Saltar para conteúdo da página

Logo Jornal EXPANSÃO

EXPANSÃO - Página Inicial

Opinião

Sempre vamos crescer em 2021?

Convidado

Depois de cinco anos a destruir riqueza, tudo indica que a economia angolana vai voltar a criar riqueza líquida em 2021. Existe uma unanimidade sobre essa probabilidade, entre as principais instituições que fazem estudos sobre a evolução da economia de Angola. À excepção do "The Economist" que prevê uma contracção de 0,6%.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM), por exemplo, apontam para uma recuperação de 0,4% e 0,9%, respectivamente. A Fitch vem logo a seguir e aponta para uma recuperação de 1,7%. O Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) é mais optimista e diz que a recuperação será de 3,1%. O Governo, na voz do Ministro do Estado, posicionou-se dizendo que sempre poderemos crescer até 1% em 2021, ao contrário da estagnação prevista no Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2021. Mas claro, existem riscos, onde a propagação da Covid-19 e uma queda na produção de petróleo acima dos níveis previstos, apresentam-se como os mais relevantes.

As projecções foram baseadas, na generalidade dos casos, na evolução positiva sobre o preço do petróleo. O que é negativo! Pois, passa ao País e ao Executivo, em particular, um certificado de incompetência. Na medida em que o País ainda não conseguiu criar bases para que o crescimento da economia seja baseado em pressupostos mais endógenos ou, no mínimo, que consiga ter instrumentos capazes de absorver os choques externos negativos - a flexibilização da taxa de câmbio serviu de esteio em 2020, mas com um nível de transmissão para os mercados de bens e trabalho muito significativos - sem grandes impactos sobre os níveis de produção e empregabilidade no País.

Com efeito, a única nota positiva nestas perspectivas de crescimento é a possibilidade do País não ter de destruir riqueza em 2021. Pela dimensão da potencial recuperação da economia para 2021, não se podem dar salvas de palmas, pois é um crescimento meramente estatístico e com pouca ou residual significância económica -a excepção é certamente a efectivação do optimismo do BAD. E a situação é tão real, que falar em recuperação da economia que não seja alavancada por uma maior produção de bens alimentares que sustente, no mínimo, a cesta básica nacional é o mesmo que nada. Não se está a falar de taxas de crescimento da economia que sustenta vaidades. Mas sim, necessidades mais elementares que assegurem, no mínimo, a dignidade dos mais de 18 milhões de angolanos que poderão viver com menos de 1 USD por dia em 2021.

E isso fica claro quando se verificam, do lado da procura, que o principal determinante do crescimento continua a ser o consumo das famílias que é, claramente, inquinado para uma certa "burguesia" que não tem visto os seus rendimentos beliscados e nem sua riqueza líquida posta em causa por uma crise que elevou para mais de 80% da força de trabalho na economia informal e assegurou que mais de 30% de pessoas com vontade de trabalhar permanecem desempregados em 2020.

Nestes termos, não me parece que os perto de mais de 42 mil milhões USD que deverão ser consumidos em 2021, de acordo com o "The Economist", reflictam a penúria pelo que passa os mais de 56% da população que entretanto vive com menos de 1,9 USD/dia, segundo dados do BM. Logo, é um consumo/crescimento muito concentrado, desigual e socialmente desnecessário, indutor de estrangulamentos na economia e na estrutura produtiva, porque relevante parte dos mesmos é suportado pela oferta de produtos externos que mais do que satisfazer as necessidades individuais induzem a externalidades negativas brutais sobre o tecido social que a todos, que estejam comprometidos com uma economia mais inclusiva, sustentada e sustentável, deveria preocupar.

*Economista

(Leia o artigo integral na edição 624 do Expansão, de sexta-feira, dia 14 de Maio de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)