Desafios para a criação de uma sociedade empreendedora
Angola tem múltiplos desafios pela frente, por isso, é necessário que haja um verdadeiro impulso ao empreendedorismo.
O empreendedorismo é um tema central na agenda dos países que tencionam promover o desenvolvimento e a criação de riqueza nas suas economias.
A importância conferida a este instrumento deriva da sua capacidade de geração de emprego e renda, através da exploração do potencial criativo e inovador existente nos indivíduos que constituem as sociedades modernas. José Dornelas, especialista brasileiro em empreendedorismo e planos de negócios, afirma que empreendedorismo significa fazer algo novo, diferente, mudar a situação atual e buscar, de forma incessante, novas oportunidades de negócio, tendo como foco a inovação e a criação de valor.
Existem basicamente dois tipos de empreendedorismo: o empreendedorismo por necessidade e o empreendedorismo por oportunidade. O primeiro refere-se aos indivíduos que entram para o mundo dos negócios movidos pela sobrevivência.
A dificuldade no ingresso no mercado de trabalho formal e a inexistência de recursos para satisfazer as necessidades básicas (alimentação, saúde, vestuário) impulsionam os mesmos a enveredar sem planificação prévia, em regra, para qualquer actividade comercial, mormente aquelas ligadas ao sector informal da economia (ex.: venda ambulante).
Por outro lado, existe o empreendedorismo por oportunidade, que surge quando um indivíduo identifica uma conjuntura favorável à criação e desenvolvimento de negócios.
Este tipo de empreendedor, regra geral, antes da materialização de uma ideia de negócio, elabora uma estratégia que leva em conta aspectos técnicos, financeiros e humanos necessários para atender as exigências do mercado consumidor.
Ao analisarmos o resultado do Estudo Global de Empreendedorismo em Angola, referente a 2012 (GEM Angola 2012), vemos que houve um crescimento no percentual de empreendedorismo por oportunidade. De 2010 a 2012, este indicador cresceu 8,8%, passando de 30,5% para 39,3% nos respectivos anos.
O mesmo estudo também releva que o empreendedorismo por necessidade decresceu 15%, passando de 42,2% em 2010 para 27,7% em 2012. Estes dados são bastante animadores, se tivermos em conta que é o empreendedorismo por oportunidade que permite o surgimento de empresas competitivas.
É Importante salientar que países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento (Estados Unidos, Alemanha, Brasil, etc.) apresentam em suas economias elevados índices de empreendedorismo por oportunidade.
Este factor tem contribuído para o alcance dos altos níveis de crescimento e desenvolvimento económico que os mesmos vêm alcançando. Angola tem múltiplos desafios pela frente, por isso, é necessário que haja um verdadeiro impulso ao empreendedorismo por oportunidade, que dê sinalização positiva às pessoas que ambicionem gerar valor para a sociedade, de modo individual ou colectivo, através de atitudes criativas, inovadoras, autónomas e sustentáveis.
Para o cumprimento deste desiderato, é imprescindível atentar para três premissas fundamentais; o ambiente institucional, as competências técnicas e as competências comportamentais:
1. Ambiente institucional: Evidencia o empenho dos líderes políticos em estimular e realçar a importância do empreendedorismo para o fortalecimento da economia.
Para a materialização deste compromisso, o Estado deve criar um quadro jurídico-legal que permita apoiar o surgimento e o crescimento das micro, pequenas e médias empresas, bem como promover a internacionalização das grandes empresas.
Este apoio passa concretamente por simplificar os processos legais para constituição e extinção de empresas, redução da carga tributária, atribuição de isenções fiscais quando necessárias, garantia de acesso simplificado aos programas financeiros governamentais, criados para que as empresas consigam sobreviver aos primeiros anos de actividade.
Neste quesito, os avanços de Angola são notáveis, e o realce vai para a aprovação da Lei n.º 20/11, de 20 de Maio - Lei do Investimento Privado, da Lei n.º 30/11, de 13 de Setembro - Lei das Micro, Pequenas e Médias Empresas, além do Decreto n.º 40/12, de 13 de Março, que cria o Balcão Único do Empreendedor e aprova o seu estatuto orgânico.
O programa de apoio financeiro Angola Investe, consubstanciado em garantias de crédito complementares, bonificação de taxas de juro e assessoria empresarial, também constitui uma demonstração clara do empenho do Estado no fomento do empreendedorismo. Anseia-se que, com conhecimento e recursos, as micro, pequenas e médias empresas consigam obter êxito nas suas actividades.
2. Competências técnicas: Abrange todas as ferramentas de gestão necessárias para a boa condução dos negócios: estudo de viabilidade técnico-financeiro, marketing, contabilidade, finanças, recursos humanos e demais aspectos fundamentais para levar os empreendimentos a bom porto.
Os institutos de ensino médio, as universidades, as escolas de negócios e os institutos públicos de apoio aos empresários (ex.: INAPEM) têm um grande papel no que tange a responsabilidade de transmissão dos conhecimentos acima referidos.
De modo a garantir uma melhor assimilação dos conhecimentos, seria uma experiência desafiante e inovadora se os órgãos envolvidos no ensino dos instrumentos de gestão em Angola unissem as suas experiências, com o propósito de criarem um Modelo de Gestão Angolano.
Este modelo seria responsável pela introdução das melhores práticas de gestão nas empresas, considerando a conjuntura económica e a cultura dos empresários nacionais. Pois há notáveis diferenças entre culturas, posicionamento estratégico e a mão-de-obra dos países utilizados como referência para o ensino da gestão em Angola.
Para ultrapassar este constrangimento, poderia utilizar-se no processo de ensino estudos de caso de empresas angolanas que obtiveram sucesso, analisando as ferramentas que as mesmas empregaram para enfrentarem os desafios inerentes ao ambiente empresarial angolano. De modo similar, poderia usar-se casos de empresas que tinham tudo para ser bem-sucedidas, mas não conseguiram lograr êxito no seio do tecido empresarial nacional.
A implementação deste modelo permitir-nos-ia visualizar o ensino além da perspectiva do know-how, isto é, a transmissão do conhecimento necessário para compreender o passo-a-passo do processo, de como as coisas devem ser feitas.
O novo modelo seria baseado no know-why, ou seja, entender o porquê de determinada coisa ter de ser feita de um um jeito e não do outro. Esta reflexação abriria caminhos para percebemos de que forma poderíamos implementar o conhecimento testado noutros ambientes económicos.
3. Competências comportamentais: dos três aspectos referenciados como fundamentais para criação de uma sociedade empreendedora, esta componente parece ser a mais desafiadora, pois o empreendedorismo é sobretudo uma questão de atitude, as pessoas consideradas empreendedoras apresentam certas características que lhes permitem lidar com riscos, incertezas e adversidades inerentes à actividade empreendedora.
Particularidades como iniciativa, ousadia, inovação, persistência e inconformismo são patentes do comportamento empreendedor. Este padrão de comportamento apresentado pelo empreendedor remete-nos para uma pergunta que habitualmente é feita: pode-se ensinar o empreendedorismo? Louis Jacques Filion, especialista em empreendedorismo, afirma que sim, desde que sejam utilizadas metodologias pedagógicas específicas.
Para este investigador, o empreendedorismo aprende-se geralmente pela transmissão de valores, através do contacto directo com empreendedores. Em Angola, temos muitos empresários bem- -sucedidos que poderiam dedicar uma pequena parte do seu tempo à realização de palestras nas instituições de ensino, de modo a passarem as suas experiências, com intuito de despertar o potencial empreendedor dos alunos do ensino básico, médio e universitário.
Depois das reflexões apresentadas, concluímos que, para a criação de uma sociedade empreendedora, que seja capaz de explorar o grande potencial criativo e inovador existente no seio da população angolana, é necessário fazer confluir simultaneamente os três aspectos acima enumerados.