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Opinião

A cimeira de Washington. Qual será a agenda?

CONVIDADO

O economista Miguel Cardoso chama a atenção que será "mais uma chamada da vergonha onde os nossos líderes estarão expostos ao "ridículo" se a agenda não satisfizer os africanos".

Há um ponto que deve nortear esta cimeira, voltada para discussões sobre as compensações, indemnizações e reparações dos danos causados no pretérito, no comércio transatlântico de escravos que durou 400 anos, ou seja, quatro séculos.

A partir da Conferência de Berlim, conhecida como Conferência da África Ocidental ou Conferência do Congo, que decorreu entre 15 de Novembro de 1884 a 26 de Janeiro de 1885, demonstrando a apetência pela divisão territorial de África, com a participação de países europeus (Alemanha, Império Austro-Húngaro, Bélgica, Dinamarca, França, Espanha, Inglaterra, Itália, Países Baixos, Portugal, Rússia, Suécia, Noruega), Império Otomano e EUA, teve como objectivo claro as novas ocupações de territórios sobre a Costa Ocidental de África, a liberdade de comércio ao longo da Bacia do Zaire e o estabelecimento de regras uniformes internacionais relativamente às ocupações nas costas do continente africano.

Ainda assim, continuam a disputar o nosso continente como na divisão da Conferência de Berlim. É o que se assiste hoje, a julgar pelos desdobramentos diplomáticos que as grandes potências estão a fazer, como o périplo do secretário de Estado norte-americano Antony Blinken à África do Sul, República Democrática do Congo e Ruanda; Emanuel Macron, que insolentemente acusou os países africanos de hipócritas por não terem reconhecido a invasão Russa à Ucrânia, aquando da sua passagem pelos Camarões, Benim e Guiné Bissau; do ministro dos Negócios Estrangeiros russo que visitou o Egipto, República do Congo, Uganda e Etiópia, que nos últimos anos tem estreitado relações com vários países africanos, nos domínios da energia, alimentação e segurança, e o "aviso" que os EUA fazem aos países africanos, através da sua embaixadora nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield, durante as visitas de trabalho que realizou a três países africanos, nomeadamente Gana, Cabo Verde e Uganda, para não se envolverem com países sancionados pelos EUA, criando pressão sob Moçambique, por admitir a possibilidade de vir a comprar petróleo russo em rublos.

Todavia, o anúncio do Presidente Biden, a implantação de sistemas de produção de energia fotovoltaica em Angola, avaliado em dois mil milhões USD, que será financiado pelos EUA. Anúncio feito na Elmau, Alemanha. Não é justo que nos obriguem (Rússia, EUA, França, Inglaterra, China e outros) a que os vossos inimigos sejam também nossos inimigos, ou seja, inimigos de África, dos africanos.

Embora existam algumas intenções de reparar os danos causados, citando: o acordo da Alemanha para devolver peças de artefactos à Nigéria e ainda por parte da Alemanha em pagar à Namíbia cerca de 1,3 mil milhões USD em reparação ao genocídio cometido durante a era de ocupação colonial; do Banco Central Holandês (DNB) de financiar cerca de 10,40 milhões USD nos próximos 10 anos em projectos que venham a diminuir os efeitos negativos da escravatura, pelo facto de investidores privados terem financiado plantações nas colónias, mormente nas Caraíbas e na América do Sul (café, açúcar, algodão e tabaco), segundo o seu governador Klaas Knot, nada se compara com os danos causados naquele período e que repercutem negativamente até agora.

Citando o Presidente do Gana, Akufo-Addo, na Cúpula de Reparações e Cura Racial em Accra, Gana: "os nativos americanos receberam e continuam a receber indemnizações; famílias nipo-americanas, que foram encarceradas em campos na América durante a II Guerra Mundial, receberam indemnizações; os Judeus, seis milhões dos quais morreram nos campos de concentração da Alemanha hitleriana, receberam indemnizações, incluindo subsídios e apoio à pátria; todos os proprietários de africanos escravizados receberam indemnizações no valor de 20 milhões de libras esterlinas, mas os próprios africanos escravizados não receberam um centavo". Embora se deva reconhecer que nenhuma quantia monetária pode reparar os danos causados pelo comércio transatlântico de escravos e suas consequências, que se estenderam por muitos séculos.

Quanto à participação das elites africanas no tráfico, não isenta ou diminui a culpa dos principais envolvidos, sendo estes os instigadores, os que estimularam as elites locais a procederem daquele modo. A culpa é exclusivamente dos países envolvidos.

Portanto, exigir um pedido de desculpas das nações envolvidas no comércio de escravos (incluindo as nações que continuaram práticas idênticas), pelos crimes, e danos causados à imagem maculada até aos dias de hoje; o pagamento pelas nações e instituições que teriam beneficiado com o tráfico de escravos e colonialismo; o apoio dos governos africanos para o pagamento de indemnizações ou reparações a África para melhorar a situação das suas populações "marginalizadas", tendo em conta os princípios de igualdade racial, como básico à ordem moral e ética. Este deve ser o ponto principal da agenda: compensações, indemnizações e reparações pelos danos causados no comércio transatlântico. O tráfico de escravos