mexicanas - como Granutec, Trisol e HM Energy Mexico - estão a reutilizar esses pneus para produzir revestimento impermeável, piso e uma alternativa de combustível ao diesel, criando modelos de negócios enquanto combatem a poluição.
Usar processos mecânicos para reciclar o material em vez de queimá-lo evita a libertação de CO2 na atmosfera, um dos principais agentes das mudanças climáticas. No ano passado, as emissões de CO2 atingiram o recorde de 405 partes por milhão, segundo a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica.
Magda Espinosa, director geral da Andellac, a associação mexicana de revendedores e distribuidores de pneus, destaca que a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Naturais publicou regulamentação oficial há três anos para que produtores de pneus e logistas reciclem os seus produtos. O objectivo é ter 14 milhões de pneus reciclados num período de 5 anos. Até agora, 5,4 milhões foram reciclados, o que corresponde a 1,8 milhões por ano.
A Granutec é uma empresa familiar sediada em Ecatepec, no México, que começou a operar há 40 anos sob o nome Central Hulera Álvarez, reciclando pneus para produzir sola para sapatos e botas para os agricultores. No início, apenas 40% das suas matérias-primas eram provenientes de reciclagem, mas eles desenvolveram um revestimento impermeável e ecológico que permitiu criar os seus produtos inteiramente a partir de sucata de pneus.
A empresa processa 120 toneladas de pneus todos os meses na sua fábrica e tem uma capacidade de reciclagem de 400 toneladas no seu centro de armazenamento. No último ano, os seus lucros aumentaram 40%.
Basta um único pneu para produzir um balde de 19 litros de revestimento impermeável que, uma vez aplicado, pode cobrir até 20 m2. É um processo ecológico, pois não envolve a queima de pneus. "Usamos parafusos com rolete para triturar o material. Depois, separamos o encordoamento do talão do pneu usando ímãs, e então obtemos a fibra têxtil", diz Alvarez. Finalmente, adicionam um selante à borracha granulada e ao pó para criar o revestimento à prova d"água.
A empresa também fabrica pisos de borracha e tintas de vinil e, actualmente, procura expandir-se por todo o México, num modelo de franquia.
Em 2011, Andrés García Gasca fundou a Trisol, empresa que fabrica tapetes, divisórias, pistas de corrida, estradas e revestimentos impermeáveis a partir de sucata de pneus. Assim como a Granutec, a Trisol usa um processo mecânico para separar metal, fibras têxteis e borracha, produzindo borracha granulada de diferentes tamanhos que se transforma nos produtos da empresa para a linha GreenOutdoors.
O piso de borracha da empresa pode ser encontrado dentro do habitat dos elefantes no Zoológico do Governo do México. O material pode resistir a até 8 toneladas de peso e melhorar as condições de temperatura dentro do habitat, minimizando a artrite dos elefantes e permitindo um melhor descanso.
"Só é preciso um pneu para criar 2 m2 de piso. Para o habitat dos elefantes, por exemplo, usamos 500 pneus, reduzindo consideravelmente o seu impacto ambiental", explica García.
A empresa possui duas fábricas no México, em Tultitlán e em Ixtapaluca. Juntas, elas processam 30 toneladas de pneus todos os meses, diz Adrián Zavala Valadez, o mais novo parceiro da Trisol. Ele acrescenta que a empresa recicla 3 mil toneladas adicionais por mês graças a uma parceria com uma empresa americana (cujo nome Valadez prefere não divulgar).
A empresa HM Energy, sediada em Monterrey, transforma sucata de pneus numa alternativa de combustível ao diesel para caldeiras, aço reciclado e fuligem.
"É um processo térmico. O pneu, cortado ao meio, entra num reactor com capacidade de 10 toneladas, onde o oxigénio é extraído e a temperatura sobe a até 520°C. Como resultado, o hidrocarboneto evapora do pneu e condensa-se até obter um substituto do diesel. O aço fica dentro do reactor. A partir deste processo, fazemos fuligem", diz Israel Magaña, co-fundador da HM Energy.
Na sua fábrica em Nuevo León, a empresa processa 10 toneladas de pneus por dia. "Os nossos produtos poupam ao ambiente cerca de 35% do CO2 das emissões de diesel, 98% do aço e outros 98% de fuligem", afirma Magaña. Estas economias chegam a 6,7 vezes o equivalente de CO2 absorvido por todas as árvores do Central Park, em Nova York.
A empresa começou a operar em 2016 e agora espera construir a sua segunda fábrica de processamento em Mérida, Yucatán, para alcançar uma produção total de 15 milhões de litros de combustível ecológico por ano, poupando ao planeta anualmente 38 mil toneladas de emissões de CO2.
(artigo publicado na edição 512 do Expansão, de sexta-feira, dia 22 de Fevereiro de 2019, disponível em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)
Nota: Pelo segundo ano, o Expansão integra o projecto Solutions&Co que, este ano, arrancou a 3 de Dezembro, data de início da COP 24, Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas. Durante várias semanas, divulgamos projectos empresariais amigos do ambiente de vários países.