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África

Crimes referenciados pela Comissão da Verdade vão ser investigados na África do Sul

30 anos depois

Na década de 1990, com as primeiras eleições democráticas e multirraciais ganhas por Nelson Mandela, o apartheid foi oficialmente abolido. Entre 1994 e 1999 foi constituída a Comissão da Verdade, liderada pelo Bispo Anglicano Desmond Tutu, cuja missão era documentar crimes cometidos por ambas as partes do confronto durante o período do apartheid.

No entanto, a maioria dos crimes cometidos durante o regime segregacionista, apurados e sobre os quais a Comissão da Verdade teria recomendado investigações, permanecem sem solução. No total, são cerca de 300 crimes não esclarecidos.

As expectativas geradas há cerca de 30 anos, sobre a criação de uma espécie de tribunal semelhante ao de Nuremberg, para julgar os crimes cometidos em nome do apartheid, viram-se goradas por um contexto político tenso em que ameaças de caos proferidas por ex-integrantes do regime racista, influenciaram o entendimento de que o julgamento de tais crimes naquele contexto não constituía a via mais recomendável para lidar com o passado (então) recente.

No entanto, o formato e as balizas jurídicas da Comissão da Verdade, não resultaram na adopção de uma amnistia pelos crimes apurados. Logo, considerando a estagnação dos referidos processos por opções políticas, as famílias de algumas vítimas, ávidas por justiça, acionaram os tribunais.

Em 2017, os familiares de Ahmed Timol, um activista político e membro do Partido Comunista sul-africano, preso e morto em 1971, enquanto se encontrava sob tutela policial, e cujas causas da morte, foram consideradas pelos magistrados da época, como sendo suicídio, 45 anos depois requereram junto do juiz BillyMothle, a realização de um segundo inquérito. As investigações ordenadas pelas entidades judiciais, concluíram que Ahmed Timol teria sido empurrado da sala 1026 da John Vorster Square em Joanesburgo com a intenção de matá-lo, acto que teria sido precedido de tortura. Foi ainda conclusão do juiz Mothle, que o ex-polícia do regime do apartheid, João Rodrigues, era um dos responsáveis.

A 30 de Julho de 2018 Rodrigues foi preso e acusado do assassinato de Timol, solto posteriormente, mediante o pagamento de uma fiança de 1.000 Rands. O pedido de suspensão permanente da acusação, interposto pela defesa de Rodrigues, adiou o julgamento que, depois da rejeição da referida apelação pelo Tribunal Superior de Gauteng, o acusado recorreu para o Supremo Tribunal de Recurso que por sua vez recusou o "pedido de suspensão permanente da acusação". A justificação refere que esta decisão priva a sociedade de reclamar contra a transgressão de regras, premissa considerada por esta instância judicial, como sendo "uma característica tão central de qualquer democracia e que nunca deve ser diluída ou distorcida".

O precedente criado com a luta jurídica da família de Ahmed Timol, tem despertado outras vítimas a correrem atrás de justiça pelo esclarecimento de acontecimentos que abalaram a vida de milhares de sul-africanos, e prevê-se que o Ministério Público abra um processo de acusação sobre outros crimes do período do apartheid.

(Leia o artigo integral na edição 632 do Expansão, de sexta-feira, dia 9 de Julho de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)