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Angola

Introdução de sementes geneticamente modificadas vai beneficiar os grandes produtores

LARGA MAIORIA DAS EXPLORAÇÕES DO PAÍS, QUE SÃO DE CARIZ FAMILIAR, NÃO TEM CONDIÇÕES PARA AVANÇAR NESSA DIRECÇÃO

Ainda está em vigor o Decreto Presidencial n.º 92/04, que proíbe a importação de Organismos Geneticamente Modificados (OGM), mas esta legislação tem os dias contados. As opiniões sobre o tema dividem-se, ao mesmo tempo que falta uma arquitectura institucional funcional para regular a utilização dos chamados transgénicos.

A criação de um Comité de Sementes Geneticamente Modificadas (CSGM), liderado pelo ministro da Agricultura e Florestas, António Assis, é um passo considerável para a introdução deste tipo de produtos na agricultura em Angola. A utilização de sementes tecnologicamente avançadas, com apenas 30 anos de existência e maioritariamente focadas em produtos de grande consumo humano e animal, como são os casos do milho e da soja, exigem um elevado grau de conhecimento para que seja possível atingir os resultados prometidos ao nível da produtividade. No caso de Angola, apenas as explorações agrícolas mais desenvolvidas, que não ultrapassam os 10% do total, têm capacidade para manusear com sucesso este tipo de insumos baseados na biotecnologia.

A primeira reunião do CSGM aconteceu na passada sexta-feira, 19 de Julho, em Luanda, depois de o organismo ter sido criado oficialmente no dia 16 de Julho com a publicação do Decreto Presidencial n.º 158/24. O processo tem sofrido avanços drásticos nos últimos tempos - apenas dois meses antes da criação do comité, em Maio, Angola ratificou o Protocolo para a Protecção de Novas Variedades de Sementes, Direitos dos Melhoradores e Obtentores de Sementes da SADC.

Tudo indica que os principais interessados nestas mudanças são os grandes produtores de milho e de soja do País, tecnologicamente avançados e com recursos para investir, enquanto a agricultura familiar continua refém de questões básicas.

"Introduzir sementes geneticamente modificadas no actual estágio de desenvolvimento da agricultura familiar seria como dar um Ferrari a um camponês. Não vão obter resultados. A viatura até pode chegar ao destino, mas vai terminar toda partida. E isto até pode ter outro efeito negativo, porque os produtores vão acreditar que aquelas sementes são de péssima qualidade", exemplifica João Saraiva, director-geral da empresa Jardins da Yoba, situada na Humpata (Huila), que produz e comercializa sementes melhoradas de milho, entre outros produtos agrícolas.

"No caso das explorações mais avançadas tecnologicamente, a proibição das sementes geneticamente modificadas é igual a ter uma estrada muito bem pavimentada, em excelentes condições, onde apenas estou autorizado a circular num Land Cruiser", descreve Saraiva.

"No caso das explorações familiares, os problemas ainda estão centrados no primeiro anel de evolução, sobretudo no acesso a adubos e produtos químicos de qualidade. Pelo contrário, os grandes investidores já ultrapassaram esses e outros constrangimentos e agora procuram outras soluções", explica Saraiva, que afirma não ser contra a introdução destas sementes no País.

"Mas isso também não quer dizer que seja a favor", sublinha, ao mesmo tempo que defende um outro tipo de debate, que considera ser essencial para o sector agrícola nacional.

"Na minha opinião, o nosso foco deve estar centrado na mecanização, no controlo do perfil do solo, introdução de novas técnicas de plantio e desenvolvimento dos chamados bioinsumos, biofertilizantes e produtos similares", acredita o director-geral da empresa Jardins da Yoba.

Actualmente, cerca de 10% das explorações agrícolas no País são de grande dimensão (apenas 30 operadores) e a área preparada para receber estas sementes não é maior do que 150 mil hectares.

É proibido importar OGM

No que diz respeito aos OGM, apesar da correria que se verifica nos últimos dois meses, Angola não tem sequer uma lei nacional da biossegurança ou uma instituição pública que possa administrar (e investigar, pesquisar e acompanhar de forma assertiva) a sua implementação. Também não foi desenhada, por enquanto, uma estratégia do País para a biotecnologia ou biossegurança e há quem duvide, neste momento, da capacidade interna neste domínio.

No Brasil, por exemplo, existe uma Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (conhecida como CTNBio), com várias atribuições, enquanto o maior utilizador de OGM em África, a África do Sul, possui uma lei específica para os OGM e uma estratégia nacional para a biotecnologia (aprovada em 2001, há mais de 20 anos).

Angola não tem esta estrutura legal e institucional devidamente organizada. O País está mesmo muito longe dessa realidade, mas ainda está em vigor o Decreto Presidencial n.º 92/04, que proíbe expressamente a importação de sementes ou grãos transgénicos.

Na altura, esta decisão governamental foi muito criticada em determinados fóruns, porque Angola, que tinha saído de um conflito militar em 2002, ainda dependia de ajudas internacionais para alimentar parte da população e este impedimento poderia ter efeitos negativos no combate à fome em períodos de emergência.

Leia o artigo integral na edição 786 do Expansão, de sexta-feira, dia 26 de Julho de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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