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África do Sul fora do AGOA se EUA reverem relação bilateral

PROJECTO-LEI NA CÂMARA DOS REPRESENTANTES EXIGE "REVISÃO COMPLETA" DAS RELAÇÕES

Caso seja aprovado, o mais tardar 120 dias após a data de promulgação da Lei, o Presidente dos EUA "deverá submeter" um relatório a rever a relação com África do Sul, que poderá resultar na exclusão do país do AGOA, à semelhança do que aconteceu com sete países africanos, nos últimos dois anos.

Dois congressistas americanos apresentaram um projecto-lei a "exigir a revisão completa das relações bilaterais EUA-África do Sul", dado o "recente posicionamento" e os laços que a África do Sul tem vindo a construir com "países e actores que minam a segurança nacional da América". Isso mesmo afirmou o congressista republicano John James, autor da iniciativa legislativa, que conta com o apoio do democrata Jared Moskowitz, numa declaração à imprensa, um dia depois da entrada do diploma na Câmara dos Representantes, a 6 de Fevereiro.

"Sob esta administração actual, a América foi colocada em último lugar, deixando os nossos aliados e parceiros em dívida com ditadores e déspotas em Pequim e Moscovo", afirmou o congressista republicano, que acusa a África do Sul de ter um histórico de se aliar a actores malignos, de cooperar militar e politicamente com "a China e a Rússia" e de apoiar o Hamas, "organização designada terrorista pelos EUA".

Dez dias depois de o projecto-lei entrar na Câmara dos Representantes, o porta-voz do Departamento de Relações Internacionais e Cooperação sul-africano, Clayson Monyela, desvalorizou a iniciativa dos parlamentares americanos. "Achamos que esse projeto-lei não vai a lado nenhum. O governo dos EUA valoriza as relações mutuamente benéficas com a África do Sul e não partilha a opinião dos redatores da proposta", declarou Monyela.

Mais cautelosa, a ministra das Relações Internacionais e Cooperação mostrou preocupação com a iniciativa dos dois parlamentares. Naledi Pandor sublinhou que os EUA são um parceiro comercial significativo para a África do Sul, como mostram as trocas comerciais, que duplicaram na última década (ver infografia). E encorajou "uma perspectiva mais informada e equilibrada" por parte dos autores da proposta de lei, sublinhando que a África do Sul "condena o assassinato de civis", assim como a "tomada de reféns".

"Após a decisão do TIJ [Tribunal Internacional de Justiça] sobre o nosso pedido, o argumento de que o nosso caso era injusto ou tinha motivação política já não pode ser sustentado. Nem a tentativa de encobrir a gravidade da devastação e da perda de vidas humanas em Gaza", comentou, por seu turno, o porta- -voz da presidência. Vincent Magwenya considera que as questões levantadas pelos membros do congresso foram devidamente tratadas e esclarecidas pelas autoridades judiciais e governamentais sul-africanas.

O projecto-lei tem de ser adoptado pelo Comité de Relações Exteriores, sendo depois enviado ao presidente da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, que o submeterá a votação. Em seguida, terá de ser aprovado no Senado e, eventualmente, ser ratificado pelo Presidente dos EUA, Joe Biden.

Erros factuais

O projecto-lei liderado pelo congressista republicano John James argumenta, no ponto 3, que o apoio do "governo sul-africano ao Hamas remonta a 1994, quando o ANC chegou ao poder pela primeira vez, assumindo uma posição linha-dura de acusar consistentemente Israel de apartheid".

Esta argumentação contraria os factos, já que o governo sul-africano tem laços com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), que remontam ao mandato do ex-Presidente Nelson Mandela, e não ao Hamas, como recorda o jornal sul-africano Mail & Guardian. A OLP era o principal representante dos palestinos antes da criação da Autoridade Nacional Palestina (ANP), que governa a Cisjordânia, e o Hamas é o braço palestino da Irmandade Muçulmana do Egipto, que controla a Faixa de Gaza, desde 2006.

As tensões entre EUA e África do Sul aumentaram em 2022, após o governo do Presidente Cyril Ramaphosa recusar juntar-se ao Ocidente na condenação à Rússia pela guerra na Ucrânia e agravou-se, em Dezembro de 2023, depois de a África do Sul apresentar uma acção no TIJ, a acusar Israel de cometer genocídio na Faixa de Gaza.

Além da má escolha dos aliados, "em contraste com a sua posição declarada de não-alinhamento", os dois congressistas acusam o governo sul-africano liderado pelo ANC de ter um "historial de má gestão", revelando-se "incapaz de prestar serviços públicos de forma eficaz, ameaçando o povo e a economia sul-africana".

Caso seja aprovado, o mais tardar 120 dias após a data de promulgação da Lei, o Presidente dos EUA deverá submeter "um relatório que inclua as conclusões da revisão exigida", que poderá resultar na exclusão da África do Sul do AGOA, à semelhança do que aconteceu com sete países africanos.

Depois da Etiópia, Mali e Guiné, expulsos em 2021, os EUA anunciaram em 2023 a expulsão do Gabão, Níger, República Centro Africana e Uganda, a partir de 1 de Janeiro de 2024, por não cumprimento dos requisitos de elegibilidade ao mecanismo criado em 2000 pelos EUA, para permitir o acesso preferencial ao seu mercado. Ao contrário do que foi pedido por congressistas americanos, após o embaixador dos EUA acusar Pretória de fornecer armas à Rússia na guerra na Ucrânia, a África do Sul não constou na lista de expulsões, divulgada no início de Novembro, na véspera do Fórum de Comércio e Cooperação Económica de África, em Joanesburgo.

Leia o artigo integral na edição 764 do Expansão, de sexta-feira, dia 23 de Fevereiro de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)