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Opinião

Os desafios da segurança alimentar em Angola

CONVIDADO

É importante ter-se em conta que, muito além do controlo da taxa de inflação e controlo cambial, a questão da segurança alimentar em Angola deve constituir-se numa preocupação político-estratégica de manutenção da segurança de Estado, estabilidade social e soberania da nação.

O impacto da sustentabilidade alimentar para os países é tão decisiva que, ao tratar a análise estrutural das suas implicações para os países, somos impelidos a relembrar uma célebre frase proferida pelo saudoso ex-secretário geral das Nações Unidas, Kofi Annan, segundo a qual "Without food security, there is no security of any kind" (Sem segurança alimentar, não há segurança de nenhum tipo), reflectindo amplamente os desafios que neste quesito Angola enfrenta, e terá de enfrentar nos próximos anos, no sentido de garantir a segurança alimentar, o que reflexamente poderá reforçar a consolidação de uma das diferentes vertentes de segurança de Estado.

A expressão segurança alimentar surgiu pela primeira vez em documentos oficiais das Nações Unidas, em 1974(1), para alertar em relação aos efeitos que as crises alimentares globais, decorrentes da escassez de grãos e aumento acentuado dos preços dos alimentos, tiveram em países de baixa renda (1972- -1974), especialmente os países africanos, asiáticos e da América Latina, nos quais existia uma forte dependência das importações em consequência da inexistência de sistemas agrícolas eficientes e de elevada produtividade.

Os efeitos das referidas crises geraram um forte impacto geopolítico, impulsionando a criação de programas globais de assistência alimentar, tais como o Programa Alimentar Mundial, por intermédio do qual se procurou incentivar o surgimento de políticas de autossuficiência alimentar, especialmente em países como a Índia, China e Brasil.

A segurança de um Estado, como Angola, não se limita apenas à componente de segurança militar, pois o sucesso desta, em caso de situações de instabilidade depende, igualmente, da garantia de subsistência e bem-estar de todos os angolanos, especialmente no acesso aos alimentos nutritivos.

Neste sentido, na vertente estritamente económica, a segurança alimentar de uma nação não se concretiza apenas com controlo da taxa de inflação ou política cambial, combinadas com programas de estabilidade fiscal, sobre os produtos que compõem a cesta básica, no sentido de garantir a estabilidade dos preços dos produtos básicos, junto das populações. É importante ter-se em conta que, muito além do controlo da taxa de inflação e controlo cambial, a questão da segurança alimentar em Angola deve constituir-se numa preocupação político-estratégica de manutenção da segurança de Estado, estabilidade social e soberania da nação.

Um país como Angola, que depende fortemente das importações de alimentos básicos, para manutenção do bem-estar e acesso alimentar das suas populações, torna-se bastante vulnerável aos choques externos dos preços e às derrapagens das cadeias logísticas globais de alimentos. No limite, o país torna- -se refém de um grupo de interesses económicos com poderes de criar instabilidade económica e fortes convulsões sociais.

Foi exactamente para mitigar as práticas e efeitos referidos no parágrafo precedente que o Estado criou em 2018, através do Despacho Presidencial n.º 102/18, de 31 de Julho, a Reserva Estratégica Alimentar (REA), que, apesar das boas intenções, não alcançou o seu desiderato face à insustentabilidade do modelo funcional e operacional implementado.

A REA, como sabemos, teve como objectivo assegurar o abastecimento de certos produtos fundamentais da cesta básica para garantir a contenção de protestos sociais e segurança alimentar dos consumidores, através da utilização de um stock de produtos no mercado nacional, em situações de choques externos e distorções causados por agentes económicos, para obterem vantagens e maiores margens de lucro no mercado.

Ora, ficou claro que medidas administrativas compensatórias, como a criação da REA, não são sustentáveis, quer no curto e longo prazo, para garantir segurança alimentar junto das populações, por não ter na sua base um modelo agrícola sustentável e assente em infraestruturas de armazenamento, fortes investimentos em ciência e tecnologia nacional, mas sim numa estrutura baseada em importação de produtos alimentares básicos e baixa participação da cadeia produtiva nacional.

A título de exemplo, em 2024, dos sete principais produtos alimentares importados, o Governo teve de gastar aproximadamente 934 milhões USD para importar 676 mil toneladas de produtos que compõem a cesta básica, nomeadamente o arroz, óleo alimentar, açúcar, leite, feijão, farinha e sal, deixando o mercado nacional com um défice de demanda de importação acima das 300 mil toneladas.

Leia o artigo integral na edição 836 do Expansão, de Sexta-feira, dia 25 de Julho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

*Wilson Fonseca, Economista e investigador

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