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Opinião

O que as novas estatísticas das finanças públicas revelam sobre a economia angolana

MILAGRE OU MIRAGEM?

A publicação dos resultados da migração para o novo manual de estatísticas das finanças públicas representa um passo importante na direção certa, rumo à produção de dados mais fiáveis e comparáveis. Mas é preciso ir além da medição. Como já dissemos aqui: Medir ajuda a gerir, mas gerir exige compreender o que se mede e agir em conformidade.

No mês passado, o Ministério das Finanças apresentou publicamente os Resultados da Migração das Estatísticas das Finanças Públicas de acordo com o Manual das Estatísticas das Finanças Públicas 2014. O evento contou com três momentos distintos: uma homenagem merecida à equipa do GEPRI (Gabinete de Estudos, Planeamento e Relações Interinstitucionais), actual e anterior, pelo contributo na melhoria da qualidade das estatísticas fiscais; a apresentação dos resultados da migração; e uma mesa-redonda dedicada à análise do impacto dessa actualização na formulação de políticas macroeconómicas.

O Gráfico 1 mostra que, segundo a nova metodologia, as receitas fiscais (em % do PIB) são significativamente superiores às registadas pela metodologia anterior(1). No período de 2018 a 2024, as receitas atingiram o pico de 26% do PIB em 2022, recuando para 18,6% em 2024, uma queda de 7,4 pontos percentuais. Esse declínio confirma a nossa análise anterior: a actividade económica tem vindo a abrandar, o que reforça a necessidade de o Executivo adotar medidas contracíclicas para reanimar a economia.

No Gráfico 2, observa-se também a trajetória descendente das receitas petrolíferas desde 2022, ano em que alcançaram 19,3% do PIB. Em 2024, recuaram para 12,5%, menos 6,8 pontos percentuais. Já o Gráfico 3, que apresenta o Saldo Primário Não Petrolífero, obriga-nos a revisitar o discurso da diversificação económica. Isso não significa que não existam investimentos fora do setor petrolífero, muitos foram realizados antes de 2017, mas os dados mostram que ainda não geram receitas fiscais suficientes para compensar a queda das provenientes do petróleo.

A mobilização de recursos domésticos continua a ser um desafio para a maioria das economias africanas, Angola incluída. Entre as medidas mais discutidas está o alargamento da base tributária, que depende de um processo de registo mais simples para pequenos operadores económicos e de facilidade no pagamento de impostos.

No sector extrativo, é crucial melhorar a arrecadação fiscal nos segmentos dos diamantes e rochas ornamentais. Contudo, nenhuma dessas iniciativas substituirá a urgência de promover maior liberdade económica. Como temos defendido neste espaço, isso implica remover barreiras estruturais que limitam a capacidade do sistema bancário nacional de financiar projectos privados no sector produtivo.

O Gráfico 4 evidencia os défices fiscais sucessivos desde 2023. Embora nem todo o défice gere inflação, a realidade angolana é distinta. Com gastos públicos elevados e fraca arrecadação, os défices acabam por pressionar os preços, afetando as expectativas dos agentes económicos e fragilizando a confiança na sustentabilidade da dívida pública. Numa economia fortemente dependente das importações, altos défices podem ainda influenciar negativamente a taxa de câmbio, alimentando mais inflação.

Em princípio, uma inflação elevada deveria levar o Banco Nacional de Angola (BNA) a manter ou aumentar as taxas de juro. No entanto, na mais recente reunião do Comité de Política Monetária (CPM), o BNA decidiu reduzi-las, passando a taxa BNA de 19,5% para 19%; a taxa de juro de facilidade permanente de cedência de liquidez recuou de 20,5% para 20%; e a taxa de juro da facilidade permanente de absorção de liquidez passou de 17,5% para 17%. O BNA justificou a decisão com a queda da inflação.

De facto, os dados do INE para Setembro apontam uma redução de 0,72 p.p. face a Agosto e 11,77 p.p. face a 2024. Ainda assim, uma taxa de 18,16% (com Cabinda a liderar com 29,64%, seguida do Cuanza Norte e do Namibe) recomenda maior prudência. Na prática, essa descida das taxas, embora sinalize um esforço para estimular o crédito e o investimento, também reduz o custo de financiamento do Estado junto da banca.

Enfim, a publicação dos resultados da migração para o novo manual de estatísticas das finanças públicas representa um passo importante na direção certa, rumo à produção de dados mais fiáveis e comparáveis. Mas é preciso ir além da medição. Como já dissemos aqui: Medir ajuda a gerir, mas gerir exige compreender o que se mede e agir em conformidade.

1 Podem consultar aqui: https://www.minfin.gov.ao/ estatistica/publicacoes

Leia o artigo integral na edição 851 do Expansão, sexta-feira, dia 07 de Novembro, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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