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Opinião

Gestão da coisa pública

Editorial

Os organismos públicos devem quase 35 mil milhões de kwanzas em facturas de electricidade à ENDE. São ministérios, empresas públicas, governos provinciais, instituições, hospitais, quartéis, etc. Praticamente todos eles receberam dotações financeiras específicas para fazer face a estas despesas, faz parte dos respectivos orçamentos.

Então porque é que não pagaram? Estou disposto a aceitar que em alguns casos a razão económica pode ser a justificação, mas como se chega a este valor enorme? E como é que se deixa chegar uma dívida a esta dimensão quando os clientes em análise, as instituições públicas, têm nome, morada, sabe-se quem são e onde estão? Nem os devedores nem os credores estão isentos de culpa.

Em Moçambique, ainda recentemente a empresa de electricidade cortou o fornecimento ao Parlamento Nacional, em dia de plenário, e foi uma enorme confusão. O que me pergunto é se isto podia acontecer no nosso País? E coloco esta questão para entender o tipo de gestão que é feito em muitas instituições do Estado, que não tem apenas a ver com despesismo mas mais com uma certa arrogância do "não pago e não tenho medo de ninguém".

É assim com os fornecedores, com os trabalhadores, e pelos vistos, também com a ENDE. É difícil entender que uma instituição que compra carros novos para os administradores de dois em dois anos e depois não tenha dinheiro para pagar a luz. Mais difícil perceber como é que os chefes viajam em executiva e os trabalhadores têm salários em atraso. E tudo tem a ver com um ambiente de impunidade que se instalou há vários anos, e muitos gestores sabem que se forem demitidos, mesmo por actos de má gestão, vão depois para outro lado.

Há sempre um gancho que os segura, porque apesar de tudo, souberam segurar o futuro com a oferta de "facilidades" que beneficiaram aqueles que lhe vão lançar o gancho. E nessa lógica, de que uma mão lava a outra e as duas lavam a cara, vão circulando pela gestão da coisa pública com uma impunidade difícil de entender. E não falamos, muitas vezes, de desvio de fundos, mas de incompetência. E alguma "banga", claro.

A responsabilização não deve ser apenas criminal, deve ser também profissional. Não é capaz e pronto! Hoje fala-se muito de meritocracia, mas continuamos a não fazer contas da gestão das instituições públicas. Seria interessante que cada novo gestor tivesse como prioridade publicar as contas do anterior. Isso iria inibir comportamentos, mas existe um pacto de silêncio, até porque no futuro pode ser ele que me venha substituir. Talvez com uma nova geração de gestores, com novas práticas, isto mude. Mas, para já, as caras novas na gestão da coisa pública ainda são muito poucas. Continuam os mesmos...


Editorial da edição 539 do Expansão, de sexta-feira, dia 30 de Agosto de 2019, já disponível em papel ou em versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui.