Evolução da taxa de câmbio e implicações macroeconómicas em Angola no 2.º trimestre de 2025
A deterioração da produtividade, em ambiente competitivo, tende a resultar na depreciação da taxa de câmbio. Existe, portanto, uma relação direta entre estabilidade cambial e produtividade: países com baixa produtividade dificilmente mantêm estabilidade no nível geral de preços.
A taxa de câmbio é uma das principais determinantes da inflação em Angola. A economia nacional sofre de baixa produtividade, o que a torna dependente da importação de bens produzidos em países mais competitivos. Como escrevia [David] Ricardo no século XIX, o comércio entre as nações resulta das diferenças de produtividade. Assim, a deterioração da produtividade, em ambiente competitivo, tende a resultar na depreciação da taxa de câmbio. Existe, portanto, uma relação direta entre estabilidade cambial e produtividade: países com baixa produtividade dificilmente mantêm estabilidade no nível geral de preços.
A 11 de maio de 2023, a taxa de câmbio para o USD atingiu 508 (507,720), disparando a partir daí até alcançar 823 kwanzas por USD a 30 de junho (822,9401). Desde então, estabilizou, com pequenas variações até 833 kwanzas/USD em março de 2024, mas voltou a subir em setembro para 940 kwanzas/USD, um aumento de 13% em 180 dias. Em junho de 2025, corrigiu em baixa para 911,955. Desde julho de 2024, a taxa de câmbio nominal foi fixada de forma pouco ortodoxa. Ainda assim, até dezembro, houve flutuações, atingindo novo pico no 3.º trimestre (940,11 kwanzas/USD). Em 23 de dezembro, o BNA fixou a taxa de câmbio em 912,000, regime que se mantém até agosto de 2025. No 2.º trimestre de 2025, o câmbio foi "autorizado" a valorizar apenas alguns milésimos de kwanza, sinal de que está efectivamente controlado pelo BNA ou pelo próprio Governo (ver gráfico 01).
Entre o 4.º trimestre de 2022 e o 1.º trimestre de 2023, a diferença percentual entre o câmbio oficial e o informal caiu de 14% para 4%, evidenciando que o BNA geria a taxa de câmbio e que o mercado paralelo seguia. No 2.º trimestre de 2023, o diferencial manteve-se, mas voltou a crescer a partir do 3.º trimestre, atingindo 9% e depois 21% no final do ano. Em 2024, a diferença subiu de 27% para 33%, mas reduziu- -se no 1.º trimestre de 2025 para 24%, com a fixação em 912,000 kwanzas/USD. No 2.º trimestre, baixou ainda mais para 18%, ou 168 kwanzas (menos 98 face ao mesmo período de 2024). Até junho de 2025, a taxa do câmbio paralelo recuou, fixando o diferencial em 18%, nível próximo ao de 2022 (ver gráfico 01).
O fluxo de Moeda Externa (ME) para o mercado cambial provém de duas fontes: 1) impostos pagos em USD pelas petrolíferas e diamantíferas ao Tesouro, que canaliza para o mercado apenas o excedente após pagamentos externos, sobretudo dívida; 2) necessidades de moeda interna dessas empresas, que são bastante menores. Em resumo, trata-se de um mercado sem profundidade, dominado essencialmente por um operador: o Tesouro.
O principal problema do mercado cambial é a definição de uma política adequada. O mercado formal é pequeno, concentrado em poucos agentes e totalmente dependente das receitas petrolíferas, sem relação com a produtividade nacional. Nestas condições, uma taxa flexível é altamente especulativa, sujeita à geopolítica internacional do petróleo. Por outro lado, uma taxa fixa, num contexto de inflação interna superior à dos parceiros comerciais, compromete a competitividade: os preços internos crescem mais depressa que os dos importados.
A política mais prudente, defendida pelo CINVESTEC, parece ser a de fixar um preço de referência para o petróleo no OGE abaixo do preço internacional, canalizando apenas a parcela fiscal correspondente para o Tesouro. Esse valor deveria ser reduzido até aos 50 USD/barril. Recomendamos ainda: 1) que o excedente seja destinado a um Fundo Soberano independente, representativo das gerações futuras, o que permitiria também reduzir a dívida; 2) que o BNA assuma como missão a estabilidade da taxa de câmbio real, recorrendo a instrumentos de mercado.
De acordo com o INE, a inflação homóloga está em queda: em janeiro de 2025 situava-se em 26,5%, e em agosto recuou para 18,9% - uma redução de 29% em oito meses. Em teoria, essa descida reduz a velocidade de deterioração da competitividade da economia, ou seja, há um ganho de competitividade em termos absolutos. No entanto, enquanto a nossa inflação continuar acima da inflação dos nossos principais parceiros, a redução da competitividade nacional (competitividade relativa) mantém-se, até que uma nova deterioração da nossa moeda volte a repô-la.
É fundamental perceber esta relação. Se algo é produzido internamente ao preço de 100 kwanzas e externamente a 1 USD e a taxa de câmbio for de 100 kwanzas/USD, a relação entre ambos, no mercado interno (substituição das importações, que é o nosso principal problema) é de 1 para 1. Se a nossa inflação for de 15% e a inflação externa for de 5%, um ano depois o produto interno custará 115 kwanzas e o externo 1,05 USD. Mantendo-se a taxa, o produto externo entra a 105 kwanzas e a competitividade da produção interna desce: os consumidores preferirão os produtos externos mais baratos.
Para manter a paridade, a taxa de câmbio tem de deteriorar-se de 100 para 115/105 9,52%, ou seja, para 109,52 kwanzas por USD. Neste caso o produto externo custará no mercado interno 1,05 USD x 109,52 Kz/USD 114,99, ou seja, a paridade é reposta. Só esta manutenção da Taxa de Câmbio Real, e não nominal serve o nosso interesse de equilíbrio entre inflação e competitividade da nossa economia!
Leia o artigo integral na edição 845 do Expansão, de Sexta-feira, dia 26 de Setembro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)
*Bernardo Vaz, Economista