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Opinião

A crise petrolífera e a capacidade de Angola atrair investimento directo estrangeiro

Análise

Por esta altura já deve ser mais facilmente assimilável que é através da dependência ao sector petrolífero que os choques externos afectam a economia angolana.

Depois de ter registado uma queda de cerca de 50% de Junho a Dezembro de 2014, o preço do barril do crude tem oscilado em torno dos 45 USD a 60 USD durante o ano de 2015.

Embora se tenha revisto o OGE o mais rápido que se pôde, fixando-se o preço de referência do barril do petróleo em 40 USD, o mal já estava feito e os seus efeitos têm agudizado à medida que caminhamos para o final do ano. A incapacidade do BNA em atender a demanda por divisas da economia, devido à redução significativa nas Reservas Internacionais Líquidas (RIL), é dos efeitos mais salientes da crise petrolífera que o País atravessa desde meados de 2014.

O BNA foi obrigado a adoptar uma estratégia de desvalorização gradual do kwanza, que registou uma desvalorização acumulada de pelo menos 30% de Janeiro a Setembro de 2015 no mercado formal e mais do que 50% no informal.

Embora esteja claro que o País está em crise e começa a ficar evidente que não dispõe de amortecedores capazes de amaciar o efeito da queda, existem muitas vozes optimistas que afirmam que os "nossos fundamentos macroeconómicos continuam sólidos", que "o País tem rumo", "a crise é uma grande oportunidade para diversificarmos a economia" ou ainda que continuaremos a atrair investimento directo estrangeiro (IDE), o qual será fundamental para que Angola saia da actual crise.

O Financial Times publicou, recentemente, que Angola foi o segundo maior destino de IDE bruto em África, em 2014, com cerca de 16 mil milhões USD, apenas suplantada pelo Egipto, onde aquele valor foi 2 mil milhões USD superior. Na verdade, desde 2008 as entradas de IDE bruto em Angola têm rondado os 13 mil milhões USD em média anual.

Mas a maior parte daquele investimento foi canalizada para o sector do petróleo e gás, contribuindo para que se aumentasse a dependência deste sector como principal fonte de receitas orçamentais e de RIL.

Quando se olha para o IDE líquido, percebe-se que a saída de capital tem suplantado a entrada, o que explica o défice registado na conta financeira e de capital nos últimos anos. O valor acumulado de IDE de 2002 a 2014 foi cerca de 149 mil milhões USD, embora concentrados maioritariamente no sector petrolífero, terão sido determinantes para o crescimento económico em Angola.

Um dos principais factores de atracção do IDE é o potencial de crescimento do mercado interno. A FDI Markets (Greenfield investment data service) afirma que 57% das empresas estrangeiras que investem em África apontam para aquele factor como sendo o primeiro a considerar na decisão de investimento. As previsões das instituições financeiras internacionais e mesmo do Governo angolano vão no sentido de um abrandamento da capacidade de crescimento da economia. Segundo o FMI, até 2020, a taxa média anual de crescimento andará entre 3% e 5%.

Julgando apenas pelo potencial de crescimento da economia, a capacidade de Angola de atrair IDE diminuirá substancialmente. No período 2003-2008, a economia angolana cresceu em média anual 9,8%, e o IDE líquido para o mesmo período foi em média mais de 74 milhões USD/ano.

Em 2009, o saldo foi positivo em mais de 2 mil milhões USD, as limitações nas transferências de capitais impostas naquele ano devido ao efeito da crise financeira que eclodira um ano antes terão jogado um papel crucial.

Depois de 2009, o saldo tem vindo a deteriorar-se a uma escala alarmante. Embora as entradas estejam a aumentar anualmente, as saídas têm aumentado mais do que proporcionalmente, através do repatriamento dos lucros e de avultados investimentos angolanos no exterior. Depois da crise de 2008/2009, o défice da balança de capitais tem-se agudizado, e nem a recuperação da estabilidade na maior parte dos macroeconomic fundamentals a partir de 2010 tem contribuído para a inversão desta tendência.

No período 2010-2014, a economia cresceu ao ritmo anual médio de 4%, e para o mesmo período o IDE líquido foi deficitário em cerca de 8,5 mil milhões USD por ano. A rápida recuperação do preço do petróleo no mercado internacional a partir de 2010 permitiu que a economia voltasse a registar superavits orçamental e comercial, reduzisse a inflação, recuperasse os níveis de RIL e diminuísse o peso da dívida pública sobre o PIB.

O que demonstra a estreita relação entre o comportamento do preço do petróleo e a saúde da economia. A má notícia é que o preço do barril do petróleo não recuperará tão rapidamente tal como aconteceu em 2009, uma vez que a causa da actual crise petrolífera não é apenas uma redução na procura, mas uma combinação de factores onde o excesso na oferta de crude no mercado internacional se destaca.

Questões de natureza geopolítica e geoestratégica e o abrandamento da capacidade de crescimento da China e de outros emergentes poderão contribuir, de igual modo, para que o preço do barril do petróleo não atinja os altos níveis do passado. Para além do tamanho do mercado interno e do seu potencial de crescimento, factores como transparência governativa e nível de corrupção, eficiência das instituições e qualidade das infra-estruturas desempenham um papel crucial que determina a alocação geográfica do IDE.

A partir deste momento o factor que determinará a atracção de IDE e a recuperação da economia será a indicação de que o País está seriamente comprometido em melhorar o ambiente geral de negócios, eliminando constrangimentos como o excesso de burocracia, ineficiência das instituições, o fornecimento intermitente de energia eléctrica, falta de qualidade das infra-estruturas, escassez de mão-de-obra qualificada, etc.

Factores que concorrerão para a redução dos custos de produção interno e aumento da produtividade e competitividade geral da economia. Entretanto, é imprescindível que a gestão da política pública seja feita num clima de total eficiência, parcimónia, transparência, responsabilização, na base da meritocracia, da solidariedade intergeracional objetivando a todo o momento o combate à pobreza, às assimetrias regionais, a melhoria na distribuição de rendimentos e o melhoramento constante do padrão de vida dos angolanos.

Para tal deve haver coragem para se iniciar profundas reformas económicas, sociais e institucionais no sentido de alterar o paradigma de governação do País de um modelo que privilegia a manutenção do poder instalado para um modelo que prioriza a melhoria do bem-estar social dos angolanos.

*Investigador assistente CEIC-UCAN