Morte do Prestígio é efeito colateral de plano para salvar Banco Económico
Grupo de economistas, analistas do sector financeiro e académicos questionam a inércia do banco central por permitir fim do banco que tinha entre os accionistas filhos do falecido José Eduardo dos Santos. Dizem que o BNA é forte com os fracos e fraco com os fortes.
Salvar o Banco Económico teve como efeito colateral a morte do Banco Prestígio, já que os seus accionistas, apesar das tentativas, não conseguiram aceder ao dinheiro que tinham depositado no ex-BESA e que tinha como destino um aumento de capital naquele que, no final de 2021, foi o segundo menor banco em activos do sistema financeiro nacional.
O Prestigio viu a sua licença revogada a 30 de Setembro, com o Banco Nacional de Angola (BNA) a justificar esta decisão com a "reiterada violação de requisitos prudenciais, nomeadamente, manutenção dos fundos próprios regulamentares e rácios de fundos próprios abaixo do mínimo legal, ineficácia na implementação das medidas de intervenção correctiva determinadas pelo Banco Nacional de Angola, a indisponibilidade accionista e a inexistência de soluções credíveis para a recapitalização do banco".
No entanto, de acordo com uma nota da instituição bancária, parte dos seus accionistas têm depósitos no Banco Económico e foram "apanhados" pelo já moroso processo de reestruturação daquela instituição bancária. Isto porque como a solução para o ex-BESA gizada entre o banco e o BNA passava por transformar os depósitos dos seus maiores depositantes em capital do banco, e numa altura em que a instituição se debatia com graves dificuldades de liquidez, o Económico acabou por não efectuar "as transferências solicitadas" pelos accionistas do Prestígio, "mesmo após duas reclamações ao supervisor". Segundo a nota, sobre este incumprimento, o BNA apenas respondeu que a instituição ou accionistas devem reclamar "os direitos que lhe assiste, recorrendo a outros meios de resolução de litígios".
Foi assim que o Prestigio refere que os seus accionistas, numa tentativa de evitar a perda da licença, apresentaram então ao supervisor uma proposta de venda de 80% do capital do banco, tendo o BNA respondido que "o processo estava incompleto, enumerando os documentos em falta", a 22 de Setembro, tendo "o banco Prestigio enviado os documentos solicitados pelo supervisor" a 27 de Setembro. "Sem que o BNA tivesse dado resposta definitiva ao banco Prestigio, relativa à apreciação da proposta de solicitação de venda das acções, nem obrigado o Banco Económico a efectuar as transferências pendentes solicitadas pelos accionistas do Prestigio, o BNA revogou a licença do banco" a 30 de Setembro.
Assim, a estratégia do banco central que previa apenas salvar o Banco Económico acabou por "varrer" o Banco Prestígio da lista de instituições bancárias autorizadas e licenciadas a operar no país, já que os recursos dos accionistas daquela instituição depositadas no ex-BESA nunca chegaram a ser transferidos, com parte deles a serem usados na constituição de um fundo que passou a ser o novo detentor do ex-BESA.
Ao Expansão, economistas, analistas dos mercados financeiros e advogados referem que o Prestigio foi uma "vítima" da reestruturação do Económico e que o BNA tinha em mão uma "infinidade" de soluções que não fossem a liquidação do banco. Aliás, apontaram mesmo que foi o próprio banco central, regulador do mercado, que "engendrou" a estratégia de salvação daquele banco que acabou, segundo advogado Evaristo Maneco, "quartando" os direitos dos depositantes. "Numa situação desta natureza, qualquer um de nós estaria com as mãos atadas. Estando com as mãos atadas, não teria a liberdade de movimentar os seus valores como bem entendessem", apontou Evaristo Maneco.
Por sua vez, Luís Lunga, outro advogado, e o economista Wilson Chimoco foram mais longe e dizem que este foi mais um caso em que o banco central teve dois pesos e duas medidas. Ou seja, castigam-se uns e salvam-se outros. "A relação de depósitos é uma relação obrigacional. Essa reestruturação não me pode impedir. A relação bancária é uma relação de confiança, em que eu te entrego os meus valores e vou levantar quando eu precisar. É uma relação de confiança e de dispobilidade", criticou Lunga.
O conselho de administração do banco que tinha Welwitcha dos Santos e José Paulino dos Santos (Coreon Dú), ambos filhos do falecido ex-Chefe de Estado José Eduardo dos Santos, escreveu, em comunicado publicado na sua página do Facebook do Banco Prestígio que, à data de 31 de Dezembro de 2021, a instituição tinham os fundos próprios regulamentares na ordem dos 9,040 mil milhões Kz, ultrapassando o valor mínimo exigido de 7,5 mil milhões Kz.
Mais tarde, e devido à contínua apreciação do Kwanza, que ocasionou a desvalorização dos títulos do tesouro, os donos do banco tomaram conhecimento na reunião da assembleia geral ordinária de 30 de Março, que os fundos próprios que em 2021 ultrapassavam o mínimo exigido, já estavam abaixo do valor mínimo regulatório.
Face a este quadro, o banco diz que iniciou diligências que levariam ao reforço dos fundos próprios para um valor, segundo a nota da instituição, acima do mínimo requerido por lei, injectando um total de 3,3 mil milhões Kz. Apesar deste reforço, os recursos não chegavam para dar cobertura ao que a entidade bancária designou por "contínua apreciação" do Kwanza, ditando o fim da instituição bancária que tinha Maria Luísa Abrantes como presidente da mesa de assembleia geral.