Novo currículo para a 5.ª e a 6ª classe traz o francês como língua estrangeira
Para a escolha do francês pesou o apoio técnico e financeiro da Embaixada de França. O inglês, largamente reconhecido como a língua das relações globais, vai ser introduzido apenas na 3.ª e 4.ª classes, provocando uma quebra no ciclo de aprendizagem e indefinição da língua curricular.
O Plano de Implementação do Novo Modelo Curricular e de Docência para a 5.ª e a 6.ª classes (III ciclo do ensino primário) traz o francês como língua estrangeira curricular obrigatória, em detrimento do inglês, amplamente considerado como língua franca nas áreas da tecnologia, do conhecimento e dos negócios, ainda que a UNESCO não tenha definido uma língua oficial única para as relações globais.
No ano experimental do novo currículo (ano lectivo 2024- -2025), o francês será implementado em todas as turmas do III ciclo do ensino primário das 144 escolas selecionadas, abrangendo todas as províncias do país. O número de escolas vai aumentar progressivamente até 2028, altura em que o plano será implementado integralmente nas 6.194 escolas que leccionam as classes em causa, conforme o Decreto Presidencial n.º 162/25, de 15 de Agosto, que aprova o novo currículo.
Já a língua inglesa vai ser introduzida apenas na 3.ª e 4.ª classes, sendo depois substituída pelo francês nas classes subsequentes (5.ª e 6.ª), provocando uma quebra e indefinição na escolha do idioma.
Sobre a escolha do francês como disciplina curricular obrigatória na 5.ª e 6.ª classes pesou o apoio técnico e financeiro da cooperação francesa, através do Serviço de Cooperação e Acção Cultural da Embaixada de França em Angola. A parceria possibilitou a elaboração de materiais curriculares, bem como a formação de professores e supervisores pedagógicos de língua francesa, conforme estabelece o documento.
Foi também determinante a adesão de "Angola à Organização Internacional da Francofonia (OIF)", além da partilha fronteiriça com dois países de língua francesa a norte, abrangendo parte da fronteira este do país. O que deixa de lado países anglófonos como a Namíbia ou a Zâmbia, que também partilham limites geográficos.
O documento sublinha ainda o facto de o país pertencer à 5.ª sub-região do continente (África Central), de expressão francófona, "pelo que grande parte da produção intelectual das diferentes áreas da competência da UNESCO é disponibilizada em língua francesa". Assim, aponta para a participação do País em organismos e conferências internacionais e regionais cuja língua de trabalho é o francês, tal como a Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC).
Para Lando Pedro, especialista em teoria e desenvolvimento curricular, que questiona a eficácia no ensino de línguas estrangeiras e do português nas escolas do país, é fundamental pensar-se primeiro na metodologia de como as línguas são ensinadas, antes de definir o francês como língua nuclear para este ciclo de ensino.
"O que nós temos de fazer é reforçar as competências básicas. Porque temos dificuldades enormes em ciências, sobretudo a matemática, que dá acesso às engenharias e aos cursos de tecnologias, que sempre tiveram muita relevância no desenvolvimento das sociedades. As línguas estrangeiras, sem entrar no mérito da escolha do francês, são complementares e não podem predeterminar o sucesso escolar do aluno."
Monodocência coadjuvada
A outra novidade deste novo plano curricular tem a ver com a configuração do modelo de docência. Neste ciclo de ensino primário passa a valer a monodocência coadjuvada, baseada num professor titular e dois auxiliares. A ideia é "diminuir a complexidade das tarefas dos professores do ensino primário", sendo que os professores auxiliares vão leccionar Língua Francesa ou Línguas de Angola.
Segundo Lando Pedro, a nova configuração encontra respaldo na lei de bases da educação, mas o especialista aponta várias reservas quanto à sua eficácia no sistema de ensino, que tem enormes carências, quer em quantidade, quer em qualidade de professores.
Apesar de a proposta valorizar a continuidade pedagógica e o acompanhamento integral do aluno, o especialista afirma que esta vai exigir reformas estruturais na formação docente e na gestão escolar. "O professor coadjuvante deve ser um especialista em línguas angolanas ou estrangeiras. Isso vai implicar na formação docente, o que vai levar a reconfigurar o próprio plano curricular da formação de professores, de modo a atender a essa necessidade, o que vai exigir especializações, quando estamos a preparar professores para trabalharem sozinhos", referiu.
Embora o novo modelo aponte para a diminuição da complexidade das tarefas dos professores do ensino primário, para Lando Pedro o modelo de docente vai aumentar a responsabilidade do professor titular, já que este vai acabar por assumir a função de coordenador em termos práticos.
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