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Opinião

Não há recuperação sem alívio da dívida

Project Syndicate

No mês passado, a União Africana lançou a Plataforma Africana para o Fornecimento de Material Médico para facilitar a produção e o fornecimento de equipamentos médicos vitais - a mais recente conquista numa resposta já impressionante à crise provocada pela Covid-19.

No entanto, na mesma semana, foi revelado que a maior parte da receita do governo federal da Nigéria destinava-se a pagamentos de serviços da dívida e o país cortaria os gastos em saúde pública em 40% - mesmo quando as infecções por Covid-19 continuam a subir.

O contraste tem tanto de trágico como de persistente. O continente mais jovem do mundo está ansioso não apenas para ser autónomo, mas também para fornecer liderança global. E continua a ser prejudicado por um velho inimigo: a dívida. Para que a África atinja o seu potencial, os seus credores têm de libertá-la. O alívio da dívida funciona. Há quinze anos, nesta semana, o G8 emitiu a declaração de Gleneagles, aliviando 18 "países pobres altamente endividados" - Benin, Bolívia, Burkina Faso, Etiópia, Gana, Guiana, Honduras, Madagáscar, Mali, Mauritânia, Moçambique, Nicarágua, Níger, Ruanda , Senegal, Tanzânia, Uganda e Zâmbia - das respectivas dívidas que totalizavam mais de 40 mil milhões de dólares.

Ao deixarem de estar sobrecarregados com os enormes custos do serviço da dívida, os países conseguiram investir mais nas suas próprias economias e populações. Muitos dos países que receberam alívio da dívida, como a Etiópia e o Ruanda, vivenciaram posteriormente subidas significativas no crescimento económico. Os padrões de assistência médica, o acesso à educação e as oportunidades de emprego melhoraram acentuadamente. E os países melhoraram as suas governações e tiraram partido de uma maior estabilidade - essencial para sustentar o crescimento a longo prazo.

Este progresso está agora em risco de se desfazer. Embora África tenha registado até agora um número relativamente baixo de infecções por Covid-19, ela enfrenta uma grave crise económica, com implicações sociais e políticas potencialmente abrangentes. A procura externa, os preços do petróleo, as receitas de turismo e viagens e o envio de remessas desmoronaram. Os investidores retiraram 100 mil milhões de dólares dos mercados emergentes desde o início da pandemia - a maior saída de capital de todos os tempos num período tão curto. Isto está a contribuir para um aprofundamento - e altamente perigoso - da crise de liquidez.

Os governos africanos precisam urgentemente de capital para estabilizarem as economias atingidas por choques externos cumulativos e para financiarem uma resposta adequada em termos de saúde pública. No entanto, ao contrário da zona euro ou dos Estados Unidos, a maioria dos países africanos não pode imprimir dinheiro para adquiri-los durante a crise. Além disso, o seu espaço fiscal permanece limitado, principalmente porque têm de continuar a fazer grandes pagamentos das dívidas. Isto deixa os seus líderes com uma escolha impossível: cortar gastos em serviços fundamentais, como a Nigéria fez, ou o incumprimento.

*Presidente e fundador da Fundação Mo Ibrahim

(Leia o artigo integral na edição 583 do Expansão, de sexta-feira, dia 17 de Julho de 2020, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)