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Opinião

O custo de planear às cegas: Como a ausência de diagnóstico perpetua o ciclo do fracasso das políticas públicas em Angola?

CONVIDADO

Diagnosticar é mapear os problemas, identificar as necessidades, avaliar as capacidades institucionais assim como quantificar os recursos disponíveis e necessários. Ignorar esta etapa crucial no processo de elaboração de um programa de intervenção é equivalente a prescrever uma terapêutica sem ter feito o exame clínico do paciente.

Uma das mais preocupantes disfunções na gestão de políticas públicas reside no modo como são concebidos e elaborados os programas, estratégias e planos de desenvolvimento, à margem de um diagnóstico sério e sistemático sobre a realidade. O desenho e implementação de políticas públicas eficazes, exige como condição sine qua non, um conhecimento rigoroso da realidade que se pretende transformar.

Contudo, a praxis institucional em Angola continua a evidenciar um padrão preocupante: a elaboração de planos estratégicos e programas dissociados de diagnósticos robustos e fundamentados com base em dados estatisticamente significante.

Este vício metodológico compromete não apenas a eficácia das intervenções do sector público a vários níveis, mas perpetua o ciclo do fracasso das políticas públicas, adia as reformas estruturais imprescindíveis e constitui um bloqueio ao desenvolvimento económico e social do país.

Angola possui, desde 2011, um quadro jurídico que estrutura o Sistema Nacional de Planeamento (SNP), consagrado na Lei 1/11, de 14 de Janeiro - Lei de Base do Sistema Nacional de Planeamento - que estabelece uma hierarquia de instrumentos e procura garantir coerência e racionalidade no processo de planeamento nacional.

O referido diploma legal estratifica os instrumentos do Sistema Nacional de Planeamento em sete escalões: (1) Estratégia de Longo Prazo (ELP); (2) Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN), (3) Planos de Desenvolvimento Sectorial e Provincial (PDSP), (4) Plano Nacional de Ordenamento Territorial (PNOT), (5) Planos Estratégicos (PE), (6) Planos de Acção (PA), e (7) Planos Anuais (PAn).

A estratégia de longo prazo tem um carácter prospectivo, e integra as opções estratégicas de desenvolvimento a longo prazo do País, sendo elaborada com base em análise de cenários para os níveis nacionais, sectoriais e territorial. Por sua vez, o Plano de Desenvolvimento Nacional implementa a estratégia de longo prazo, integra os objectivos, os programas e as acções do poder executivo, tendo as seguintes características: carácter prospectivo e plurianual, de médio prazo, e incorpora todos os sectores relevantes para o desenvolvimento sócio económico e territorial.

O PDN é tido como o plano que obedece o ciclo político (5 anos) e está directamente vinculado ao quadro de despesas de Desenvolvimento de Médio Prazo (QDDMP), planos de desenvolvimento sectoriais e províncias, Plano Nacional de Ordenamento Territorial, planos estratégicos e, indirectamente, os planos de acção e planos anuais.

No entanto, o histórico de sucessivos programas e planos de desenvolvimento sectoriais têm resultado em fracasso. Por quê? Porque têm sido concebidos sem ter em conta o conhecimento do contexto, isto é, não se fazem diagnósticos profundos da realidade onde se quer intervir.

O elemento que confere substância e solidez a qualquer plano estratégico sério é o diagnóstico. É a partir de uma avaliação crítica e rigorosa da realidade que se identificam os problemas reais - estruturais e conjunturais - os desafios emergentes, as oportunidades latentes e os factores que podem servir de alavanca para a concretização dos objectivos que se deseja alcançar.

Diagnosticar é mapear os problemas, identificar as necessidades, avaliar as capacidades institucionais assim como quantificar os recursos disponíveis e necessários. Ignorar esta etapa crucial no processo de elaboração de um programa de intervenção é equivalente a prescrever uma terapêutica sem ter feito o exame clínico do paciente.

No entanto, o que se tem verificado é uma tendência para produzir planos "estratégicos" que são, na verdade, mero exercício cosmético e não documentos tecnicamente orientados para resultados. São planos elaborados em gabinetes, desconectados da realidade concreta, com objectivos genéricos, indicadores mal definidos e metas que não resistem ao mínimo escrutínio em termos de avaliação de impacto ex post.

O diagnóstico - importante fase do ciclo de planeamento - tem sido sistematicamente negligenciado; ou quando existe, é superficial, substituído por formulações vagas, desprovido de dados actualizados ou baseado em premissas descontextualizados. O resultado é uma proliferação de documentos estratégicos que mais servem para fazer show off institucional, do que um verdadeiro guia de transformação estrutural.

Leia o artigo integral na edição 829 do Expansão, de Sexta-feira, dia 06 de Junho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

*Manuel Alberto, economista

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