Cooperação terá sido a "mão invísivel" que afastou Manuel Vicente da lista de arguidos
Há uma "mão invisivel" que tem protegido o antigo homem forte da Sonangol e ex-vice-presidente de Angola. A acusação do Ministério Público é clara: foi sob "orientação" de Vicente que a imobiliária da Sonangol fez acordos alegadamente lesivos com o CIF, mediados por empresa na qual é sócio de Kopelipa e Dino.
O julgamento dos generais Hélder Viera Dias Júnior "Kopelipa" e Leopoldino Fragoso do Nascimento "Dino" está na fase de produção de provas, com o nome do antigo vice-Presidente da República e ex-PCA da Sonangol, Manuel Vicente, a ser cada vez mais apontado pelos arguidos como parte responsável pelos crimes que a acusação diz terem lesado o Estado em vários milhões de dólares.
Apesar de o Ministério Público (MP) dizer na acusação que o antigo homem forte da Sonangol também é responsável por lesar os cofres do Estado, não o acusou de qualquer crime, o que suscita várias dúvidas junto de especialistas em Direito sobre a existência de um manto "invisível", diga-se político, que o tem segurado nestes anos de governação de João Lourenço.
Apesar de não ser arguido, Vicente é citado 30 vezes na acusação que leva à barra dos tribunais duas das principais figuras da era de José Eduardo dos Santos, acusados de crimes que vão desde associação criminosa, tráfico de influências, branqueamento de capitais, peculato ou falsificação de documentos, burla por defraudação, crimes que, no papel (código penal) podem levar os generais Kopelipa e Dino a vários anos de cadeia, caso se comprove que praticaram os crimes.
Juntam-se ao processo como arguidos o advogado Fernando Gomes dos Santos, o cidadão chinês Yu Haiming e três empresas: China International Found (CIF) Angola, a Plasmart International Limited e a Uter Right International Limited. Os arguidos estão acusados de terem montado um esquema sob pretexto da reconstrução nacional, que terá servido para desviar dezenas de milhões de dólares do Estado, com conivência institucional. Especialistas admitem que o que está aqui em causa também são as próprias relações que Angola construiu com a China naquele período, que resultou numa dívida astronómica àquele país asiático "amarrada" com as garantidas sobre a venda de petróleo.
Assim, a acusação faz referência a Manuel Vicente praticamente desde o início, com o acordo de financiamento com China, que garantiu várias linhas de crédito do Eximbank, CCBB, Banco de Desenvolvimento da China (actualmente o maior credor do País), e com a Agência Asseguradora de Crédito à Exportação da China, passando pelo assinatura do contrato entre a Sonangol EP e uma das várias empresas criadas pelos empresários chineses para se relacionarem com Angola, no caso a China Sonangol International Holding Limited, para a venda de carregamentos de petróleo que iriam permitir a constituição de fundos para a reconstrução nacional. O que, segundo o Ministério Público, nunca aconteceu, porque o dinheiro da venda deste petróleo, no valor de quase 1,6 mil milhões USD, nunca entrou nas contas da Sonangol.
O dinheiro ficava na conta da empresa China Sonangol International Holding Limited, que segundo o MP, tinha Manuel Vicente como presidente do conselho de administração. Ou seja, o antigo PCA da Sonangol também presidia a administração da empresa que recebia o petróleo da Sonangol, mas não pagava à petrolífera angolana e ficava com as receitas das vendas, que de acordo com o MP beneficivam apenas a empresa chinesa que Manuel Vicente também presidia. As "impressões digitais" de Vicente neste processo estendem-se até às centralidades ao ter autorizado, enquanto PCA da petrolífera angolana, que a Sonangol Imobiliária e Propriedades (SONIP), comprasse 24 prédios no Zango Zero, a China International Fund, Hong Kong (CIF Hong Kong) que já tinham sido pagos pelo Estado angolano.
Estes edifícios, segundo o Ministério Público, eram pertença do Estado angolano que os pagou, e os arguidos, mais Manuel Vicente, subtraíram indevidamente e passaram para a China International Fund, Hong Kong, com a argumentação de que tinham sido feitos com investimento da CIF Hong Kong.
O Ministério Público também garante que Vicente e os arguidos eram os reais donos da Delta Imobiliária que, mais tarde, recebeu da Sonangol, ainda na era de Manuel Vicente, a responsabilidade de comercializar as principais centralidades, sobretudo em Luanda. O MP diz que o "trio" dividiu o Zango 0 em dois, privatizando parte significativa em benefício próprio. E mais uma vez a Delta Imobiliária ficou com a responsabilidade de vender também estes imóveis que incluíam outras infraestrututras, para além de prédios. Há ainda a questão dos edifícios CIF Luanda I e II que terão sido pagos com dinheiros da venda do petróleo que nunca entrou nas contas da Sonangol, da venda de imóveis do Estado, assim como do aluguer de espaços a instituições do Estado.
Leia o artigo integral na edição 830 do Expansão, de Sexta-feira, dia 13 de Junho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)