Linhas de financiamento
A transparência, tão propagada pelo Governo, não tem apenas a ver com palavras ou com actos, mas muito com a clareza das informações que são disponibilizadas à sociedade civil, para que não se fique com a ideia que há assuntos que continuam a ser tratados atrás da cortina.
Nesta senda, parece- me evidente que seria aconselhável que pudéssemos ter acesso a determinados dados. Por exemplo, as linhas de financiamento. Pouco interessa se foram aprovadas muitas ou poucas.
Não é a dimensão nem o valor global que esgota este assunto. Importante é saber quais são as que existem, quais as que estão a ser utilizadas, a forma como se processa o acesso às mesmas (obrigações contratuais), o que se comprou com as mesmas (por que que preços e a quem) e por onde circulou esse dinheiro (se passou ou pelo sistema bancário e financeiro angolano). E ainda, quem assinou essas ordens de compra e pagamento.
Pode até parecer transparência a mais, mas a verdade é que no limite são os filhos e os netos de nós todos, e não apenas dos envolvidos, que vão pagar as ditas linhas. E pelo menos devíamos todos ter a noção do montante e da forma como foram contraídas as dívidas que possamos explicar aos nossos o que lhe vamos deixar para pagarem.
Por exemplo, o País compra um mega-equipamento por x milhões de dólares através de uma linha de financiamento de um qualquer fundo. O preço que nos custou é importante, claro. Mas também é muito importante perceber se fomos obrigados a comprar a um determinado fornecedor, qual é o preço de mercado dos equipamentos similares, que condições de assistência pós-venda, quando nos custou abrir essa linha de financiamento, que juros vamos pagar, que garantias tivemos que dar, que prazo para pagar esse valor, como foi feito o pagamento (se o dinheiro foi transferido para as Contas do Estado e depois foi feito o respectivo pagamento, como dizem as regras internacionais de compliance), se o dinheiro circulou por bancos comerciais ou outras instituições financeiras, etc.
Resumindo, as informações sobre as linhas de financiamento deviam ser públicas, e em prol da tão propagada transparência, não deviam ser apenas notícia quando são apresentadas. E fica aqui o desafio ao Governo - o Expansão disponibiliza dois jornalistas seniores para recolher toda a informação e as páginas do jornal para publicar o material recolhido, se o Governo afastar a cortina e nos deixar entrar nesse dossier. Era também uma maneira de tornar público uma informação, que na verdade, e como expliquei, diz respeito a nós todos. E aos nossos filhos e aos nossos netos...
Editorial da edição 540 do Expansão, de sexta-feira, dia 6 de Setembro de 2019, já disponível em papel ou em versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui.