Como está a Inteligência Artificial a salvar o sistema financeiro?
Num contexto em que os reguladores internacionais e regionais, incluindo o Banco Nacional de Angola (BNA), exigem maior rigor na gestão e protecção da informação, a Inteligência Artificial tem vindo a afirmar-se como ferramenta importante na avaliação e melhoria da qualidade de dados no sistema financeiro.
Vivemos numa era em que a informação tornou-se o recurso mais valioso das instituições, particularmente para as financeiras. As decisões sobre crédito, investimento, compliance e segurança operacional dependem, cada vez mais, da qualidade dos dados armazenados e tratados pelos sistemas bancários, seguradoras e fintechs. Contudo, a realidade mostra que a qualidade apresentada por esses dados nem sempre acompanha a sua importância estratégica. Dados incompletos, desactualizados, inconsistentes ou mal classificados podem comprometer decisões financeiras, gerar relatórios incorrectos, distorcer modelos de risco e, em situações mais graves, abrir portas para fraudes e sanções por incumprimento regulatório.
De acordo com o KPMG Global AI in Finance Report (2024), 71% das instituições financeiras já recorrem à Inteligência Artificial (IA) nas suas operações, sendo que 41% aplicam-na para melhoria da integridade de dados e prevenção de riscos operacionais.
Num contexto em que os reguladores internacionais e regionais, incluindo o Banco Nacional de Angola (BNA), exigem maior rigor na gestão e protecção da informação, a Inteligência Artificial tem vindo a afirmar-se como ferramenta importante na avaliação e melhoria da qualidade de dados no sistema financeiro. Este cenário ganha ainda mais importância tendo em conta o processo em curso de equivalência regulatória do BNA face ao sistema europeu, que visa harmonizar os princípios de supervisão, compliance e governação de dados com os padrões internacionais. Mais do que uma tendência tecnológica, a aplicação da IA neste domínio resolve problemas antigos e contribui para modernizar as instituições, tornando-as mais eficientes, seguras e competitivas.
Através de algoritmos capazes de aprender padrões e identificar desvios, a IA consegue detectar, em tempo real, anomalias em operações, validar dados de clientes, corrigir automaticamente informações incoerentes e sugerir valores plausíveis para campos omissos. Por outro lado, permite enriquecer perfis de clientes com dados de fontes externas seguras, reforçando a análise de risco e a personalização de serviços.
Segundo o estudo Finance as a Service powered by AI (KPMG, 2024), organizações que implementaram soluções de IA para gestão de dados registaram melhorias de 50% na produtividade das suas equipas financeiras e ciclos de planeamento até cinco vezes mais rápidos, além de ganhos relevantes na redução de erros e automatização de tarefas repetitivas.
Entre as aplicações mais comuns destacam-se a detecção de duplicação de registos, a verificação de integridade entre bases de dados e a classificação automática de transacções financeiras. Soluções de IA também conseguem identificar transacções que fogem aos padrões habituais de determinado cliente ou segmento, contribuindo para a prevenção de fraudes e lavagem de dinheiro.
A nível internacional, países como Singapura, Reino Unido e Canadá já integram sistemas inteligentes de gestão de qualidade de dados nos seus bancos centrais e principais instituições financeiras. Esses sistemas analisam milhões de transacções diariamente, detectando erros, omissões e inconsistências evitando impactos relevantes causados por problemas de dados. Os resultados são evidentes: redução de custos operacionais, melhoria na qualidade da informação para tomada de decisão e maior credibilidade institucional junto dos reguladores e clientes. De acordo com o KPMG Global Tech Report: Financial Services Insights (2025), 92% das empresas de serviços financeiros reportaram retorno positivo nos seus investimentos em IA para gestão de dados, com aumento da capacidade analítica e maior resiliência a riscos de compliance.
No sector financeiro angolano, este debate é recente, mas tornou-se inevitável. A digitalização dos serviços bancários e de pagamentos, o crescimento do Mobile Banking e a integração de novos sistemas exigem uma infra-estrutura de dados sólida e fiável. Ignorar esta necessidade expõe as instituições a riscos operacionais e reputacionais, compromete a confiança dos clientes e limita a capacidade de competir num mercado cada vez mais globalizado.
Os benefícios da adopção da Inteligência Artificial na gestão da qualidade de dados vão além da segurança. Permitem aumentar a eficiência dos processos internos, libertar equipas de tarefas repetitivas, melhorar a experiência do cliente e criar condições para desenvolver produtos financeiros mais ajustados às necessidades do mercado.
As instituições financeiras angolanas devem, por isso, acelerar a integração destas tecnologias nos seus sistemas de gestão de dados. A médio e longo prazo, essa aposta traduz-se em maior sustentabilidade, segurança e capacidade de adaptação a um ambiente financeiro em constante transformação.
Leia o artigo integral na edição 830 do Expansão, de Sexta-feira, dia 13 de Junho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)
*João Nzango, Manager de Data & Analytics da KPMG Angola