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Opinião

O rei bem intencionado

Ediorial

Era uma vez um reino que tinha sido despojado das suas maiores riquezas, a população vivia mal mas os homens da corte acumulavam sedas e jóias. Passeavam-se nos melhores coches pelos territórios vizinhos, espalhavam esmolas para manterem a sua impunidade, viviam em castelos fechados, promoviam grandes banquetes entre si.

A vida parecia perfeita até ao dia em que um novo rei tomou conta da coroa, substituindo o antigo monarca que, cansado, optou por partir para outros territórios. O novo rei queria acabar com os comportamentos vigentes, tratou de proceder a algumas alterações nas formas de viver e ambicionava dar uma melhor vida aos seus cidadãos. Rodeou-se de alguns amigos, mas a maioria eram os "antigos" homens da corte, agora mais humildes e subservientes, gritando aos quatro ventos a sua lealdade ao novo monarca.

Sentado no seu castelo começou a fazer contas e, rapidamente, percebeu que afinal o seu reino estava falido e precisava de ajuda dos seus vizinhos. Fez-se à estrada e foi à procura de apoios. A cada saída sua, os homens da corte começaram a perceber que esses momentos eram a oportunidade de tomarem algumas medidas para manterem o seu estatuto. Primeiro por sobrevivência, depois, já com uma estratégia concertada, passaram a estimular as saídas do castelo do seu rei. Este, imbuído do desígnio, lá ia à procura de novos apoios para o seu povo.

E foi ficando cada vez mais longe das decisões do seu reino. Além do desgaste e do cansaço que lhe proporcionava, passou a ter menos tempo para acompanhar os problemas do seu povo. A confiar no julgamento de outros. Foi entregando gota a gota o poder interno em troca de um maior prestígio internacional. E também gota a gota, os homens da corte voltavam a ter mais importância, a exercerem o seu poder, a acumular jóias e sedas. Ele não se apercebia disto porque estava empenhado na sua cruzada.

Um dia quando chegou de uma das suas inúmeras viagens, com a experiência que foi adquirindo, quis mudar a organização do seu castelo. Fez sair uma série de decretos, deu uma série de ordens, fez muitas mudanças. Sentiu primeiro resistência e depois confronto. Avançou para medidas mais duras, mas os homens da corte já não cumpriam. Já não era respeitado. O seu reino tinha sido perdido pela sua ausência, o seu povo está revoltado consigo, e não sabia bem o que fazer. Aqueles que lhe prometeram lealdade, afinal, estavam a caminhar por outras estradas. O que ia fazer a seguir? Apoiar-se no povo que estava desiludido com ele? Voltar a tentar mobilizar os homens da corte? Tentar arranjar outros homens da corte?

Um dia destes, conto-vos o resto desta história do rei bem intencionado, estrategicamente afastado do seu castelo pelos homens da corte.


Editorial da edição 541 do Expansão, de sexta-feira, dia 13 de Setembro de 2019, já disponível em papel ou em versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui.