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Tencent é reflexo da devoção dos chineses à Internet

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A consolidação daquela que é, simultaneamente, a maior rede social e empresa de entretenimento online da China é o reflexo da devoção dos chineses às empresas que operam na internet.

No primeiro trimestre, consolidou ainda mais as suas já milionárias receitas, e para breve está o reforço da sua conhecida aplicação WeChat, a qual também tem uma vertente de pagamentos móveis.

Companhia que tornou muitos investidores milionários - um dos que entrou pouco após o arranque, no início deste século, foi o sul-africano Koos Bekker, que hoje se 'senta' numa 'torre' de yuans -, a Tencent é um caso paradigmático do sucesso das dot-com.

E também do poder económico da China, que se vai alargando mundo fora. África e Europa captaram já avultados investimentos nas áreas da agricultura e infra-estruturas, no nosso caso, e, no continente a Norte do nosso, de energia e indústria automóvel.

Os EUA vão conseguindo travar as investidas, invocando defesa de interesses estratégicos, com telecomunicações e tecnologias web em destaque - algo que não demoveu a Tencent de gastar mais de 150 milhões USD no último ano para comprar empresas de jogos online.

Desde há dias, a América Latina provou ser a nova conquista de vulto do capital chinês, com o Brasil em grande destaque. O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, esteve há uma semana naquela região e só no país de Dilma assinou acordos acima dos 50.000 milhões USD, com a Petrobras e Embraer, como algumas das companhias beneficiadas pelos yuans.

Da estratégia de abertura da China à economia de mercado, um dos resultados bem conseguidos para os chineses tem sido o aparecimento de companhias com envergadura para avançarem além-fronteiras. Dados recolhidos pela Bloomberg mostram que, só este ano, o mercado de capitais chinês já abriu portas a 120 ofertas públicas iniciais (IPO), que totalizaram 11.500 milhões USD.

Para efeitos de comparação, nos EUA, economia com avanço de várias décadas face ao 'império do meio' em mercado livre, houve 76 negócios com 14.200 milhões USD movimentados.

Neste capítulo, é impossível não falar da Alibaba, uma espécie de Ebay chinês que o bilionário Jack Ma criou, ao lançá-lo em Wall Street em Setembro do ano passado. Então, tornou-a na maior IPO de sempre, a nível mundial, levantando 25.000 milhões USD - o anterior recorde estava nos 22.100 milhões USD, alcançados também por uma empresa chinesa, Agricultural Bank of China, que em 2010 foi lançada na bolsa de Hong Kong.

A aparente loucura em torno de um empresa de comércio electrónico encontra explicação, desde logo, na dimensão da população chinesa, que, ao totalizar perto de 1.400 milhões de pessoas, cria um potencial mercado superior à soma de todos os países africanos - dados da Unicef.

Retomando à Ásia: dados da consultora McKinsey prevêem que o comércio electrónico na segunda maior economia mundial chegue aos 395.000 milhões USD, triplo do volume gerado em 2011. Com capitalização acima da fasquia dos 1.000 milhões USD, Pequim tem 20 tecnológicas.

A fazer milionários desde 2001

É neste cenário que emerge a Tencent. No dia 20, à Bloomberg, o CEO do China Renaissance, banco de investimento de Pequim, explicou a sua visão sobre o potencial das empresas electrónicas.

A Tencent é, diz, oportunidade de "uma vez na vida". Sobre os investimentos que este século já permitiu no sector tecnológico, Bao Fan, CEO e fundador da Renaissance, referiu a geração inicial, na era do PC, que depois transitou para o móvel, seguindo-se agora o hardware inteligente e tecnologia de robótica.

A Tencent é hoje inegavelmente uma companhia de dimensão mundial. Mas, para olhar a sua génese, basta recuar década e meia. Pouco depois, em 2001, quando muitos enterravam dinheiro em projectos dot-com, alguns começavam a fazer-se milionários.

Entre eles, um investidor próximo de nós, o sul-africano Koos Bekker, que, através do seu grupo de media, Naspers, empregou 32 milhões USD para adquirir metade do capital da então obscura Tencent.

Essa posição vale hoje 66.000 milhões USD - e tal foi a experiência que Bekker andou a percorrer o mundo à procura de outro tiro na mouche, ainda que admita que em muitos países, as boas hipóteses já foram tomadas.

Bastarão esses números para perceber a dimensão da escalada de valor da holding chinesa, na qual se inclui o maior portal de internet daquele país. A companhia de Shenzhen tem ainda serviços de telefone móvel, redes sociais, internet móvel, media online e entretenimento interactivo, entre outros.

O seu serviço QQ, software de mensagens instantâneas, oferece uma variedade de serviços, incluindo jogos online, música, compras, microblogging, filmes, jogos e chat de grupo. Números do início do ano revelam que o QQ tem 829 milhões de contas activas. Ainda que muito longe dos mais de 1.400 milhões de utilizadores do Facebook (em números redondos, o total da população chinesa), o QQ conta com quase o triplo das contas activas do Twitter, que, também no início do ano, contava 302 milhões.

No portefólio dos chineses está ainda o Tencent Messenger, direccionado a empresários e concorrente do Windows Live Messenger. Este mundo da conectividade, que entre nós ganha preponderância em quase todos os cenários, do escritório a casa ou à praia, passando pelos restaurantes, convenções e reuniões, na China é ainda mais prevalente.

Mais de quatro quintos dos chineses ligados à net já usam dispositivos móveis como a sua forma primordial de aceder à rede. Entre os muitos serviços disponíveis, os jogos online são um activo querido para a Tencent, que, com a sua ajuda, reforçou no primeiro trimestre do ano as suas receitas para 3.600 milhões USD, 22% acima do período homólogo. Só de lucros, foram 1.100 milhões.

O CEO da companhia, Ma Huateng, salientou, por altura da apresentação dos resultados, que, naqueles três primeiros meses de 2015, a empresa prosseguiu com a expansão da base de utilizadores do móvel e melhorou a interacção com estes, ao mesmo tempo que registava "resultados financeiros sólidos".

"Os nossos activos-chave móveis estenderam a sua liderança na China e continuaram a alargar as actividades dos utilizadores do social e comunicações aos jogos, entretenimento, conteúdos de media, pagamentos e mais além", disse o CEO, salientando um dado relevante para os investidores: "Conduzida pelo social e anúncios de vídeo, as nossas receitas totais de publicidade mais que duplicaram na relação de ano para ano".

Entre as acções recentes que visam reforçar o portefólio de produtos está o investimento de 60 milhões USD em parte do capital do criador de jogos Pocket Gems, uma start-up de São Francisco.

Isto ocorreu já este mês, sendo a mais recente aposta de uma continuada estratégia que incluiu também a compra de 14,6% da companhia de jogos online Glu Mobile, em Abril, por uns mais expressivos 126 milhões USD.

Com esta compra, os chineses conseguem a visibilidade dada por acordos existentes entre a Glu Mobile e estrelas de Hollywood como Kim Kardashian. Ou Britney Spears, que há dias assinou um acordo com a Glu para uma parceria cujo primeiro título de jogo online surgirá no primeiro semestre de 2016.

Ainda neste segmento, em Dezembro, a Tencent já tinha adquirido quota minoritária nos criadores de jogos japoneses Aiming, e há um ano, em Maio, aplicou 500 milhões USD em 28% dos coreanos CJ Games Corp.

Tudo isto num segmento em rápida expansão na China, com as receitas a crescerem dos 14.800 milhões de yuans em 2013 para 27.600 milhões (4.400 milhões USD) no ano passado, segundo dados da iResearch. Para este ano, a consultora prevê que as receitas subam para 40.800 milhões de yuans.

Destes parceiros não chineses, a Tencent pretende uma ajuda para construir uma plataforma dominante nos jogos de smartphone - a empresa, muito dependente de jogos móveis e online para encher os seus cofres ao final do ano, distribui estes produtos através de lojas de aplicações e das plataformas de mensagens QQ e WeChat.

Em troca, os criadores de jogos móveis pretendem aceder ao tentador mercado chinês, no que não será despiciendo entrarem de mão dada com um gigante daquele gigantesco país.

O Facebook chinês

O produto mais conhecido da Tencent será, talvez, a aplicação de mensagens gratuitas WeChat, à qual os utilizadores continuam a aderir, tendo passado de 500 para 549 milhões no primeiro trimestre do ano, dados revelados pelo seu CEO.

Para potenciar as receitas através desta que é a sua jóia da coroa, os chineses abrirão mais a plataforma aos empresários que a utilizam, de modo a que diversifiquem as ofertas de serviços e garantam a fidelização dos seus próprios clientes. Os utilizadores do WeChat que tenham uma empresa poderão, por exemplo, criar as suas próprias campanhas de marketing e gerir a atribuição de cupões de descontos através das lojas próximas de cada utilizador do serviço da Tencent.

A partir da experiência pública do Facebook, bitola do sucesso das redes sociais, a Tencent tem podido tirar algumas conclusões, desde logo o potencial das receitas de publicidade. Os números são claros: as receitas da publicidade online cresceram 131% no primeiro trimestre, face ao período homólogo, para 444 milhões USD.

O mercado aprecia estes valores e a companhia já vale 190.000 milhões USD. O estofo financeiro permitiu-lhe adquirir, em Abril, os direitos de streaming dos canais da empresa Twenty-First Century Fox, designadamente Fox, Fox Sport e National Geographic Channel, os quais se juntam a direitos da Sony e Warner Music Group e da NBA - esta, contratada em Janeiro último, num acordo de exclusividade para a China.

Numa entrevista recente à Reuters, o líder da estratégia da Tencent, James Mitchell, afirmou que na empresa criada por Pony Ma em 1998, a estratégia é comprar "conteúdos populares" e "as marcas melhor estabelecidas". Junte-se a isto jogos online que rivalizam com a Sony, Microsoft e Nintendo, o maior serviço de streaming musical da China (em número de subscritores), uma popular plataforma de vídeo e, claro, WeChat e QQ, e temos uma companhia com uma capitalização bolsista que ultrapassa em muito o PIB nacional.

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