Figura de operador económico autorizado facilita processos mas pode favorecer cartéis
Para as empresas que podem concorrer à certificação não há dúvidas: é uma vantagem, que facilita as operações. Investigadores estão divididos, por ser contranatura beneficiar agentes económicos numa economia de mercado.
A nova pauta aduaneira vem consagrar, ou dar corpo de lei, ao Operador Económico Autorizado (OEA), figura criada em 2022 pela Administração Geral Tributária (AGT) e que simplifica os processos de desalfandegamento, sobretudo nos portos, onde a sobreestadia de muitos contentores carregava na factura dos importadores.
Mas se para as empresas que já estão certificados como OEA - num total de 50 em 2023 - este "voto de confiança" da AGT tem "notórias vantagens", porque simplifica os processos e encurta a retirada de mercadoria importada, os investigadores Fernandes Wanda e Heitor Carvalho olham com desconfiança para esta figura, porque coloca os agentes económicos em situação de desigualdade.
"O OEA tem uma série de benefícios que os demais agentes económicos não vão ter. Isso não contribui para uma sã concorrência, um aspecto crucial de uma economia de mercado", justifica Fernandes Wanda, docente e investigador da Universidade Agostinho Neto (UAN). Já Heitor Carvalho, director do Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada de Angola (Cinvestec) reconhece benefícios na melhoria dos processos de desalfandegamento, mas alerta para a necessidade de "não se hostilizarem os pequenos importadores ocasionais que são importantes para impedir a formação de cartéis".
Podem candidatar-se a OEA, os importadores, exportadores, despachantes e transitários. No caso das empresas têm de estar adstritas à Repartição Fiscal dos Grandes Contribuintes, e para isso têm de ter um volume de negócios acima de mil milhões Kz no exercício anterior.
Além da possibilidade de pagamento dos direitos aduaneiros em prestações, o Operador Económico Autorizado tem a possibilidade de apresentar a Declaração de Compromisso de Exclusividade, no prazo de 60 dias, o que veio encurtar os períodos de subestadia dos contentores nos portos, como explicou ao Expansão Farid Bouhamara. O CEO da National Distillers, dona da marca Best, que produz whisky, gin e licor em Angola, salienta os benefícios deste "voto de confiança" que é dado ao contribuinte, permitindo-lhes "continuar a operação", sem custos acrescidos, como acontecia sempre que se verificavam atrasos no desalfandegamento, por "ineficiência" do Ministério da Indústria, que demorava a emitir a Declaração de Compromisso de Exclusividade.
Os importadores e exportadores classificados como OEA ficam ainda dispensados, de acordo com o Artigo 56.º da nova Pauta Aduaneira, de apresentação de garantia no processo de desembaraço aduaneiro e podem realizá-lo com diferimento do pagamento de direitos e demais imposições aduaneiras devidos.
Já os despachantes oficiais e transitários têm prioridade caso sejam seleccionados para inspecções físicas e verificações documentais e ficam dispensados de apresentação de garantia nos processos de trânsito.
Para Fernandes Wanda a atribuição destes benefícios a alguns agentes económicos "pode contribuir para deteriorar ainda mais o ambiente de negócios, já que numa economia que se deseja de mercado deve ser promovida a liberdade económica e não limitar". O investigador da UAN considera ainda que a omissão na identificação dos OEA "abre a possibilidade de arbitragem por parte de agentes do Estado" e "fomenta a troca de favores".
Heitor Carvalho não crê que haja um "efeito significativo" no ambiente de negócios, embora considere positivo estes "pequenos contributos" que ajudam a acelerar os processos dos operadores. Contudo, "é fundamental incentivar sempre alternativa e concorrência", já que quando a actividade dos operadores conhecidos aumenta "é sinal de que há pouca concorrência e cartelização".