"Em muitas áreas não avançamos porque não conseguimos manter um diálogo"
A conversa entrou pelo jornalismo e comunicação social e resvalou, naturalmente, para temas bastante actuais, como são os casos da digitalização das economias, protecção de dados e cibersegurança.
Acredito que a maioria das pessoas que o conhecem associam-no mais ao jornalismo, onde apresenta uma carreira longa, com passagem por vários jornais e publicações, do que ao Direito.
Comecei no Agora, com o Aguiar dos Santos, uma das figuras mais marcantes do jornalismo das últimas décadas. Dali parti para a Economia & Mercado, numa trajectória que passa pela economia, cultura, sempre andei um pouco por aí. Tanto é que também frequentei a Faculdade de Economia. Mas as coisas não correram bem com os números, então passei para as letras. A minha paixão pelas letras é que me leva ao jornalismo. Eu sou um leitor de jornais desde que me conheço, acho que desde a sétima classe. Devo ter um dos maiores arquivos de jornais do País.
Quando começou a construir o seu arquivo pessoal?
Desde aquela altura, porque havia mesmo essa ideia sacrossanta de guardar o jornal ou a revista e reler, sublinhar e tudo mais. É isto que me leva ao jornalismo. Quando abordei o Aguiar, como queria escrever para o Agora, ele perguntou-me se eu lia jornais. Eu disse que sim, que o lia a ele e a toda a malta que escrevia no Agora, incluindo a sua coluna chamada "Fio de Prumo". Ele olhou para mim e disse: "Olha, estás contratado. És diferente dessa malta aqui". Foi assim que comecei no jornalismo, onde fui fazendo carreira ao longo de 18 anos. A minha passagem pela empresa Edições Novembro começou há 11 ou 12 anos e terminou agora, depois de dirigir o jornal Cultura.
Qual foi a motivação para mudar do jornalismo para a advocacia e, mais especificamente, para a área da protecção de dados e cibersegurança?
Foi o próprio jornalismo que propiciou isto. Ou seja, eu fui acompanhando a evolução das tecnologias, o impacto que as tecnologias tiveram na comunicação social, desde as plataformas digitais, os vídeos...
Faz parte de uma geração dividida entre duas eras: começa a fazer jornalismo sem internet e apanha a transição para o digital.
Continuo a preferir ler o jornal em papel, a revista em papel, mas essa mudança é incontornável. Foi mesmo essa transformação que a comunicação social sofreu que me trouxe até à área do Direito das Tecnologias. É algo que eu conheço, preocupa-me bastante, acompanho. E quando pensei em especializar-me, não tive dúvidas, não tive outra ideia que não fosse olhar para o campo digital.
Mesmo numa fase mais recente, projectos como o Novo Jornal e o Expansão (no final da primeira década de 2000) inicialmente não tinham website.
Os órgãos de comunicação social estão na idade da pedra em relação ao que se passa nas plataformas digitais. Porque quem domina hoje não são os órgãos tradicionais, e é preocupante, por exemplo, quando falamos em disseminação de notícias falsas ou de informações falsas. Mas é o que acontece, porque ao longo desse período, os órgãos tradicionais, estrategicamente, não souberam aproveitar o espaço que lhes é devido.
Ainda estamos num modelo híbrido, onde o papel convive com o digital, mas também continua a haver alguma dificuldade em encontrar um novo modelo de negócio?
Essa pergunta é muito interessante, porque quando olhamos para a precarização da profissão, tem muito a ver com isto. Por exemplo, a Angop, pelos custos que tem e pelo facto de estar espalhada pelo País inteiro, com uma estrutura pesada, não consegue, digamos assim, atender melhor as condições de trabalho dos seus profissionais. A empresa perdeu-se no tempo, não conseguiu estrategicamente rentabilizar a sua actividade com essa visão multimédia, digital, com as plataformas e tudo mais. Mas quem vai pôr anúncios num papel que não circula?
Algumas marcas ainda querem manter-se no papel. Mesmo que também invistam no digital.
A questão dos multicanais é importante e percebemos isso, porque os meios de comunicação tradicionais continuam a manter alguma confiança. Nas plataformas digitais ainda há esta ausência e alguma falta de profissionalismo. Em alguns casos nem é profissionalismo, porque não são jornalistas. E aqui também é preciso alguma regulação mais eficaz.
Leia o artigo integral na edição 846 do Expansão, sexta-feira, dia 03 de Outubro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)