EUA revêem estatuto de aliado ao Quénia após acordo com a China
No caso do Quénia, país classificado como Principal Aliado Não-Nato por Joe Biden em 2024, a USAID financiou historicamente a inovação e o empreendedorismo. "Sem capital inicial e subsídios, milhares de pequenos agricultores e empresários estão agora sem rede de segurança", salienta Spencer Lynn.
O senado norte-americano ordenou a revisão do estatuto de Principal Aliado Não-Nato (MNNA), atribuído ao Quénia pelo Presidente Joe Biden a 24 de Junho de 2024, depois de o governo de William Ruto aprofundar a sua aproximação à China, que culminou com a assinatura de um acordo bilateral para a eliminação de taxas alfandegárias. O acordo, ultimado em Agosto, abrange exportações agrícolas importantes, que tinham como mercado preferencial os EUA, ao abrigo do AGOA, incluindo o chá, café e abacate, e enquadram-se na estratégia do governo queniano de diversificar as suas exportações após a Administração Trump impor tarifas de 10% sobre as exportações do Quénia.
A iniciativa de revisão do estatuto de MNNA ao Quénia partiu do senador republicano, James Risch, presidente da Comissão de Relações Exteriores, que em Maio alertou para o "desvio alarmante" na política externa do Quénia, após uma visita de Estado do Presidente Ruto a Beijing.
Segundo a emenda SA 3628 ao projecto-lei do Departamento de Defesa para o Ano Fiscal 2026 (S. 2296), o secretário de Estado Marco Rubio, juntamente com os secretários da Defesa e do Tesouro e o director de Inteligência Nacional, têm 90 dias após a publicação da lei para rever o estatuto atribuído ao Quénia e 180 dias para "submeter um relatório confidencial, contendo as conclusões da revisão".
O relatório deverá conter uma "descrição detalhada da relação militar e de segurança do governo do Quénia com a República Popular da China, a Federação Russa e o Irão, incluindo quaisquer compromissos, acordos ou actividades conjuntas desde 24 de Junho de 2024". E ainda, entre outros aspectos, uma "descrição detalhada das ligações políticas e financeiras dos principais intervenientes e instituições políticas do Quénia" com aqueles três países, assim como a participação na Iniciativa chinesa de construção de infraestruturas "Uma faixa, uma Rota", a dívida bilateral e laços comerciais, de acordo com a emenda lida pelo Expansão e que está disponível no site do Congresso norte-americano.
Co-arquitectos de uma nova ordem
O Quénia é o segundo país em África a quem a Administração Trump aponta baterias por causa da sua política externa. O primeiro foi África do Sul, que tem vindo a ser alvo de uma campanha agressiva da Casa Branca pelo seu alinhamento com os BRICS e por ter avançado com uma queixa no Tribunal Internacional de Justiça contra Israel pelo genocídio em Gaza.
A mira do congressista republicano virou-se para o Quénia, em Maio, após o Presidente Ruto condenar "o poder hegemónico e o unilateralismo", numa referência aos EUA, durante uma visita de estado à China, em Abril.
"A actual ordem global está quebrada, disfuncional e já não serve os seus propósitos. O Quénia e a China actuarão como co- -arquitectos de uma nova ordem - justa, inclusiva e sustentável", afirmou o Presidente queniano, numa intervenção na Universidade de Beijing, que provocou fissuras na relação com o seu grande aliado no Ocidente.
Recorde-se que o Quénia foi o primeiro país na África Subsariana classificado pelos EUA como Grande Aliado Não-Nato e o quarto em África, a seguir ao Egipto, Marrocos e Tunísia. Trata-se de um estatuto mais "simbólico" do que prático, como referem analistas, mas que permite acesso privilegiado a treino e equipamento militar dos EUA ao grupo de 19 países classificados como MNNA. Além dos quatro africanos, os EUA atribuíram o estatuto à Argentina, Austrália, Bahrein, Brasil, Colómbia, Israel, Japão, Jordânia, Kuwait, Nova Zelândia, Paquistão, Filipinas, Qatar, Coreia do Sul e Tailândia.
Cortes afectam sobretudo as startups no Quénia
O Quénia é um dos países mais afectados pelo desmantelamento da USAID, de acordo com um relatório da Fundação Mo Ibrahim sobre alternativas de financiamento ao continente (ver infografia). Curiosamente, os cortes no Quénia não afectam áreas tradicionais da ajuda externa, como a saúde e apoio humanitário, mas o ambiente tecnológico e a economia digital.
Segundo Spencer Lynn, estudante na Universidade do Michigan, a USAID financiou historicamente a inovação e o empreendedorismo no Quénia. "Sem capital inicial e subsídios, milhares de pequenos agricultores e empresários estão agora sem rede", salienta.
Leia o artigo integral na edição 839 do Expansão, de Sexta-feira, dia 15 de Agosto de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)