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Opinião

É a taxa de inflação insensível à Covid-19?

Convidado

O Governo apresentou a proposta de revisão do Orçamento Geral do Estado (OGE R) 2020 em que quase tudo mudou. Desde as perspectivas de crescimento da economia à fixação de um défice fiscal global de 4%, depois de dois anos consecutivos de superavit. Contudo, a expectativa da evolução dos preços mantiveram-se nos 25%. A que se deve tal insensibilidade da taxa de inflação à actual conjuntura?

Como explicar que o Governo numa conjuntura completamente diferente da inicial, mantém o objectivo de 25% de inflação para 2020? É o impacto da remoção dos subsídios aos combustíveis e aos preços dos transportes públicos proporcionais na evolução do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) aos custos económicos impostos pela Covid-19?

Como pode ser notado pelo gráfico n.º 1, os preços têm vindo a acelerar desde Janeiro de 2020, com particular destaque para os bens alimentares que vêm ganhando terreno face aos não alimentares, um padrão que já tinha sido apurado entre 2016 e 2017, altura em que os preços médios fixaram-se em 42% e 26%, respectivamente. E pela tendência, a conclusão mais simples a que se pode chegar é que a variação dos preços gerais poderia atingir os 25% no final do ano, mesmo que a Covid-19 não se tivesse instalado - e todas as medidas de estímulo que lhe estão associadas - e os subsídios aos combustíveis e aos preços dos transportes fossem retirados.

Paralelamente, não obstante os níveis de depreciação cambial apuradas, nos últimos cinco meses do ano, a variação dos preços transaccionáveis medidos pelo IPC com referência a Luanda, acelerou abaixo do aumento do IPC Global em perto de 0,3 p.p., sendo que a diferença da variação dos índices tem vindo a alargar-se e a intensificar a relação negativa, à luz do que aconteceu no processo de desaceleração registada entre 2017 e 2019 - No período anterior, 2015 e 2016, a relação foi justificada pela manutenção da taxa de câmbio fixa, como pode ser apurado no gráfico n.º 2 .

E, com a depreciação cambial a fixar-se em termos acumulados em 19,2% nos primeiros cinco meses, enquanto o diferencial entre os dois índices de preços, global e dos produtos transaccionáveis, a aumentar, em termos médios em 2,9 p.p., poderá não ser por essa que se vai justificar o aumentos de preços no período em referência, sendo que o inverso pode apresentar-se como verdade, ou seja, justificar os aumentos dos preços pela via dos preços dos produtos transaccionáveis é pouco consensual, uma vez que continua a evoluir abaixo do índice geral.

Com efeito, contado que os impactos da Covid-19 nas contas externas do País só começaram a ser percebidos com maior relevância no terceiro mês do ano, assim apenas a inflação inercial poderá justificar que os preços mensais tenham crescido em termos médios em 1,8% e se tenham fixado em termos acumulados em 9,5% até Maio. E, se aplicada aquela variação média para os próximos sete meses do ano, o máximo que poderá acontecer na economia é uma taxa de inflação de 24,4%, isto é, independentemente da propagação da Covid-19, pela evolução dos preços até Maio, a inflação em Dezembro de 2020 poderia fixar-se nos 24,4%.

*Economista

(Leia o artigo integral na edição 582 do Expansão, de sexta-feira, dia 10 de Julho de 2020, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)