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Grande Entrevista

"Precisamos de menos leis e de uma melhor gestão"

JOSÉ SEVERINO, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL DE ANGOLA (AIA)

Num balanço de 15 anos, José Severino aponta que, após a crise do petróleo, a gestão das cambiais tornou- -se muito centralizada, evidenciaram-se os sinais de corrupção e a economia começou a afundar e não acompanha o crescimento populacional. O "patrão dos patrões" defende a redução da carga fiscal e um aumento de 50% no salário mínimo nacional, ainda insuficiente para cobrir a perda de poder de compra.

Olhando o País nos últimos nos 15 anos, o que mudou?

Temos de partir do princípio de analisarmos o quadro político em que a economia se desenvolveu. Temos um período, sob gestão de José Eduardo dos Santos (de 9 anos) e outro com João Lourenço. Grande parte destes 15 anos foi sob gestão de José Eduardo dos Santos. E um dos aspectos que me preocupava, logo naquela altura, foi que o País vinha de uma guerra e estava desestruturado, desde as infraestruturas e o tecido económico. Logo os assuntos eram muito debatidos em conselho da república. Focalizou-se como forma de desenvolvimento de melhor governação a descentralização e começou o debate sobre as autarquias locais.

Já se pensava na descentralização, mas até hoje as autarquias são um problema...

A descentralização era um foco muito importante e levou-me a dizer ao então presidente da república que precisava ter uma visão mais holística do País e fugir dos poderes de Luanda.

E a nível económico?

A governação não estava bem e o País vem de uma "petrodólarmania" que resultou depois na fuga de capitais. Portanto, com petróleo em alta tudo parecia caminhar bem, e depois começou a crise do petróleo em 2014. A partir dali, a gestão dos cambiais começou a ser muito centralizada e com os maiores sinais de corrupção e a economia começou a cair. Em contraciclo tivemos o crescimento da população. Por outro lado, quando começou o mandato de João Lourenço, foi logo marcada com a expressão que os cofres estavam vazios. Foi um abalo psicológico e depois começou-se com aquilo que traumatizou a sociedade, a forma como estava a ser levado o combate à corrupção. E isso levou à estagnação dos investimentos.

De que forma?

Os detentores de capitais e de riqueza pararam os seus projectos. Isso vê-se, por exemplo, nos vários edifícios e obras paradas em Luanda. No entanto, começaram a declinar a sua gestão e, obviamente, teve um efeito nefasto na economia. Isto é, além de se ter rebentado os recursos e, ainda por cima, em vez de ajudar o país a sair da crise, entraram como força de bloqueio.

Em 2009, Angola tinha cerca de 22,5 milhões de habitantes e, hoje, aponta-se para uma população à volta dos 36 milhões no território nacional. Como olha para a questão do crescimento demográfico?

O crescimento demográfico devia-se entender como capital humano. Isto é, os países que mais recursos têm deviam ser os que mais crescem o seu PIB, mas isso não se reflecte na nossa sociedade. Tivemos um crescimento populacional acelerado e agravou-se a situação de desemprego e de carestia.

O que falta para retornarmos aos altos níveis de crescimento económico?

Neste momento, é preciso uma reacção. Desburocratização dos processos e mais acção directa de coordenação das políticas. Os dirigentes devem olhar para a economia com mais agressividade para a resolução dos problemas. Precisamos de menos leis e de uma melhor gestão, olhando para as oportunidades que este país oferece. Hoje o nosso foco é a autosuficiência alimentar, que é pertinente, mas um País não vive só desse objectivo. Por exemplo, há áreas do País que não precisam de estar inseridas profundamente neste objectivo. Temos de ver a economia mais transversal na substituição de importação das matérias-primas.

E como deve ser o controlo?

Não vai ser um funcionário da AGT. Tem de ser um ente privado. Vamos abrir um concurso para controlar as nossas fronteiras. Já tivemos um privado nos serviços alfandegários. Olha que um dos grandes problemas tem sido também o contrabando do gasóleo. Temos uma fuga de 300 a 400 milhões USD por ano. Temos de corrigir o nosso solo, porque são ácidos. Mas temos calcário em abundância. Podemos ter calcário a ser transportado via CFB para o planalto, mas há uma inactividade. Há quem diga que é um problema do sector privado, mas eu digo que é um problema de financiamento.

O discurso que existe é que o crédito à economia está a crescer...

Para uma economia que precisa sair de um défice, o Estado deve ter organismos competentes e bem dirigidos para financiar o arranque económico. É aquilo que agora está a começar a fazer com o FGA, FADA e também com o BDA. As crises que estamos a viver vão impulsionar o capitalismo, porque as pessoas têm de encontrar soluções, mas é preciso que o Estado seja capaz de apoiar essas iniciativas. Por isso é que hoje temos uma taxa de empreendedorismo muito alta, mas em contrapartida temos uma taxa de mortalidade das mais altas de África.

Leia o artigo integral na edição 765 do Expansão, de sexta-feira, dia 01 de Março de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)