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Opinião

Angola 2019 - as dificuldades manter-se-ão

Laboratório Económico

A desglobalização parece ser um dos desafios que a economia mundial vai enfrentar nos próximos anos, assim nos informam os sinais provenientes dos Estados Unidos (com uma forte probabilidade de diminuição do seu crescimento face à política monetária restritiva da FED) com a sua obstinada política de isolamento "America First" e da União Europeia com a saída do Reino Unido (a vontade de deixar o espaço único e integrado também é partilhado por outros Estados da União Europeia, cansados da burocracia de Bruxelas, da sucessiva perda de autonomia das políticas económicas e, afinal, da não realização da maior promessa da integração económica que era a da diminuição das desigualdades económicas e da aproximação das condições de vida dos cidadãos europeus) e com uma crescente instabilidade política provocada pela ascensão de movimentos extremistas fortemente apoiantes do fechamento das fronteiras aos migrantes (mais tarde se verá se também a outras franjas da população mundial e mesmo europeia).

A China é, por enquanto, o grande contrapeso a esta desglobalização do desenvolvimento e uma das mais importantes defensoras do livre comércio e do aprofundamento das relações económicas baseadas nas forças de mercado e na livre concorrência (quem diria que isto podia acontecer da parte de uma país que ainda se considera comunista?).

Evidentemente que estas situações penalizam o crescimento mundial, tornando-o mais local, chauvinista, egocêntrico e individualista. As previsões do Fundo Monetário Internacional, apresentadas no World Economic Outlook de Outubro de 2018, vão justamente no sentido de uma menor intensidade do crescimento nas economias mais avançadas em 2019 (uma diminuição generalizada em todas as economias que integram este espaço económico mundial), com repercussões sobre todas as restantes economias do espaço-mundo, emergentes e não emergentes. A África subsariana pode constituir uma excepção, ao colocar a sua taxa de variação do PIB em 3,7% em 2019, um ganho de 0,3 ponto percentual face a 2018, mas com a sua maior economia (Nigéria) a crescer apenas 1,9%.

Evidentemente que estes cenários não vão ajudar Angola, ainda muito dependente de um único recurso de exportação. O Acordo com o Fundo Monetário Internacional para a obtenção de um financiamento de 3,7 mil milhões USD e válido para os próximos 3 anos (2019-2021) passa a ser o documento de política económica do Governo e das acções de monitoria na aplicação das políticas e medidas definidas de comum acordo para 2019.

Presumo que, no processo de negociações com esta Instituição de Bretton Woods, a Visão nacional tenha sido, pelo menos, levada em consideração, já que, seguramente, não vai prevalecer no Acordo Geral (os apertos, as repercussões sociais negativas e a instabilidade política associada das políticas contraccionistas valerão 3,7 mil milhões USD e a suposta maior credibilidade internacional do País?). Por isso, a minha análise sobre a economia angolana para 2019 baseia-se no documento IMF Country Report Nº 18/370, de Dezembro de 2018 e intitulado ANGOLA - Request For An Extend Arrangement Under The Extend Fund Facility.

Até 2021, a economia angolana apresenta cinco grandes riscos: o comportamento do preço do petróleo e a probabilidade de se desviar do cenário de base (68 USD por barril), apesar do acordo com o FMI, o elevado peso da dívida pública (interna e externa) e do respectivo serviço pode limitar a captação de investimento directo estrangeiro e a contracção de empréstimos nos mercados internacionais (apesar do Acordo com o FMI), potencial efeito negativo de contágio sobre o sector financeiro derivado da transição para um regime cambial flexível, choques sobre a dívida pública provenientes do baixo crescimento do PIB (já lá irei) e do possível abaixamento do preço do barril de petróleo e, por fim, um mais do que esperado (programado) declínio na produção de petróleo (com redução da dinâmica do PIB, do montante das receitas fiscais e da viabilidade da nova política cambial). Afinal, tudo em redor do petróleo, a grande determinante e em situações de crise a maior incógnita do crescimento económico e do desenvolvimento social do País.

A redução desta dependência vai levar anos e a diversificação das exportações mais tempo ainda, porque o País não tem um ADN exportador (para lá do petróleo e eventualmente da energia) - capacidade de penetração e de criação de parcerias, competitividade, conhecimento dos mercados externos, inovação de produtos e processos, etc. Os mercados internacionais são muito exigentes, não devendo ser encarados de ânimo leve, como decorre de muitas intervenções públicas da parte da gestão intermédia do Governo.

O Estado não pode continuar a ter uma atitude paternalista para com os potenciais exportadores (em muitos fóruns sobre esta temática, os representantes do Governo prevalecem nesta postura) devendo, tão somente, garantir o bom funcionamento dos mercados, com taxas de juro baixas e disponibilidade de crédito (para isso o Estado tem de deixar de ser um competidor do sector privado nos mercados financeiros e reduzir a sua dívida), a diminuição significativa da burocracia (o PDN cria algumas expectativas sobre esta matéria, mas não acredito que o consiga numa proporção significativa, face à mentalidade prevalecente nos funcionários públicos e que vai predominar ainda durante muito tempo, dado fazer parte da sua idiossincrasia), a melhoria do ambiente de negócios e a redução expressiva dos chamados custos de contexto. Tão simples quanto isto, podendo mesmo ser dispensáveis estratégias e mais estratégias sobre esta temática (1).

Como estará o País em 2019 em matéria de crescimento económico? O FMI, reconhecendo a recessão havida em 2016, 2017 e 2018 (um acumulado de - 4,5%) e o crescimento pífio de 2015 (0,9%), aponta para 2,5% a taxa de crescimento para 2019, insuficiente para contrariar a tendência de empobrecimento da população (desde 2009, com pequenos e efémeros episódios de melhoria das condições de vida): entre 2015 e 2019, o PIB por habitante vai contrair- se em -16% (passe a redundância)!!! Não é nenhuma brincadeira, podendo ser considerado como mais um desafio a enfrentar até 2022.

O PIB petrolífero - por razões bastamente conhecidas está em dificuldades desde, pelo menos, 2014 - vai crescer 3,1%, depois de uma contracção de 8,2% em 2018 (11,1% em 2015, -2,7% em 2016 e 0,5% em 2017), enquanto o PIB não petrolífero não consegue ser o contrapeso da economia nacional: recessão acumulada de 5,8% entre 2015 e 2017, crescimento nulo em 2018 e apenas 2,2% em 2019.

As políticas e estratégias económicas da Governação anterior foram, na verdade, mal concebidas e, eventualmente, pior executadas. Tiveram na sua base conceptual e doutrinária a criação da acumulação primitiva de capital, da burguesia nacional e de uma elite político-empresarial, do que pouco de sustentável e revolucionário decorreu para a economia e a sociedade. Ou seja, tem de se começar tudo de novo para se dotar o País (sua economia, suas populações e suas instituições) com argumentos seguros e fundamentos sustentáveis.

A inflação em 2019 vai estabelecer- se dentro do intervalo 22,8%-17.5%, mais um factor de risco para os baixos rendimentos da população, o incremento das exportações, a diminuição das importações (com estas taxas de inflação valerá a pena à economia importar - custo de oportunidade positivo), a competitividade nacional e as expectativas dos investidores (se não houver compensação pela via da melhoria do ambiente de negócios, na sua vertente de redução dos diferentes custos associados à criação de negócios).

Finalmente o PIB por habitante (voltarei a este tema do Angola - 2019 no dia 18 de Janeiro de 2019, com outro título, pois a redacção do Expansão não gosta muito de artigos com primeiras, segundas ou terceiras partes). Desde 2014, que a riqueza anualmente distribuída a cada um de nós tem diminuído: 5.626 USD em 2014 e 3.290 USD em 2019 (-41,5% em termos acumulados e -12,6% em cadência média anual). Os 3.290 USD em 2019 equivalem a 9 USD por dia, ou 2.250 Kz diários, partindo do pressuposto de que a distribuição do rendimento é equitativa. Claramente insuficientes para retirar da pobreza uma faixa expressiva da população.

Muitas prosperidades para 2019 para todos os leitores deste semanário

(1) A talhe de foice: perante estas (e outras) insuficiências e obstáculos, o músculo exportador poderia ser ganho através do aumento considerável da dimensão do mercado interno, mais diversificado e com a criação de uma massa crítica de procura interna potenciadora de economias de escala e de economias externas (é para isto que a substituição das importações deve servir). Para isto acontecer, é fundamental um modelo de redistribuição do rendimento nacional - pelas vias e modalidades conhecidas e, mesmo, outras mais ousadas - centrado na procura agregada da economia, em especial no consumo privado. Primeiro ganhar músculo no ginásio interno e depois partir para uma aventura calculada das exportações.

Alves da Rocha escreve quinzenalmente


(artigo publicado na edição 505 do Expansão, de sexta-feira, dia 4 de Janeiro de 2019, disponível em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)