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Opinião

A desburocratização do processo disciplinar em Angola

CONVIDADOS

Das seis medidas disciplinares constantes no art.º 87.º da Lei Geral do Trabalho, em vigor em Angola, a aplicação de quatro delas fica, sempre, dependente da instauração de um procedimento disciplinar, cuja tramitação está prevista no art.º 88.º do diploma já supramencionado.

Acontece que o nosso procedimento disciplinar é excessivamente burocrático, com prazos peremptórios, cuja violação provoca, em muitos casos, a nulidade do referido procedimento.

E, quando assim acontece, quase sempre em tribunal, o empregador é obrigado, por sentença condenatória, a indemnizar o trabalhador e, em muitos casos, a reintegrá-lo. A prática tem demonstrado que só as grandes e médias empresas, porque dispõem de meios técnicos e humanos suficientes, estão em condições objectivas para usar, com facilidade, este burocrático procedimento disciplinar, porquanto podem alocar mão-de-obra especializada na arte de instaurar procedimentos disciplinares.

É o conhecido instrutor laboral, figura abominável e pouco querida nas lides empresariais, por ter a ingrata tarefa de conduzir processos disciplinares que, em muitos casos, terminam na aplicação da medida disciplinar mais gravosa, que é o despedimento disciplinar (vide alínea f ) do n.º 1 do art.º 87.º da Lei Geral do Trabalho).

As micro e pequenas empresas, cuja previsão classificatória decorre da Lei 30/11 de 13 de Setembro, não dispondo de suficientes recursos humanos, nem movimentando um cash flow considerável, não têm tido a possibilidade de integrar na sua força de trabalho um instrutor laboral, pessoa especializada na condução e aplicação de medidas disciplinares.

Como consequência, várias são as empresas, desde as grandes às micro, que vêem no procedimento disciplinar um bicho de sete cabeças, tendo em conta o formalismo legal a ele subjacente.

A revogação em juízo dos processos disciplinares, por estarem eivados deste ou daquele vício, têm consequências financeiras muito graves para os empregadores, quando a lei laboral diz que aplicar medidas disciplinares é uma prerrogativa do empregador.

Que paradoxo!

Se o que se pretende é efectivamente investir a entidade empregadora de poderes bastantes para punir os seus assalariados, o lógico seria que o exercício desse poder fosse rápido e simples, ao invés de o amordaçar com processos disciplinares prenhes de prazos e requisitos de natureza imperativa que, no dia-a-dia, se traduzem num cercear dos poderes do empregador.

Não conhecemos no mundo comercial ou empresarial um direito cujo exercício esteja tão condicionado como o exercício do poder disciplinar em Angola.

Paradoxalmente, a existência de procedimentos disciplinares rígidos, diz a prática, não se tem traduzido num aumento da produtividade nem da eficiência laboral, antes pelo contrário, países onde o Estado se abstém de intervir nas relações laborais apresentam níveis superiores de produtividade.

As normas jurídicas, das quais fazem parte as leis laborais, devem ser claras e de simples interpretação; de tal modo que não basta dizer que a entidade empregadora dispõe da prerrogativa de aplicar medidas disciplinares quando, na prática, a aplicação deste procedimento exige um sem número de formalidades que o grosso das entidades empregadoras, mesmo as grandes, encontram sérias dificuldades na sua aplicação. Em Angola, as consequências decorrentes de um excessivo intervencionismo público nas relações laborais são aquelas que nós conhecemos: a diminuição da produtividade e, consequentemente, o baixo nível de empregabilidade.

Com esta pequena nota que damos à estampa é nossa intenção chamar a atenção dos fazedores do direito, aos parlamentares, aos juízes, magistrados do Ministério Público, académicos e da comunidade, de modo geral, da necessidade de se agilizar o uso desta ferramenta que se traduz no direito de punir as entidades empregadoras, pois, repete-se, não basta prever em forma de lei, porquanto mais importante do que prever é tornar os direitos exequíveis.

**Evandro Bernardo e Gilberto Martinho, Advogados

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