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Angola

Mais dinheiro do FMI e mais tempo para pagar à China

Dois anos com menos pressão financeira

O FMI aprovou a proposta de Angola para reformulação da Linha de Financiamento Ampliado (EFF), assinada a 7 de Dezembro de 2018, depois de várias semanas de intensas negociações feitas a dois níveis - em Washington, explicando as consequências que a pandemia estava a ter na nossa economia e a necessidade de aumentar o financiamento, e junto dos principais credores, a China fundamentalmente, para renegociar as nossas dívidas de forma a criar margem suficiente nas contas nacionais para que o FMI pudesse responder positivamente. A decisão favorável de quarta-feira permite um desembolso imediato de mil milhões USD, a câmbio BNA, cerca 620 mil milhões de Kz.

Este valor já foi entregue ao governo angolano, que conseguiu também aumentar o montante do financiamento global, mais 765 mil milhões USD até ao final do acordo, passando de 3,7 mil milhões USD para 4,465 mil milhões. Com o recebimento da tranche desta semana, o FMI já "entregou" ao governo angolano 2,5 mil milhões USD, sendo que o restante será desembolsado até ao final de 2021.

Inicialmente agendada para o final de Julho, a reunião do conselho de administração do FMI para decidir sobre a proposta de Angola foi adiada até que se chegasse a um entendimento com os bancos chineses para a reformulação do pagamento da dívida, que no total é de 21,7 mil milhões USD, dividida, fundamentalmente, por duas instituições - Banco da China e Banco de Exportações e Importações da China (Exim Bank). O acordo só foi conseguido no final da semana passada, depois de vários avanços e recuos, e que resultou numa moratória até ao final de 2022, o que significa que vamos começar a pagar em 2023 e com um prazo de sete anos.

Aliás, 2023 não será um ano nada fácil, porque é também nesta data que Angola tem de começar a pagar ao FMI. De acordo com o contrato assinado com a instituição, Angola tem um período de carência deste empréstimo, agora de 4,5 mil milhões USD de quatro anos e meio, termina em Junho de 2023, e depois mais seis anos para pagar, ou seja até ao final de 2029.

Se juntarmos estes dois compromissos, o País terá agora um período para "respirar" até ao final de 2022, um espaço temporal para fazer as reformas que a nossa economia necessita para poder crescer, pois a partir de meados de 2023 terá seis anos para pagar um pouco mais de 28 mil milhões USD (mais juros). Se fizermos uma conta simples, que na prática não é exactamente assim, entre Julho de 2023 e Dezembro de 2029, só para estes dois empréstimos terá uma prestação mensal de 520 milhões USD para pagar.

Mas esta é apenas uma parte da dívida que o País já tem contratada. No final de 2019, o valor total já ultrapassava os 50 mil milhões USD, em 2020 vai ultrapassar os 120% do PIB, o que coloca um enorme desafio à capacidade de tornar este dinheiro, que está a entrar, num factor reprodutivo para a nossa economia.

Angola também vai beneficiar da Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) do G20, que, de acordo com a Fitch Ratings pode levar a uma poupança de 4,3% do PIB só este ano de 2020. "De acordo com os dados dos pagamentos devidos, publicados pelo Banco Mundial, só cinco dos 22 países que a Fitch avalia e que são elegíveis para participar neste programa, veriam os requisitos de financiamento para este ano reduzidos em mais de 1%, sendo o benefício para Angola, com 4,3%, o mais elevado, de longe", lê-se num relatório sobre o impacto da adesão dos países mais vulneráveis à iniciativa do G 20 publicado em Julho. Em Novembro, haverá uma nova reunião do G 20 para discutir este assunto, o que pode ampliar os benefícios desta iniciativa para todos os países.

Não entrar em euforia

Apesar de este acordo com o FMI ser uma boa notícia, não pode instalar-se um clima de euforia que leve necessariamente a um comportamento despesista. "O problema é exactamente esse, criar-se um clima de euforia como se tivéssemos todos os nossos problemas resolvidos. Temos de continuar a ser rigorosos nas contas públicas, a cortar nas despesas injustificadas e nas mordomias da administração pública, abandonar projectos que, objectivamente, não trazem mais-valias à nossa economia e que, muitas vezes, são apenas para alimentar a vaidade de quem decide", recordou um quadro superior do Ministério das Finanças, acrescentando que "estamos a falar de alargar um empréstimo, de suspender o pagamento da dívida, ou seja, ganhar apenas mais tempo para pagar. Todos estes valores não foram oferecidos, vamos ter de pagar com juros e, por isso, ou criamos condições para que Angola possa gerar a riqueza capaz de honrar estes compromissos, ou daqui a dois anos temos um problema muito maior e possivelmente sem solução".

No documento, publicado no site do FMI, onde se dá conta deste acordo, numa declaração atribuída a Antoinette Sayeh, sub-directora-geral e presidente em exercício do conselho de administração do FMI, pode ler-se: "prosseguir com as reformas estruturais é fundamental para diversificar a economia e estabelecer as bases para o crescimento económico liderado pelo sector privado. O governo terá de se manter firme na melhoria do ambiente de negócios. No reforço da governação e na luta contra a corrupção".

Apesar dos recados directos à governação que estão ao longo deste comunicado - "As autoridades têm de avançar com a reestruturação de dois bancos públicos" - a linguagem geral é de simpatia e reconhecimento do esforço que o País está a fazer. "As autoridades angolanas continuam empenhadas na prossecução de políticas sólidas, no âmbito do programa apoiado pelo FMI, não obstante o ambiente externo deteriorado devido à pandemia Covid-19, incluindo os impactos negativos para a saúde pública, a protecção social, o orçamento e a dívida pública. As autoridades agiram de forma rápida e decisiva em resposta às menores exportações e receitas petrolíferas, de modo consistente com os objectivos gerais do programa".

Importante também que o FMI aceitou algumas condições suplementares propostas por Angola, nomeadamente o alargamento do prazo para o fim das subvenções a alguns produtos estratégicos (o aumento dos combustíveis será só em 2021). Recorde-se que, na carta que acompanhava o pedido de alargamento da linha de financiamento, estavam também contemplados pedidos para não observação nesta terceira avaliação sobre o critério que visa a não acumulação de atrasados na dívida externa, a modificação do limite sobre a não acumulação de atrasados internos, e a modificação dos limites do stock de dívida contratada pelo Governo e garantida pelo petróleo e pela Sonangol. De acordo com o que apurámos, apenas este último pedido terá merecido oposição, sendo que os dois primeiros, devidamente explicados, mereceram a concordância da instituição.