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Opinião

A revolução tecnológica, o crescimento económico e o emprego

Laboratório Económico

Desde o III trimestre de 2013 que a economia está em recessão. Os episódios de crescimentos trimestrais positivos registados entre 2013 e 2019 são esporádicos: de um total de 20 referências estatísticas, 12 respeitam a comportamentos trimestrais negativos. E muitos deles de forma contínua e sistemática.

Consequentemente, as taxas anuais têm sido negativas, num acumulado de - 3,9% entre 2015 e 2018, com expectativas igualmente sombrias para 2019, em cujo primeiro trimestre se registou uma variação em cadeia do PIB de -0,4% (que já foi bem superior numa primeira avaliação do BNA, rapidamente desmentida e retirada das agendas).

Os sectores potencialmente geradores de emprego estão com dificuldades em alinhar a sua actividade por padrões de crescimento continuado, com excepção do da construção, que no I trimestre deste ano variou mais de 11%, de resto em linha com os registos desde 2015. O Comércio tem sido um "desastre", com um somatório de variação, entre os anos de 2015 e 2019, de -11,7%.

A pergunta decorre lógica: nestas condições como criar emprego? Sobretudo com as "ameaças" da automação e da inteligência artificial enquanto potenciadores de substituição de trabalho por capital. E aos quais se não pode fugir querendo-se participar de uma ordem económica internacional (mundial ou regional) cada vez mais competitiva e exigente em ganhos substanciais, consistentes e perenes de produtividade.

Uma taxa global de desemprego de 28,8% da população economicamente activa, correspondente a 3 675 819 de cidadãs e cidadãos sem fontes de rendimento monetário e sem participação nas dinâmicas da economia (muitas ou poucas, não fazem parte delas), ajuda a explicar e a compreender os elevados níveis de informalidade, criminalidade, frustração e gandaíce que grassam pelo País.

Estando muito acima da taxa natural de desemprego, quanta quantidade de crescimento potencial encerra? Uma aplicação simples e directa da Lei de Okun conduz-se a um valor de cerca de 15%, configurando um enorme desperdício actual de recursos de produção.

As províncias mais ameaçadas por este fenómeno são as do interior profundo, onde o desenvolvimento não chega e o conhecimento estagnou, com as seguintes taxas de desemprego: Cunene (65,1% onde a seca mata pessoas e animais, impossibilita a agricultura e também onde a votação no MPLA costuma ser arrasadora, sem as compensações económicas e sociais respectivas), Lunda Sul (46,6% um caso de "doença Holandesa"?), Lunda Norte (43,5%) e Cabinda (39,9%, claramente um exemplo de influência negativa da extracção de petróleo - muito pouco geradora de emprego - sobre as restantes actividades económicas).

Outro ponto de vista igualmente interessante e retirado dos resultados do Inquérito do INE respeita à situação da população jovem (15-24 anos) perante o emprego (1). Luanda é uma das campeãs dos que "nem estudam, nem trabalham" (33,8% do total desta faixa etária), ocorrendo perguntar o que fazem então: marginalidade, criminalidade, pequena burguesia à custa das famílias? (2)

A percentagem nacional deste atributo é de 24,9% questionando-se da eficácia das políticas de juventude que o Governo tem espalhadas por todos os seus documentos de política económica e social. Luanda não está isolada, debitando-se registos negativos às províncias do Cunene (46,8%), da Lunda Norte (40,8%), da Lunda Sul (35,7%) e do Cuando Cubango (29,3%). Nos territórios nacionais raianos (Lundas, Cunene e Cuando Cubango) as actividades ilícitas ligadas aos tráficos fronteiriços e à garimpagem de recursos minerais podem ajudar a perceber de que a juventude vive.

Elevadas taxas de desemprego e reduzidos (por vezes negativos) índices de crescimento consequencializam baixos salários, num quadro de referência de baixa qualificação da mão-de-obra e de garantia de alguns equilíbrios microeconómicos, como o da maximização do lucro empresarial.

A tendência, segundo alguns estudos internacionais (OIT 2019 - que aponta para uma perda sistemática do peso dos rendimentos do trabalho no Produto Interno Bruto, Fórum Económico de Davos 2019, consultora McKinsey) é para a estagnação dos valores das remunerações do trabalho, na sua generalidade e durante bastante tempo. Penso que, em Angola, o valor do salário ainda vai estar sujeito à rigidez das leis do mercado (oferta/procura de mão-de-obra) e às demandas do crescimento económico, se acontecer e quando acontecer em quantidades expressivas, e às exigências da competitividade internacional.

Que mudanças associadas à introdução da robotização e da inteligência artificial nos processos e sistemas produtivos em Angola? Não existem nenhumas evidências quanto a estes efeitos, porque não se fazem estudos sobre estas putativas incidências no médio prazo, ausência, talvez justificada, pelo atraso do País nas diferentes revoluções (industriais, tecnológicas, etc.) (3).

Poupança significativa e sistemática da força de trabalho pelas máquinas, tendendo-se para a visão catastrófica de Jeremy Rifkin, segundo a qual, a prazo e com o desenvolvimento crescente das novas tecnologias, a relação força de trabalho/população poderá ser de apenas 15%? (4) Dos estudos internacionais conhecidos, e especialmente centrados nas grandes economias actualmente dirigentes da economia mundial (Estados Unidos, China, União Europeia) acredita-se que esta visão apocalíptica de Rifkin não vai ocorrer, a despeito de cada vez mais se fazer sentir a robotização dos sistemas de produção e de fornecimento de serviços diversos e do desenvolvimento da inteligência artificial.

Nas contas do Fórum Económico Mundial, a automação pode colocar em risco, até 2022, 75 milhões de postos de trabalho, vai propiciar novos empregos numa quantidade estimada em 133 milhões até 2030, ou seja, um saldo positivo. As classes médias serão as mais penalizadas nesta contabilidade dos salários: os mais altos ocorrerão nas profissões mais complexas, assim como, as maiores dinâmicas de crescimento das economias ir-se-ão verificar nas actividades de maior complexidade tecnológica.

A discussão em torno do fraco crescimento dos salários a nível mundial (revisitar o Relatório da Organização Internacional do Trabalho de 2019), apesar da forte descida do desemprego (aparentemente uma relação desligada da lógica do Teoria Económica) tem centrado a atenção dos economistas.

As explicações adiantadas consideram que a inclusão da China e de outros países asiáticos (tipicamente de baixos salários) nas estatísticas mundiais dos salários, conjuntamente com a automação (propicia diminuição dos custos de produção) podem ser a razão para a estagnação das remunerações do trabalho. Quando se antecipa o futuro, os especialistas dão como certa uma realocação do trabalho para outras tarefas e funções, já conjecturado por Rifkin há mais de 15 anos.

A importação maciça de investimento estrangeiro acelerará estas tendências de substituição de trabalho por tecnologias? De acordo com as estatísticas do BNA sobre o investimento estrangeiro no País, conclui-se que os respectivos valores na economia não petrolíferas são pouco expressivos (em média anual, cerca de 390 milhões de USD entre 2016 e 2018) e acompanhados, sempre, de um montante elevado de saídas, a título de lucros e dividendos (cerca de USD 382 milhões). Não há confiança suficiente para se reinvestirem as mais-valias.

Notas
(1) Os atributos são: apenas trabalha, apenas estuda, estuda e trabalha, não estuda nem trabalha.
(2) Numa análise vertical, Luanda alberga 41,8% de toda a população jovem do país (15-24 anos) que nem estuda, nem trabalha, acabando por ser a capital da preguiça e do "dolce fare niente".
(3) Em que Revolução Industrial se encontra Angola? Nos alvores da independência nacional acreditava-se que o país poderia encetar os passos da segunda revolução industrial.
(4) Jeremy Rifkin - The End of Work: The Decline of the Global Labor Force and the Down of Post-Market Era.