MinFin endivida-se para pagar dívida à Gemcorp
O Ministério das Finanças vai avançar com uma emissão especial de Obrigações de Tesouro em moeda externa até 522,8 milhões USD para poder liquidar um financiamento de 500 milhões USD ao fundo sedeado em Londres Gemcorp, contraído pelo Banco Nacional de Angola (BNA) e repassada ao ministério então liderado por Archer Mangueira, em 2017.
Vera Daves foi autorizada pelo Decreto Presidencial n.º 102/21 de 23 de Abril a recorrer à emissão especial de obrigações em moeda estrangeira, que será "entregue directamente ao Banco Nacional de Angola, a título de pagamento do Acordo REPO III e repassado ao Ministério das Finanças, no âmbito do acordo firmado entre as duas instituições". As condições gerais das obrigações - moeda de emissão, valor nominal, taxa de juro e prazo de reembolso - serão definidas posteriormente por decreto executivo da ministra.
O Acordo REPO III surgiu em 2017, quando o banco central liderado por Valter Filipe aceitou contrair um empréstimo de 500 milhões USD da Gemcorp para o repassar ao Ministério das Finanças. Ou seja, o BNA serviu como veículo para dar as garantias, no caso títulos de dívida norte-americana, segundo apurou o Expansão, uma operação ilegal já que a lei do BNA impede o financiamento indirecto ao Estado. É por isso que tem sido alvo de reservas dos auditores independentes às contas do banco central desde essa altura.
Quando foi assinado, segundo o relatório e contas 2017 do BNA, previa "uma taxa de juro anual de 2,6%" e um reembolso faseado em três tranches. Entretanto, ainda nesse ano "o BNA renegociou as condições de pagamento com a GemCorp, alterando deste modo a taxa de juro anual para 3% e o prazo de reembolso para Maio de 2021. De acordo com os relatórios e contas do BNA, entre 2017 e 2019, além deste financiamento de repasse no valor de 500 milhões USD, o banco central fez mais três acordos com a Gemcorp no valor total de 2.500 milhões USD (500+500+500+1.000 milhões). Até ao momento, já pagou dois (500+500 milhões), o MinFin está a emitir dívida pública para pagar os 500 milhões que lhe foram repassados, e o BNA tem que reembolsar em 1.000 milhões USD o fundo ligado à Rússia e sedeado no Reino Unido até 1 de Dezembro de 2022, pagando 3,25% de juros trimestralmente até ao fim da maturidade.
Mas os negócios do Estado com a Gemcorp nem sempre são transparentes. Além de maior credor do BNA, a Gemcorp é ao mesmo tempo o maior gestor de activos externos do banco central, o que levanta dúvidas sobre eventuais conflitos de interesse. Segundo avançou o Expansão a 12 de Junho de 2020, o BNA não sabia onde estavam investidos 355 milhões USD geridos pelo fundo sedeado em Londres, desconhecendo se estava a violar a própria lei, já que a Gemcorp se tem recusado a revelar os detalhes das aplicações num fundo de capital de risco subscrito pelo banco central.
(Leia o artigo integral na edição 622 do Expansão, de sexta-feira, dia 30 de Abril de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)