O novo ciclo do Mercado de Capitais em Angola: O papel das Sociedades Abertas e os desafios da privatização
O sucesso deste movimento dependerá da capacidade do mercado de capitais de se afirmar como um ambiente seguro e atractivo para investidores nacionais e internacionais, como aliás, já tem demonstrado ser.
O plano operacional da Comissão do Mercado de Capitais (CMC) para os primeiros 100 dias de 2025 visa colocar o mercado de capitais no centro da estratégia de modernização económica de Angola.
Destaca-se a aceleração da privatização de empresas de referência - a Unitel, S.A., o Standard Bank Angola, S.A. e o Banco de Fomento Angola, S.A. - por meio do mercado regulamentado de valores mobiliários, com a colaboração da CNI-PROPRIV e IGAPE.
Este movimento vai inevitavelmente impulsionar a criação de novas sociedades abertas e promover a dispersão de capital, o que vai facilitar o acesso aos investimentos, com novas oportunidades para investidores institucionais e particulares.
A qualificação de uma sociedade anónima para sociedade aberta levanta desafios jurídicos e económicos, que exigem uma análise cuidadosa e a observação de requisitos legais específicos. A manutenção desse estatuto impõe exigências adicionais em termos de transparência, governação corporativa e obrigações regulatórias.
As sociedades abertas têm uma longa história, que remonta aos mercadores medievais e às companhias marítimas do século XVII, como a Companhia Holandesa das Índias Orientais, que permitiu aos investidores comprar participação em lucros de aventuras comerciais.
No século XX, após a turbulência da Grande Depressão, a regulação trouxe maior transparência e segurança, e, no século XXI, a digitalização democratizou ainda mais o investimento. A promoção das sociedades abertas tem sido um mecanismo importante para o aprofundamento dos mercados financeiros, conforme defende a Professora Sofia Vale.
A qualificação como sociedade aberta ocorre, conforme o artigo 112.º do Código dos Valores Mobiliários (Lei n.º 22/15, de 31 de Agosto), quando há uma Oferta Pública de subscrição dirigida a investidores em Angola, através da admissão das suas acções ou valores mobiliários à negociação em mercado regulamentado, através da alienação em oferta pública de venda ou troca de, pelo menos, 10% do capital social e, finalmente, através de cisão ou fusão que incorpore património de uma sociedade aberta.
Seguindo o exemplo de entidades como o BAI, o Caixa Angola, a ENSA ou a BODIVA, a qualificação da Unitel, do Standard Bank Angola e do BFA ocorrerá inevitavelmente, por meio da admissão no Mercado de Bolsa de Acções da BODIVA. A transparência e as melhores práticas de governação corporativa serão essenciais nesse processo.
As sociedades abertas são caracterizadas pela dispersão do seu capital entre o público investidor, o que pode gerar desafios internos e externos. Internamente, a fragmentação pode permitir que um conjunto de investidores, mesmo com participação minoritária, exerça controlo sobre a sociedade. Externamente, como aponta Paulo Câmara, citado pela Professora Sofia Vale, a abertura ao mercado aumenta a volatilidade no controlo societário, tornando as empresas mais susceptíveis a mudanças na gestão.
A perda do estatuto
A perda do estatuto de sociedade aberta, conforme o artigo 116.º do Código dos Valores Mobiliários, pode ocorrer quando um accionista atinge 90% dos direitos de voto ou quando a sociedade deliberar perder essa qualidade em Assembleia Geral. A perda desse estatuto tem consequências imediatas, incluindo a exclusão da negociação no mercado regulamentado (artigo 118.º). Esta previsão exige um desenho cuidadoso das ofertas públicas para garantir a dispersão de capital e o cumprimento das regras de mercado.
Regime especial
As sociedades abertas operam sob um regime específico, com desvios ao regime geral das sociedades anónimas, justificados pelas exigências da supervisão da CMC. Este regime visa proteger os investidores, assegurar a eficiência do mercado e mitigar riscos sistémicos.
O regime especial das sociedades abertas inclui a sujeição à CMC, nos termos do artigo 115.º, maiores exigências de transparência, o afastamento ao regime do capital social estabelecido para as sociedades anónimas e a necessidade do lançamento da oferta pública de aquisição para a aquisição do controlo societário.
Conforme ensina A. Barreto Menezes Cordeiro, as sociedades abertas desempenham um papel vital na dinamização dos mercados de capitais, estimulam a liquidez, facilitam o acesso ao financiamento e incentivam boas práticas de gestão. Para Angola, essa transição representa uma oportunidade para aprofundar a intermediação financeira, diversificar fontes de financiamento e reduzir a dependência do crédito bancário.
Leia o artigo integral na edição 814 do Expansão, de sexta-feira, dia 21 de Fevereiro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)
**Dário Castro, Jurista