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"As artes são a bandeira da existência humana"

Isilda Alves Coelho

Muatas é tema de uma exposição que encerrou há poucos dias e que conta a história de mulheres que contribuíram para o País que existe hoje. Angolanas e estrangeiras, sem cor partidária, sem olhar para a idade. Um projecto de Isilda Alves Coelho que demorou três anos a concretizar, como conta nesta entrevista ao Expansão.

Como surgiu a ideia da exposição "Muatas- A liderança do matriarcado", que terminou há dias na Casa das Artes?

Nos museus no estrangeiro há inúmeras imagens de pessoas que foram importantes no seu tempo. Nas exposições em Angola, encontramos sempre artefactos, cadeiras, máscaras, barretes, símbolos da agricultura ou da caça, ou seja, encontramos todo tipo de material ligados às pessoas, mas os que fazem não aparecem. E questionava-me: porque que não há retratos das nossas pessoas, das pessoas que fizeram as coisas que ficam na História?

Mostrar os rostos de quem fez História?

Sim! Há três anos conheci um pintor, o Modesto Mamba, no bairro Palanca, que já fazia retratos e perguntei-lhe se ele podia fazer uma colecção para mim, porque eu queria iniciar um processo. Então comecei a seleccionar as figuras femininas que são líderes mediáticas e fui compondo as suas biografias, para dizer o que tinham feito, as funções que tinham exercido, inovações tinham realizado para tornar a nossa terra melhor. O Modesto foi fazendo as pinturas em óleo sobre tela com a imagem da figura e por detrás alguma paisagem.

Foi o início desta exposição?

Ao fim de 20 retratos, que são caros, já não tinha dinheiro para continuar, aliás estava desempregada e não tinha mais como pagar ao pintor. Entretanto, ainda me faltavam retratos de mais 70 mulheres por fazer, mas faltava dinheiro. Entretanto, devido à Covid-19, mandei regressar ao País os meus filhos que estudavam fora e, com eles em casa, pedi ao Ricardo que editasse algumas imagens. Ele, como estuda Ciências da Computação, aceitou e começou a fazer edições gráficas com os mesmo elementos que eu defini. Depois peguei em símbolos africanos e entreguei à Mara Hurst, minha filha, e ao Evan Claver, para "bordar" nas figuras editadas e transformadas, e foi este o resultado final, o trabalho exposto.

São quantas mulheres no total?

São 90 mulheres nesta exposição Muatas. Mas tenho mais 20, aliás, uma que vai entrar na próxima é a Mulemba xa Ngola, mas não vou contar mais nomes, porque assim perde o "efeito surpresa" da próxima mostra.

Uma exposição que continua em aberto...

Claro! Faltam muitas figuras históricas e personalidades, este trabalho ainda vai crescer muito. O objectivo deste projecto não é artístico, mas sim histórico. A arte deve servir como veículo de ideias. E a ideia subjacente a esta exposição é apresentar a nossa identidade, o que fizemos pela nossa terra, aquilo que estas mulheres específicas fizeram para Angola.

Que nomes sonantes estão entre as Muatas?

Todos os nomes são sonantes, mas cito apenas alguns: Maria Eugénia Neto, Ana Paula dos Santos, Ana Dias Lourenço, Vera Daves, Miraldina Jamba, Rainha Njinga, Mwana Po, Princesa Diana, Tamar Golan, Joana Lina, Lueji N"Konde, Andanga , Dona Ana Joaquina, Rainha Nhakatolo, Albina Assis, Ângela Mingas, Arlete Leona Chibinda, Kimpa Vita, Alda Juliana Sachiambo, Alexandra Simeão, Emilia Carlota Dias, Elizabeth Rank Frank, Filomena Oliveira, Francisca Van-Dúnem, e muitas outras mulheres que contribuíram para o País que temos hoje.

Foi fácil compor as biografias que acompanham cada quadro?

Não foi muito fácil. Fomos procurando informações destas senhoras, algumas encontrei na internet, outras em livros que tenho em casa, e algumas ainda de histórias que me contaram. Fizemos quase de modo doméstico, mas com o princípio de que estávamos a fazer algo de bom para engrandecermos o nosso imaginário pictórico e de composição.

Está satisfeita com o resultado de um trabalho que iniciou há três anos?

Estou muito satisfeita com o catálogo da exposição, muito satisfeita com o resultado do trabalho de todos os que abraçaram o projecto, e até com a montagem feita aqui na Casa das Artes. Tenho visto várias exposições em Luanda, mas esta está muito bonita, também. Aliás, foi a Maria João Ganga que idealizou a montagem da exposição. É um espaço amplo e não deixa nada a desejar a exposições que se fazem em outras partes do mundo.

Dividiu a exposição em primeira e segunda parte. Podemos então aguardar pela terceira?

Estou a pensar que ficaram muitas mulheres líderes de fora. Não tive como colocar todas as mulheres que deveriam estar e merecem fazer parte desta galeria de "Muatas" angolanas. Mas continuei a compor e já estão editadas, já devo ter mais 20 mulheres líderes prontas para entrar, tanto na colecção como no catálogo. Temos, não só mulheres que participaram de forma mediática na construção do que é Angola hoje, que é um País de que todos nos orgulhamos, como temos mulheres que contribuíram de forma anónima. As nossas Muatas também devem ser acarinhadas.

(Leia o artigo integral na edição 620 do Expansão, de sexta-feira, dia 16 de Abril de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)