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Angola: Moeda e crédito (2002–2024) | Anatomia de uma soberania em balanço: Entre recuo, cerco e contraofensiva

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Nas sendas fracturadas da trajectória angolana, entre cumes de exuberância petrolífera e ravinas de fragilidade macroeconómica, ergue-se um dos testemunhos mais eloquentes da nossa vulnerabilidade estrutural: a oscilante saga da moeda e do crédito. Entre 2002 e 2024, o país desenha um palimpsesto monetário onde se sobrepõem glórias fugazes e recessos profundos - mais próximo das artes do cerco do que da estabilidade das repúblicas maduras.

I. Activos Externos Líquidos: A Muralha Silenciosa

Os Activos Externos Líquidos (AEL), invisível cinturão de protecção financeira, dilataram-se de forma quase épica entre 2002 (6,1%) e 2006 (88%), escudados pelas copiosas receitas do crude. Esta acumulação ergueu um bastião contra a erosão cambial - verdadeiro escudo em tempos de bonança. Porém, como adverte Sun Tzu, «quem confia na vulnerabilidade alheia, sem fortificar-se a si mesmo, prepara a sua própria ruína». Em 2007, a súbita retracção para 8,6% sinalizava que o cerco já se cerrava por dentro: desequilíbrios fiscais, refluxo de capitais, choque de termos de troca.

Os anos de 2016 e 2017 - ambos com colapso de -30,4% - não foram apenas episódios de crise, mas capítulos de um cerco prolongado. O que fora muralha tornou-se brecha. E mesmo com a tímida recuperação entre 2018 e 2021 (66,4% em 2019), o novo colapso em 2021 (-19,1%) relembrava Clausewitz: «A guerra é a continuação da política por outros meios». Em Angola, essa guerra desenrola-se nos saldos da balança de pagamentos e nas reservas que ora escasseiam, ora regressam como fantasmas intermitentes.

II. Crédito à Economia: A Bateria Silenciosa

O crédito à economia, esse motor de ignição do investimento produtivo, iniciou o século com ímpeto quase revolucionário - 201,2% em 2002; 134,7% em 2003 - numa euforia de reconstrução e liberalização. Mas o fôlego esmoreceu cedo. Em 2004, a contração começa (62,4%) e o declínio persistente culmina em meros 0,7% em 2014. O canhão financeiro silenciava-se no exacto momento em que mais se exigia fogo de cobertura ao crescimento interno.

Entre 2016 e 2018, o avanço foi residual (0,4%), e mesmo a aparente retoma de 22,0% em 2020 não disfarça a fragilidade sistémica. As quebras subsequentes (-3,1% em 2020; -4,5% em 2023) são sinais de colapso de confiança no arsenal bancário. Sir Basil Liddell Hart é categórico: «A estratégia sem finanças é como uma espada sem lâmina». E a espada angolana, nesse campo, tantas vezes se revelou embotada.

III. M3: A Frente Monetária

A massa monetária alargada (M3), entre 2002 e 2008, conheceu uma marcha triunfal: 103,9% em 2008. A expansão fluía como exército em vanguarda, conduzido por uma política monetária ofensiva. Mas as batalhas mudam - e em 2009 (-21,5%) e 2010 (-7,1%) sobrevieram os estilhaços da crise global. Desde então, o avanço perdeu vigor; entre 2014 e 2017, a quase inércia monetária (0,6%) reflectia um campo minado por contradições.

As retrações mais recentes - -9,3% em 2022 e -1,4% em 2023 - revelam não apenas prudência fiscal, mas anemia monetária em contexto de ajustamentos estruturais. A expectativa de 2024 (+37,8%) poderá ser uma alvorada... ou uma miragem. O campo de batalha monetário permanece volátil, incerto, cambiante. Como comandar, quando o inimigo já não veste uniforme e a frente se dissolve em névoa?

IV. A Arte de Sustentar a Moeda

Angola, entre 2002 e 2024, não praticou política monetária - resistiu-lhe. Os indicadores macroeconómicos são mais do que métricas: são cicatrizes e augúrios, são inscrições num mármore ainda em esboço. As crises de 2016-2017 e de 2022-2023 foram mais do que choques exógenos: foram provas da falência de um modelo que depende do exterior para respirar e do petróleo para pulsar. E o que fazer de 2025? Dependerá da reconfiguração de três pilares:

Direcção Monetária com Intenção Estratégica - como em Jomini(01), toda manobra deve ser delineada com antecipação cartográfica

Resiliência Bancária com Redundância Táctica - pois em tempos de colapso, o supérfluo torna-se salvador.

Diversificação Financeira com Âncora Soberana - para que o destino da nação não se jogue nas praças cambiais de alheios impérios.

Leia o artigo integral na edição 834 do Expansão, de Sexta-feira, dia 11 de Julho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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