Peso da exportação de crude para a China a cair desde a guerra na Ucrânia
A queda da importância da China nas exportações angolanas de petróleo acontece quando as sanções à Rússia encaminharam as refinarias asiáticas para os "saldos" que estão a financiar a guerra contra a Ucrânia. Falta de transparência nos acordos de financiamento continua a ser um problema.
Depois de seis anos sempre a crescer, o peso da exportação de petróleo angolano para a China tem vindo a cair desde 2022, já que as principais refinarias do gigante asiático estão a aproveitar os "saldos" russos numa altura em que é evidente um esfriar de relações com o país de Xi Jinping, na governação de João Lourenço. A retoma das relações económicas com os Estados Unidos contribui para esta alteração. Outro dos sinais do esfriar das relações com o gigante asiático tem a ver com o facto de a China ainda não ter nomeado um novo embaixador para Angola, três meses depois do término do mandato do anterior.
Além de maior parceiro comercial angolano, a China é também o principal credor do País, já que Angola devia-lhe no final do I semestre deste ano 19.084 milhões USD. A maior parte desta dívida assenta, no modelo oil- -backed, ou seja é garantida pela exportação de petróleo e esta dívida tem como credores o Banco de Exportação e Importação da China e o Banco de Desenvolvimento da China. E essa é uma das razões para a China ser o principal destino do petróleo angolano já que esta garantia fornece uma "almofada" de confiança.
À medida que a dívida à China foi aumentando, principalmente a partir de 2016, quando passa de 11.753 milhões USD para 21.679 milhões, também o peso da exportação de crude para aquele país aumentou significativamente. Em 2015, quase 45% das exportações de petróleo angolano iam para a China, em 2016 passou para 54% e em 2017 para quase 62% (ver gráficos), de acordo com cálculos do Expansão com base em dados do BNA. Note-se que a subida em quase 10 mil milhões USD entre 2015 e 2016 resulta de um mega financiamento, no âmbito de um acordo celebrado em Dezembro de 2015, levantado na sua totalidade e em que saíram os 10 mil milhões USD que o Governo injectou na altura na Sonangol.
Contas feitas, no final do I semestre cada angolano "devia" 1.474 USD ao estrangeiro, em que 560 USD eram só à China, equivalente a 38% dos empréstimos angolanos no estrangeiro. Só que o endividamento contraído junto da China é opaco já que nunca foram divulgados publicamente as condições desses empréstimos, muitos deles contraídos por via de linhas de crédito para financiar obras por via de bancos comerciais. Para os chineses é obrigatório que não sejam divulgadas as condições de financiamento - um alto cargo da embaixada chinesa em Angola admitiu há uns anos ao Expansão que a população daquele país não precisa e nem quer saber pormenores dos acordos, apenas pretende saber que o dinheiro das remessas da sua diáspora está a ser utilizado para beneficiar o país.
Este desconhecimento das condições em que o dinheiro da China chegou a Angola contribuiu para aumentar as vozes que defendem que este fluxo fundamentalmente serviu para enriquecer os governantes e o partido que o sustenta a maioria, tornando o Estado e a população mais pobre a médio e longo prazo.
Falta de transparência
São vários os exemplos da falta de transparência nas relações de financiamento com a China. E um desses exemplos foi a construção do Novo Aeroporto de Luanda, iniciado ainda na era de Eduardo dos Santos pelo "dono da obra" a ser a China International Fund (CIF), empresa ligada aos interesses dos generais Kopelipa, "Dino" e Manuel Vicente. Esta empresa foi o canal utilizado para a reconstrução nacional após a guerra civil ter terminado, com os contratos milionários com o Governo, em 2004, a serem considerados "confidenciais" à luz da Lei de Segredo de Estado.
Até à era João Lourenço terão sido gastos pelo menos 4.600 milhões USD no novo aeroporto, só que a execução das obras ficou muito aquém do valor despendido no âmbito de uma linha de financiamento chinesa. Entretanto, a Procuradoria-Geral da República chegou a apreender 286,4 milhões USD na posse desta empresa enquanto responsável pela construção do novo aeroporto, em 2019, altura em que o Executivo de João Lourenço acabou por mudar o empreiteiro desta obra para outra empresa chinesa, que efectivamente concluiu o projecto que esteve parado largos anos. Mas a relação do CIF com Angola não ficou restrita ao novo aeroporto, já que teve também uma posição importante na construção das centralidades, cujas contas finais, na maioria dos casos, não se conhece.
Leia o artigo integral na edição 753 do Expansão, de sexta-feira, dia 01 de Dezembro de 2023, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)