Governo fecha olhos a estratégia de reperfilamento da dívida para "safar" final de 2024
Nos últimos quatro meses de 2024, o Executivo acelerou a colocação de dívida titulada de curto prazo para "safar" o ano. Alteração de estratégia "bate de frente" com o discurso oficial de que o Executivo tem estado a fazer um reperfilamento da dívida, que consiste na troca de dívida de curto prazo por maturidades mais longas.
O Estado emitiu títulos de dívida pública no valor total de 3,8 biliões de kwanzas em 2024, o que representa um aumento de 6% face aos 3,6 biliões emitidos em 2023, segundo cálculos do Expansão base na informação mensal divulgada pelo Banco Nacional de Angola (BNA). As emissões de 2024 foram superiores aos 3,4 biliões Kz programados no Plano Anual de Endividamento (PAE), o que significa que o Governo emitiu mais 491,5 mil milhões Kz do que o previsto. Para conseguir cumprir as suas obrigações no final do ano passado, nos últimos quatro meses de 2024 o Executivo "fechou os olhos" à estratégia que visava apenas contrair dívida de médio e longo prazo
Nos últimos quatro meses do ano passado, o Governo conseguiu contrariar a "falta de apetite" que a banca vinha demonstrando em relação à divida titulada nos meses anteriores (à excepção de Março quando as taxas de juro estavam bastante altas), contribuído para isso a emissão de 1,2 biliões Kz em Obrigações do Tesouro, que são dívida de médio e longo prazo e de 940,5 mil milhões Kz em Bilhetes do Tesouro, cuja maturidade é de curto prazo (até um ano). A disponibilização de títulos com maturidades mais curtas foi o "chamariz" encontrado pelo Executivo para aguçar o apetite da banca na compra de títulos já que, de acordo com as estatísticas do BNA sobre o mercado primário é possível verificar que as maturidades colocadas foram as Obrigações do Tesouro a 2 anos, e Bilhetes de Tesouro com maturidades de 182 dias e 364 dias.
Assim, as dificuldades que o Estado tem enfrentado para captar dívida pública externa, bem como as necessidades de financiamento no Orçamento Geral do Estado (OGE), levou o Governo a procurar aumentar as emissões de títulos no mercado interno disponibilizando maturidades mais curtas.
As emissões de títulos de dívida pública emitidos em 2024 compreendem os Bilhetes de Tesouro (1,8 biliões Kz) e Obrigações de Tesouro (2,0 biliões Kz). Assim, as emissões de 3,8 biliões são as mais altas de desde que há registos. No entanto, se valores forem contabilizados em dólares, equivalem a 4,4 mil milhões USD, o que representa apenas metade das emissões de títulos públicos emitidos em 2017, quando o Estado emitiu o equivalente a 9,5 mil milhões USD. Isto porque de lá para cá o kwanza tem estado a depreciar de forma abrupta, com excepção a 2022, quando a moeda nacional apreciou de forma artificial, já que o Tesouro Nacional esteve bastante activo no mercado cambial, despachando dólares à banca como já não fazia há anos, numa época marcada pelas eleições gerais no País.
Assim, em 2024, as necessidades de financiamento em sede do OGE 2024 eram enormes e o Executivo não estava a conseguir financiar-se como o previsto, tanto no mercado interno como no externo, e já no final estava obrigado a mudar a sua estratégia de financiamento, não só a nível interno (reduzindo as maturidades) mas também a nível externo, obtendo empréstimos de 1,1 mil milhões USD de instituições financeiras internacionais com taxas de juro próximas dos 10,0% e também com maturidades de apenas um ano (J.P. Morgan e o sul-africano Standard Bank).
Esta alteração de estratégia "bate de frente" com o discurso oficial de que o Executivo tem estado a fazer um reperfilamento da dívida, que consiste na troca de dívida de curto prazo por maturidades mais longas. Não é que não o tenha estado a fazer, tem, mas os últimos meses de 2024 foram duros para os cofres públicos já que além do serviço da divida externa o Executivo estava obrigado a saldar um crédito do BNA no valor de 1,3 biliões Kz, para evitar que fosse violada a lei do banco central, que obriga ao pagamento em cash e no mesmo ano em que concede créditos para conta corrente ao Estado. Por isso, não teve outra hipótese senão tirar o "travão de mão" às maturidades curtas na dívida interna e à alta de juros na externa.
Mas antes desse ímpeto no final do ano, o Governo tinha encontrado um mecanismo para garantir liquidez imediata através da emissão de Obrigações do Tesouro em Moeda Externa (OT-ME), o que também contraria a estratégia em vigor que visava não emitir mais títulos indexados a moeda estrangeira: a primeira em Março, com maturidades mais longas, entre 7 e 10 anos, com vencimentos em Fevereiro e Setembro de 2031, Janeiro e Junho de 2034, no formato de Bookbuilding (determinação do preço com base em consulta prévia a investidores institucionais). Os títulos contabilizados como dívida interna pagam cupões numa base semestral. De acordo com a Unidade de Gestão da Dívida Pública (UGD), esta operação permitiu a captação de 156,75 milhões USD.
A segunda foi anunciada em Julho, igualmente no formato de Bookbuilding e com maturidades de 7 e 10 anos, com vencimentos em Fevereiro e Setembro de 2031, bem como Janeiro e Junho de 2034. Foram emitidos considerando a taxa da primeira emissão realizada, que também pagarão cupões numa base semestral. A operação teve como data de conclusão o dia 16 de Agosto, e o Estado conseguiu captar cerca de 250 milhões US.
Leia o artigo integral na edição 810 do Expansão, de sexta-feira, dia 07 de Fevereiro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)