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Opinião

Será que Angola está mesmo a viver "um novo paradigma de crescimento"?

MILAGRE OU MIRAGEM?

Dizer que o crescimento em Angola já é "puxado pela economia não petrolífera" é prematuro! Angola precisava de fazer emergir outros sectores como a indústria transformadora e dinamizar o agrícola.

No passado dia 15 de Outubro, o Presidente João Lourenço apresentou a sua primeira mensagem sobre o Estado da Nação, nesta que é a 5ª Legislatura. Neste discurso, João Lourenço diz que Angola está a "viver realmente um novo paradigma de crescimento (...), com um crescimento puxado pela economia não petrolífera, onde o sector privado é o principal actor".

O Presidente indicou igualmente que a "aposta na diversificação da economia e na produção nacional começa a dar os seus frutos". Mas, será que isto está a acontecer? Um dos grandes problemas do poder político, em Angola e noutros contextos, tem a ver com a necessidade de obter e/ou apresentar resultados imediatos como forma de continuar a assegurar apoio político do eleitorado.

Num ano eleitoral como este, 2022, vimos o Executivo a adoptar uma série de medidas de curto prazo, o que não deixa de ser racional. Afinal, necessitando de assegurar votos para continuar a ser governo, pensar no médio e/ou longo prazo poderia ser nefasto. Pelo que programas, como o Plano Integrado de Intervenção nos Municípios, o Programa de Reconversão da Economia Informal e medidas como a isenção temporária dos direitos aduaneiros de alguns produtos da cesta básica e posterior redução do IVA, servem para ilustrar o quanto o Executivo estava preocupado com resultados imediatos, i.e., o curto prazo. Angola viveu um longo período de recessão económica, entre 2016 e 2020.

O Executivo angolano foi obrigado a solicitar, e conseguiu em Dezembro de 2017, junto do FMI um programa ampliado de financiamento. Na carta o Executivo indicou que os desequilíbrios macroeconómicos que o País experimentava na altura eram resultado da dependência que Angola tinha das receitas do petróleo. Com a queda do preço do petróleo, o País viu aumentar a dívida pública, taxa de inflação e tornou-se insustentável manter o regime cambial vigente.

Apesar das reformas levadas avante pelo Executivo, com apoio do FMI, a recessão manteve-se até 2020. Na altura, explicámos neste espaço que mais do que reforma estrutural (sinónimo de liberalização), Angola precisava (e continua a precisar) de uma transformação estrutural, i.e., transformar a estrutura da sua economia. Por outras palavras, Angola precisava de fazer emergir outros sectores como a indústria transformadora e dinamizar o sector agrícola. Duas acções que até à data o Executivo não foi capaz de materializar.

Os investimentos feitos no sector da energia e água, por ex. com a entrada em funcionamento da barragem de Laúca, do ciclo combinado do Soyo, fizeram aumentar a taxa de electrificação, que passou de 36% em 2017 para 43% no 1.º trimestre de 2022, segundo o Presidente João Lourenço. Contudo, a indústria transformadora em Angola, entre 2017 e 2020, teve um valor acrescentado médio de 5,9% (% do PIB), muito abaixo dos 10,7% que é a média para a África subsariana.

A queda da receita petrolífera forçou o Executivo a abandonar a política de um Kwanza forte adoptada desde 2001. Abrimos aqui um parênteses para explicar que apesar de os proponentes desta política acreditarem que um Kwanza forte iria facilitar a importação de bens de capital, máquinas e equipamentos, que estando ao serviço do sector produtivo nacional poderiam contribuir para a transformação da economia, tal não aconteceu. Pelo contrário, um Kwanza forte permitiu o aumento significativo da importação de bens de consumo corrente. Esta situação não sofreu alterações significativas depois de 2017.

A recente melhoria do quadro macroeconómico, i.e., melhoria das contas externas, redução da inflação, aumento das reservas internacionais (saindo de 8.770 mil milhões USD em 2020 para mais de 15.508 mil milhões USD em 2021), ou a criação da reserva alimentar, construção de hospitais de referência, foi possível graças ao aumento do preço do barril de petróleo (fruto do processo global de recuperação pós-Covid).

A governação precisa reconhecer este facto se desejar mudar esta situação de forma sustentável. Apesar de os dados da receita nos relatórios de fundamentação do OGE mostrarem um aumento das receitas não petrolíferas (1.194 mil milhões Kz em 2017 para 3.933 mil milhões Kz em 2021) mantém-se a disparidade vis-à- -vis as receitas petrolíferas (2.009 mil milhões Kz em 2017 para 6.043 mil milhões Kz em 2021).

O desempenho do sector não petrolífero, i.e., indústria transformadora e agricultura, depende muito das importações de bens de consumo intermédio e de capital (máquinas e equipamentos), ao passo que o sector do comércio depende muito das importações de bens de consumo corrente. Todas estas importações são sustentadas pelas receitas petrolíferas.

Uma melhor articulação sectorial, que permitisse o sector agrícola fornecer a indústria transformadora, e esta ao comércio local, permitiria reduzir gradualmente essa dependência. Pelo que, dizer que nesta altura o crescimento em Angola já é "puxado pela economia não petrolífera" é, em nosso entender, prematuro!

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