No vale do rio Bero nasceu um vinho genuinamente angolano
Promotores consideram que o produto é de qualidade média ou média-alta e cada garrafa vai custar cerca de 7.000 Kz. A exportação está, por enquanto, fora de causa mas os investidores pretendem dobrar a produção nos próximos anos. Negócio familiar também está de olho nas uvas de mesa.
Depois de várias tentativas com pouco sucesso e de uma longa história de importações portuguesas, apareceu finalmente uma marca angolana de vinhos totalmente produzidos no País. É no vale do rio Bero, junto à cidade de Moçâmedes, que o médico e empresário Paulo Murias dá asas a um sonho que parecia difícil de realizar.
Tudo começou como um passatempo associado à vontade de passar mais tempo em família longe da cidade de Luanda e próximo da beleza única que adorna a província do Namibe, uma autêntica pérola, mais ou menos esquecida, entre as águas frescas do oceano Atlântico, as velhas areias do deserto mais antigo do mundo (o deserto do Namibe, que se divide entre Angola e a Namíbia) e as ricas tradições milenares de quem ali se estabeleceu ao longo dos tempos.
Há cerca de 20 anos que Paulo Murias e família - a Fazenda Cruz é gerida pelo filho mais novo - instalaram-se no vale do rio Bero, uma das duas únicas bacias hidrográficas (a outra é a do rio Giraul) daquela zona do País. "O Namibe era dos poucos locais que produzia azeitona e uvas no tempo colonial", recorda Paulo Murias em conversa com o Expansão, como que a justificar a localização do empreendimento.
A falta de aposta na produção local deste tipo de bebidas também está associada à história político-económica do colonialismo, já que Portugal utilizava as antigas colónias para exportar excedentes, muitas vezes de má qualidade e alto teor alcoólico, para reforçar os cofres da metrópole e reforçar as estratégias de controlo social dos angolanos. As bebidas alcoólicas nativas, extraídas a partir de frutos sem qualquer relação com a produção de vinho, também foram combatidas. À primeira vista, até a imagem de Paulo Murias condiz melhor com as experiências passadas enquanto atleta (basquetebol) e especialista em medicina desportiva.
Durante algum tempo, na década de 1980, foi mesmo director do Centro Nacional de Medicina Desportiva e depois seguiu a vida de empresário na saúde e no ensino superior. É um dos principais accionistas da Universidade Lusíada de Angola. "A fazenda comporta um total de 160 hectares. Temos 60 hectares de terras aráveis e 40 hectares efectivamente plantados com oliveiras e vinhas de origem portuguesa", explica Paulo Murias.
Numa primeira fase, investiu na produção de azeitonas e importou 14.000 pés de oliveira vindos da Cidade do Cabo, na África do Sul. Até ao momento sem qualquer rentabilidade. Há oito anos resolveu então avançar para a segunda cultura: as vinhas. "A nossa ideia, até pelo espaço disponível, foi sempre evitar produzir em quantidade para apostar na qualidade", sublinha o empresário, que para além do vinho também está de olho na produção de uvas de mesa.
Mas para conseguir um vinho de qualidade totalmente produzido em Angola foi necessário identificar especialistas (enólogos e vinicultores). E foi assim que o enólogo português Mário Andrade entrou na aventura.
(Leia o artigo integral na edição 666 do Expansão, de sexta-feira, dia 18 de Março de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)