Saltar para conteúdo da página

EXPANSÃO - Página Inicial

Logo WeekendLifestyle

"Nós ainda não chegamos aos pés da Nigéria"

RENATA TORRES

A realizadora de "Prato Rosa" defende que apesar de estarmos sempre a olhar para Hollywood, ainda estamos muito longe da realidade do cinema na Nigéria, mas podemos aprender como o caminho que eles percorreram até chegarem ao dinamismo de hoje.

Estreou-se recentemente como realizadora com o filme Parto Rosa. Que mensagem pretende trazer ao público?

Que mulheres em Angola também são realizadoras. Com o filme, especificamente, eu trago muito a questão da violência psicológica e até considero uma forma de identificar essa violência, porque normalmente as pessoas quando falam de violência doméstica, violência de género, pensam muito em violência física. É difícil de denunciar, muito difícil de falar sobre, porque às vezes tu não consegues explicar o que é.

E como é que conjuga esses temas numa história?

Então eu trago um casal que está apaixonado, mas que vai circulando por esses lugares do amor. Mas depois, vão tendo umas questões muito mal resolvidas. Falo também do papel da família, dos amigos na hora de ajudar, principalmente as mulheres a saírem dessa situação. O papel preponderante que eles têm quando se trata, por exemplo, de um casamento.

Basicamente é um espelho da nossa sociedade. Retracta algum caso que conheça?

Não, não é pessoal, nem é baseado numa história de alguém específico. Eu não estou feliz com o que é hoje a nossa realidade social. Eu não me sinto satisfeita, não me sinto integrada. Então, o que é que eu posso fazer em relação a isso? Trabalhar com a minha arte, questionar, apresentar possibilidades.

Neste mês das mulheres, essa mensagem vem a propósito.

Olha, não é pelo mês de Março, mas pela sociedade em si. Na minha perspectiva enquadrava-se muito mais em Fevereiro, que é o mês dos namorados. No fim do dia é sobre uma mulher que percebeu ainda cedo, de certa forma, que não precisava de se submeter àquilo, que não precisava de aceitar tudo sem questionar, que ela também tem valor por si só, não por depender de alguém. Ela é a sua própria validação.

E que tal a experiência de ser realizadora no nosso mercado?

Está a ser uma descoberta. Eu acho que ainda existe uma pressão muito grande para qualquer mulher que se queira colocar numa posição onde as pessoas estão acostumadas a ver só homens. E eu sempre que digo isto: se nós assumimos que a nossa sociedade tem muito mais mulheres do que homens, por que é que os homens fazem uso dessa estatística para justificarem terem mais de uma parceira indiscriminadamente, certo? Esse argumento só serve para dizer que tu podes ter quantas parceiras tu quiseres, mas já não serve para questionar porque é que não tens mais mulheres em todos os sectores? Existe aí um problema.

Pode dizer quanto é que investiu na realização desse filme?

Não. Por um motivo muito simples, foi uma produção colaborativa entre os actores, a produção. Eu recebi apoios, imagina, para gastos curtos. Na verdade é como funciona. Os actores não foram pagos, não receberam cachês como tal. A produção também não, todo mundo acreditou no sonho, abraçou a ideia, porque como o filme é a adaptação de uma peça, a maior parte deles já tinha assistido à peça. Estava muito curiosa para entender como é que uma peça, que é um monólogo, se transformaria num filme com vários outros personagens.

Mas quanto é que um filme dessa natureza, que é low budget, de baixo orçamento, quanto é que custaria aqui em Angola?

Cerca de 9 milhões e qualquer coisa. Mas porque é mesmo uma produção de baixíssimo orçamento, com pouquíssimas locações, pouquíssimos actores. Eu filmei em quatro dias, o que é uma loucura se formos pensar em cinema.

Colocar um filme no nosso mercado é rentável?

Não. Ainda. Mas um filme, e já que estamos num jornal económico, produzir um filme é garantir uma renda passiva. Como nós ainda não temos uma indústria como tal, nós não conseguimos imaginar o retorno. Mas para além dos cinemas convencionais, que são pouquíssimos os que existem, temos os espaços alternativos.

Que análise é que faz do mercado cinematográfico nacional?

Olha, eu acho que nós estamos a caminhar bem. Estou um pouco apreensiva porque nós já tivemos esse boom há uns anos. Eu ainda não estava no mercado, era estudante ainda, mas já conhecia, porque o mercado fervilhava com produções cinematográficas de ficção, com o filme da Rainha Ginga, as novelas que se estavam a produzir cá e outros filmes mais independentes. Havia assim uma força que morreu por algum motivo. Algum motivo não! Todos nós sabemos o que aconteceu. Mas é um assunto que ninguém fala, né? É tabu. Nós temos projectos interessantíssimos de cinema. E quando falo projectos interessantes de cinema, não me refiro às produções cinematográficas. Eu estou a falar de espaços para exibição, que o nosso problema maior é a distribuição.

África tem países com mercados cinematográficos interessantes...

Nós precisamos ainda de estar na fase da quantidade e olhar para mercados que são muito mais parecidos com os nossos. Parecidos no sentido de mentalidade, geograficamente, mercados como a Nigéria, como o Congo, Quénia, África. Mas nós não! Estamos em Angola, queremos olhar para os Estados Unidos, Hollywood. Não pode, não serve. Eles têm anos. Nós não chegamos aos pés da Nigéria, mas o começo da Nigéria, a forma como o mercado se dinamizou, eu acho que poderia ser um exemplo para nós.

A Renata actua em diversas áreas artísticas, qual delas nasceu primeiro?

As artes plásticas. Na verdade, é confuso, eu não sei se foram as artes plásticas ou se foi a escrita. . Eu escrevia o que eu ia desenhar. Mas eu nunca levei a escrita a sério até começar a fazer teatro, e depois cinema, Fui fazer um curso de guionismo, mesmo direccionado para cinema e tal, dramaturgia para teatro.

Leia o artigo integral na edição 816 do Expansão, de sexta-feira, dia 07 de Março de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

Logo Jornal EXPANSÃO Newsletter gratuita
Edição da Semana

Receba diariamente por email as principais notícias de Angola e do Mundo