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Opinião

Irregularidades no mercado imobiliário angolano

Convidado

À luz do processo revolucionário então em curso, quem se ausentasse de Angola, por mais de 45 dias, sem qualquer autorização passada por entidade pública competente, perdia a favor do Estado os seus bens imóveis.

Foi por causa desta lei, que o Estado angolano, num ápice, se tornou proprietário de centenas e centenas de imóveis que davam corpo às maiores cidades do País, de municípios, comunas, vilas e vilarejos estendidos pelo território nacional afora. Para agravar o quadro, no âmbito das políticas habitacionais da época, por intermédio do Ministério da Construção e da Habitação, o Estado angolano construiu de raiz um considerável número de fogos habitacionais, como são conhecidos, por exemplo, os "prédios dos cubanos".

Tanto os primeiros, os que ingressaram para a esfera patrimonial do Estado por via do confisco, como os que foram por ele, Estado angolano, construídos, a posteriori, foram arrendados aos seus ocupantes, tendo, para tanto, se institucionalizado a Secretaria de Estado da Habitação, que procedia à gestão deste vasto património imobiliário que, repete-se, havia ingressado para a esfera patrimonial do Estado por via do confisco e da construção directa.

Mais tarde, com a falência das políticas de economia centralizada, o Estado angolano, deu início a um processo inverso, o de privatização ou alienação (venda) do seu património imobiliário, tendo, para tanto, criado a Comissão Nacional para a Venda do Património Habitacional do Estado, por intermédio da conhecida Lei 19/91, de 19 de Maio.

Porém, e não deixa de ser curioso, até hoje grande parte dos imóveis ainda se encontra numa situação dúbia, na medida em que a maioria dos ex-inquilinos da Secretaria de Estado da Habitação que se haviam candidatado para compra dos imóveis, até hoje, não possuem o título que comprova a propriedade do imóvel.

Com a Comissão Nacional para a Venda do Património Habitacional do Estado entrou no "léxico" do negócio imobiliário em Angola um documento chamado "de " Termo de Quitação", cuja força e validade jurídica até hoje se encontra por esclarecer. Para muitos, o "Termo de Quitação" é uma mera factura, que comprova ter, determinado inquilino, pago o valor pela venda de um imóvel. Para outros, o "Termo de Quitação" é um mero contrato promessa de compra e venda.

Seja o que for, o "Termo de Quitação" não é uma escritura de compra e venda. Não tem valor de escritura pública de compra e venda. Ora, e como se sabe, a compra e venda de bens imóveis só é válida quando celebrada por escritura pública; assim impõe o art.º 875.º do Cód. Civil. O que pressupõe dizer, por outras palavras, que o negócio de compra e venda de bens imóveis que não tiver por base um contrato de compra e venda é nulo, e, como tal, não produz os efeitos jurídicos que as partes desejariam.

Em Angola, agravada com a falta de cultura jurídica dos cidadãos, reforçada com o silêncio de instituições de direito, como a Ordem dos Advogados de Angola, como a Associação dos Bancos de Angola, Procuradoria-Geral da República, Provedoria Geral da República e outras instituições e associações públicas, os cidadãos andam convencidos que a posse do "Termo de Quitação", documento passado pela Comissão Nacional para a Venda do Património Habitacional do Estado, faz deles proprietários. Mas não!

*Advogado

(Leia o artigo integral na edição 600 do Expansão, de sexta-feira, dia 13 de Novembro de 2020, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)