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Opinião

Reconciliação nacional

Editorial

Foi com emoção que assisti ao pedido de desculpas públicas do presidente João Lourenço, em nome do Estado e do governo, pelos acontecimentos de 27 de Maio de 1977, e daquilo que o próprio chamou de "execuções sumárias de um número indeterminado de cidadãos angolanos, muitos deles inocentes".

Os que têm menos de 50 anos, possivelmente, não entendem a dimensão deste pronunciamento, a importância para milhares de cidadãos que viveram grande parte das suas vidas com esta "espinha" atravessada na garganta. Pessoalmente, não achava possível que viesse a acontecer a curto e médio prazo, e por isso foi com enorme orgulho nesta forma de ser angolano, que assisti a este enorme passo para a reconciliação nacional dado pelo Presidente da República. O acto em si é nobre, a forma como foi feito, de forma humilde mas de cabeça levantada, também. "A história não se apaga, a verdade dos factos deve ser assumida para que as sociedades tomem as necessárias medidas preventivas, para evitar que tragédias idênticas se repitam", disse.

Pareceu-me genuíno, de angolanos para angolanos, uma mão estendida para que nos possamos entender, ultrapassar esta constante truculência que nos divide. Mas depois os comentadores acabam por retirar a importância e a dignidade a esta atitude. Do lado da comunicação social pública lá vem o discurso na magnitude do Presidente, a bajulação, o elogio pessoal exagerado, pela boca de gente demasiadamente nova para entender o que se passou. Nas redes sociais aparecem os ataques pelo momento escolhido, a confusão propositada entre este pedido de desculpas e a realidade do País, a obsessão cega de querer associar este pedido a uma estratégia maquiavélica de manipulação com um objectivo eleitoral. E também pela escrita de jovens que ainda não tinham nascido à data dos acontecimentos.

Para os da minha geração, independentemente do lado em que cada um se coloca, emocionámo-nos a ouvir os nomes dos que morreram, a garantia que será feito um esforço para encontrar e devolver às famílias as ossadas, que as certidões de óbito serão passadas aos interessados e transcritas nos livros oficiais. Em 1977 e 1992 morreu muita gente inocente, quadros competentes que podiam ter dado outro trajecto à Nação, nossos amigos e familiares, e foi a imagem de todos eles que me passou pela cabeça enquanto ouvia o discurso.

Não me interessa nada análises descontextualizadas ou teorias da conspiração. Achei um gesto nobre e importante para a tão "divulgada" reconciliação nacional. Espero agora que outros envolvidos dêem o mesmo passo, que peçam desculpa às famílias de outros que também morreram. Para que todos possamos perceber, que apesar de todas as divergências, há mais coisas que nos unem do que aquelas que nos separam. E precisamos de estar mais perto uns dos outros para desenvolver e fazer crescer o nosso País.