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Opinião

O que pode estar em causa no processo de transformações estruturais

Laboratório Económico

As transformações estruturais em causa no País têm um custo financeiro elevado, provavelmente acima da capacidade de financiamento existente e projectável no médio prazo. Para não se falar dos ajustamentos em alguns dos subsistemas superestrututais, como as mentalidades, as instituições e as atitudes.
Não se sabe em quanto o processo de diversificação da economia nacional foi prejudicado pelo controlo da taxa de inflação pela via da âncora cambial. Do ponto de vista das experiências exitosas de diversificação, a desvalorização cambial é uma medida presente nas estratégias e políticas nacionais, não apenas nos países ricos em petróleo e outros recursos naturais irrenováveis, como naqueles em que a dependência externa se concentra na exportação de matérias-primas e bens alimentares. A diversificação é também um processo de gestão e provocação de expectativas, que levem os investidores privados, dentro das condições e factores anteriormente apontados, a aplicarem as suas e as alheias poupanças em actividades de elevado potencial de competição externa. A acomodação dos empresários nacionais aos modelos proteccionistas, cuja implementação eles próprios solicitam aos seus governos e a falsa-ideia-clara de que a diversificação é apenas interna, para substituir simplesmente o que é importado, tem adiado estes processos em muitas economias emergentes e em desenvolvimento, ricas ou não em petróleo e outros produtos de base.
Com as informações que vão chegando, os estudos que vão sendo elaborados e as previsões que se vão efectuando (em horizontes de largo prazo, umas com mais e outras com menos credibilidade e confiança), o ciclo do petróleo está na verdade a chegar ao fim. Não apenas enquanto fonte de financiamento da actividade económica de alguns países e financeira dos seus Estados e Governos, mas igualmente como uma componente da produção nacional. O ciclo do petróleo - provavelmente a melhor designação será "ciclo do petróleo caro" - está a ser afectado pelo preço desta commodity e também pelos extraordinários ganhos de eficiência que se vão acumulando, ano após ano, desde 1971/1973, depois da dramática subida do preço médio em praticamente 100%.
A diversificação tem uma contabilidade que se pode resumir na pergunta: qual o seu preço e de que modo pode ser financiada? A resposta à primeira parte da questão exige a disponibilidade de dados estatísticos e a consideração de uma estrutura do PIB correspondente a uma malha produtiva desconcentrada. Para a segunda, terei de recorrer à Teoria Económica e às equações caracterizadoras de um mercado de capital em economia aberta.
É consabido que a economia angolana depende, directa e indirectamente, das receitas de exportação do petróleo (produto de base, sujeito às imponderabilidades que mais atrás assinalei e que podem travar, em certas circunstâncias e contextos, o crescimento económico, tornando-o mais lento e menos inclusivo), sendo, portanto, aconselhável, não apenas reduzir o seu peso relativo no Produto Interno Bruto por substituição de outras mercadorias, como agregar valor interno.
Quanto pode custar o processo de diversificação da economia, apenas em custos de investimento, directos, indirectos e induzidos? Tomando-se um horizonte temporal de cerca de 20 anos (2035) - justificado pela sua complexidade, tributária de transformações profundas em todos os sectores, nas mentalidades e posturas (por exemplo, ter-se o trabalho, a iniciativa e a inovação como valores culturais supremos e não a preguiça, o absentismo, o amiguismo e o tráfico de influências) - e determinados valores para alguns indicadores de eficiência (por exemplo o coeficiente capital-produto), chega-se a uma estimativa do esforço de investimento médio anual de USD 55042,4 milhões!!!!!!!!
Como financiar este montante de investimento? O mercado de capital em economia aberta é a modalidade mais adequada e a poupança é a única forma de o fazer. Quando o mercado de capital está em equilíbrio o investimento iguala a soma da poupança privada (Sp), poupança pública (Sg) e as entradas líquidas de capital (ENC). Recorrendo à equação de equilíbrio deste mercado em economia aberta, chega-se à conclusão de que a economia e as suas necessidades de investimento financiam-se com os saldos da balança de pagamentos e as entradas líquidas de capitais externos. A sua positividade depende da eficiência geral da economia e da produtividade geral dos factores no sentido de Solow, no primeiro caso, e de um ambiente de negócios atractivo para os investimentos estrangeiros, no segundo.
O Relatório de Fundamentação do OGE 2018 (1) tem várias referências sobre a capacidade de financiamento do País, que passo a citar:
n"A capacidade de financiamento da economia nacional ascendia a 6,52% do PIB em 2013. Com a queda do preço do petróleo, em meados de 2014, a capacidade de financiamento da economia declinou, passando a economia a apresentar necessidades de financiamento eterno em níveis de 2,96% do PIB, agravando-se para 10,7% do PIB em 2015."
n"As recentes estimativas sobre a evolução das necessidades de financiamento externo da economia nacional, medidas pelos saldos conjuntos das contas corrente e de capital, assinalam uma ligeira melhoria em 2016, tendo-se estabelecido em cerca de 3% do PIB".
n"O exercício de programação económica feito para 2017, sob o cenário de um preço médio do barril do Brent em torno de USD 48,4, leva a estimar um défice da balança de pagamentos em torno de 1,46 mil milhões USDe um nível de reservas internacionais líquidas de 19 mil milhões USD".

Ou seja, o financiamento da diversificação está dependente da capacidade de exportar mais e melhor (o petróleo vai continuar dominante na estrutura das exportações) e das entradas líquidas de capitais externos (normalmente exigentes em garantias, accountability, compliance, combate à corrupção, transparência e inserção do sistema financeiro angolano no sistema financeiro internacional).
Mas ainda se pode descortinar uma outra modalidade de financiamento do investimento médio anual de 55.042 milhões USD: a eficiência das aplicações de capital. Havendo mais eficiência, a sua taxa de retorno aumenta consideravelmente, equivalendo a uma reconfiguração dos valores dos coeficientes capital-produto, reduzindo-os (com os mesmos investimentos conseguem-se os mesmos crescimentos nos valores agregados). Procedendo desta forma e admitindo progressos consideráveis na qualificação dos diferentes tipos de capital (humano, social, empresarial, institucional e material (investimentos em obras públicas), o esforço anual médio de investimento poderia baixar para cerca de 40 mil milhões de USD. Ainda assim, considerável, hercúleo mesmo.
Da aprendizagem que tenho retirado da leitura de muitos textos sobre este tema sobrou o seguinte: há uma boa e uma má diversificação. A boa é a que se centra num modelo de competitividade de altos salários e elevada produtividade. É o modelo que funciona em contextos de economias abertas e de globalização crescente das forças produtivas nacionais. A má diversificação é alicerçada em salários baixos, produtividades incompetitivas e num mercado doméstico fechado e protector de interesses das elites económicas e políticas. A melhoria da competitividade depende, evidentemente, da existência de ambientes de negócios bem estruturados, transparentes e que convidem ao investimento privado. Esta é uma responsabilidade do Governo, do Estado e dos seus serviços de apoio ao funcionamento da economia. Mas depende, igualmente, dos privados, mormente pela libertação da sua mentalidade de assistidos pelas instituições públicas de quem, afinal, dependem para traçar o essencial das suas estratégias empresariais. E não deveria ser assim.
(1) Ministério das Finanças, 3 de Dezembro de 2017
Alves da Rocha escreve quinzenalmente