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Opinião

O papel dos diferentes sectores de actividade na distribuição do rendimento nacional

Análise

A capacidade de se repartir (em termos primários ou também do chamado rendimento base) mais rendimento nacional pelos factores de produção, em particular o trabalho, depende do crescimento económico, da qualificação da mão-de-obra e dos ganhos de produtividade.

 

A taxa de variação do PIB nacional tem vindo a perder fulgor depois de 2008, e as previsões até 2019 apontam para uma taxa média anual de crescimento económico na vizinhança de 5%(1). No entanto, o objectivo do Governo de melhorar as condições de vida pelo aumento dos rendimentos das famílias ainda pode ser conseguido através do rendimento bruto e do rendimento disponível, isto é, pela repartição secundária do rendimento (redistribuição pela via fiscal e das contribuições sociais).

A realidade actual é a de um peso muito desproporcionado dos rendimentos do capital no PIB ou no Rendimento Nacional (depois de operados os adequados ajustes), receando-se que se torne estrutural e se apresente com uma elasticidade rígida na ausência de políticas sociais incisivas que favoreçam os rendimentos do trabalho.

Tal como se encontra a situação e face a informações de outros países, Angola é um dos que mais discriminação negativa consentem às remunerações da força de trabalho. A perda de fulgor do crescimento económico nacional também afecta os diferentes sectores de actividade, ainda que de distintas maneiras.

A agricultura e actividades conexas, as pescas, a extracção de diamantes, a extracção de petróleo, a manufactura, a construção e os serviços não mercantis têm apresentado tendências de atenuação do seu crescimento passado, sobretudo entre 2003 e 2008.

Se estas tendências se mantiverem até 2017/2019, ao que se deve adicionar a natureza capital/tecnologia intensiva de algumas das actividades económicas enumeradas, então o peso relativo das remunerações do trabalho no Valor Agregado de cada sector poderá manter-se em redor da média registada entre 2002 e 2010: em torno de 45% para o sector dos serviços financeiros, 4% na extracção de petróleo, em torno de 20% em alguns serviços e cerca de 18% na indústria transformadora, uma das actividades motoras da diversificação da economia.

No geral, a evolução do peso dos salários no Valor Acrescentado Bruto (VAB) reflecte, também na economia angolana, a sua típica natureza anticíclica (assemelhável a um estabilizador automático), que surge porque os salários tendem a ser menos voláteis do que as restantes componentes do rendimento nacional em situações de recessão económica e crise financeira.

Baseados em expectativas positivas sobre a curta duração das situações económicas atípicas, os agentes económicos e os empresários mantêm trabalhadores e salários durante esse período como forma não só de contribuírem para a sua ultrapassagem rápida pela procura global, como para reter os melhores trabalhadores e assim não se perder investimentos em formação e qualificação da mão-de-obra. O valor médio de participação dos rendimentos do trabalho no rendimento nacional é de 22% no período 2002/2010.

Uma das formas de se avaliar a capacidade dos sectores contribuírem para a melhoria na repartição do rendimento - ao seu nível do VAB - é pelo diferencial entre produtividade média bruta aparente do trabalho (ou pela sua taxa de variação no tempo, ou sejam, os ganhos de produtividade) e o salário médio.

Exceptuando os sectores de enclave - petróleo e diamantes, onde as diferenças entre produtividade e salários são, com efeito, abissais, tornando-os nos mais aptos a proceder a aumentos salariais que concorram para melhorar a participação das remunerações do trabalho nos respectivos Valores Agregados - outros também se mostram com essa aptidão. São os casos dos serviços imobiliários - uma das actividades actualmente mais lucrativa do país -, a banca e os seguros, os correios e telecomunicações e, curiosamente, a electricidade.

Ainda que se trate de actividades altamente intensivas em capital e tecnologia, cada vez mais caros, mas com retornos marginais ainda significativos e onde as exigências de lucros e dividendos da parte accionária são elevadas, é possível e desejável que aumentem a sua contribuição para a redução das desigualdades na repartição do rendimento, pela via directa, qual seja, do incremento salarial ou do aumento de emprego.

Para além, evidentemente, das acções de responsabilidade social que algumas empresas destes sectores efectivam. Em relação aos chamados sectores directamente estruturantes da diversificação da economia (agricultura, manufactura, construção e transportes), a respectiva capacidade de distribuir melhor é variável.

Da forma como a actividade agrícola e conexas são contabilizadas nas Contas Nacionais não emerge nenhum excedente entre produtividade e salários, o que não que dizer que seja, ab initio, excluída do painel das actividades que possam dar o seu contributo para a melhoria das remunerações do trabalho.

A manufactura e a construção, apesar de, em termos absolutos, os valores das respectivas produtividades serem baixos (em especial em comparações internacionais), ainda assim apresentam diferenciais entre produtividade e salário que devem ser estudados. Algumas aplicações podem ser possíveis:

a)Investimentos adicionais em modernização tecnológica dos equipamentos (aparentemente a idade média da maquinaria em Angola ainda é elevada, redundando numa indesejada obsolescência tecnológica de resultados nefastos sobre a competitividade das empresas e do País), com consequências positivas sobre o incremento da produtividade e dos retornos para o factor capital.

b)b) Incremento do emprego(2). Pode estabelecer-se aqui uma espécie de trade off entre aumento de salários e alargamento do emprego. A primeira opção favorece quem actualmente trabalha, mas pode prejudicar quem precisa de trabalhar (salários mais elevados podem retrair a procura de mão-de-obra). A segunda via depende do coeficiente trabalho/capital das actividades produtivas.

c)Investimentos na maior qualificação dos empregados e empresários, com efeitos igualmente benéficos sobre a produtividade.

d)Repartição proporcional dessas diferenças entre os factores de produção.

No sector dos transportes, armazenagem e actividades conexas, depois de um período áureo de crescimento muito intenso da produtividade, depois de 2010 esbate-se, como consequência, pelo menos em parte, dos efeitos da crise económica mundial, mas também de alguns factores internos relacionados com as infra-estruturas rodoviárias, ferroviárias e portuárias.

(1)International Monetary Fund - World Economic Outlook, April 2014 and Angola - Second Post-Program Monitoring, March 2014.

(2)A assiduidade ao trabalho é um dos valores económicos das economias de mercado, mesmo dentro dum paradigma mais suave de capitalismo denominado economia social de mercado. Em Angola, paticamente em todas as actividades directa ou indirectamente produtivas, a assiduidade é baixa e o absentismo elevado, o que contribui, juntamente com outros factores, para uma produtividade do trabalho baixa e para a redução dos retornos dos proprietários do capital. Factores culturais, funcionamento muito deficiente dos serviços de educação, saúde e transportes, atitudes de aversão face ao trabalho, peso crescente do mercado informal de trabalho, onde inexistem horários, regras e normas, etc., podem ser algumas razões explicativas destes fenómenos. A nova Lei Geral do Trabalho, que aguarda aprovação do Conselho de Ministros, após o período de consulta e discussão pública, pode vir a proporcionar um importante contributo para a mudança de comportamento dos empregados e empregadores, facilitando a gestão dos recursos humanos e a aplicação de políticas laborais de pendor empresarial.

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