Relatório da ONU e União Europeia revela números da fome em Angola associados à seca e situação financeira do País
Entre Outubro de 2019 e Fevereiro de 2020, mais de meio milhão de angolanos viviam em situação de crise alimentar ou pior, e destas, 290 mil pessoas estavam já em emergência alimentar, a somar a 1,9 milhões de crianças menores de 5 anos com prevalência "muito alta" de deficiências de crescimento e 65% das crianças angolanas sofria de anemia. São dados pré pandemia que não reflectem as consequências sociais infligidas pela Covid-19, dado que o estudo é anterior.
O relatório que contém todos os números foi apresentado esta quarta-feira na ONU e foi desenvolvido pela Rede Global Contra as Crises Alimentares (GNAFC, na sigla em inglês).
Este organismo, que junta a ONU, a União Europeia e agências governamentais e não-governamentais, revela como causas as condições climáticas severas, não deixando de fora a situação financeira de Angola, como a desvalorização da moeda em cerca de 30% em relação do dólar, e cita a Universidade de Oxford para descrever o facto de grandes partes da população "viverem na pobreza e sem acesso adequado a serviços básicos".
A GNAFC conclui que naquele período, "com a pior seca em 30 anos" a fome em Angola foi, em grande parte, causada pela estiagem e que "as populações locais enfrentaram perda de bens, deslocamentos e meios de subsistência significativamente prejudicados", destacando o relatório que a concentração de pessoas conjugada com a insegurança alimentar aguda nas províncias do sul e "os altos preços dos alimentos básicos", agravaram a situação.
Os autores do estudo referem que os municípios em emergência alimentar foram: Cahama, Cuangar, Cunhama, Gambos (ex-Chiange), Ombadja e Quilengues.
Para o ano de 2021, o relatório alerta que Angola poderá ver-se obrigada a importar cereais em quantidade superior à média, para satisfazer as necessidades de consumo nacionais.
Recorde-se que a emergência alimentar equivale à fase 4 na classificação universal da insegurança alimentar, que é a segunda mais elevada da escala, ao passo que a fase 5 é aplicada em situações de catástrofe.
O relatório alerta que "múltiplas formas de desnutrição continuam a ameaçar o bem-estar das crianças angolanas", que revela prevalência "muito alta" de deficiências de crescimento em 1,9 milhões de crianças menores de 5 anos.
"As deficiências de micronutrientes são prevalecentes, com 65% das crianças sofrendo de anemia", acrescenta ainda o relatório da ONU e da UE, que estende o cenário à situação económica de Angola, baseado na previsão de inflação acima dos 20% para este ano, de acordo com o FMI, "em parte por causa de moeda fraca que perdeu 30% do seu valor em relação ao dólar americano", e da maior pressão nos preços dos alimentos motivada por uma "produção agrícola pobre", que poderá vir ainda a sofrer com pragas de gafanhotos.
Em níveis de insegurança alimentar pior que os angolanos estão os 56 mil refugiados ou requerentes de asilo, quase todos da República Democrática do Congo, revela o relatório.
"Grande parte da população ainda vive na pobreza e sem acesso adequado a serviços básicos", descreve o relatório, que cita a Universidade de Oxford.
Angola, entre 55 países, foi escolhida pelos 16 parceiros que integram o estudo, por serem os países que habitualmente constam em estudos de crises e onde também já estão instalados sistemas de dados, de acordo com Arif Husain, economista do Programa Alimentar Mundial.
A região do mundo mais afetada pela escassez de alimentos é África, onde vivem 97,9 milhões de pessoas nesta situação.
Entre todos os afectados pela crise no mundo podem ser consideradas em situação de catástrofe alimentar ou fome, principalmente no Sudão do Sul (105.000), Iémen (16.500) e Burkina Faso (11.400).