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África

A desconfiança no governo nigeriano põe em causa a eNaira, a primeira moeda digital africana

eNaira, a primeira moeda digital africana

Quando os bancos centrais da Alemanha, França ou China testam a capacidade da moeda digital, a Nigéria faz o mesmo. E é o primeiro país africano a fazê-lo, mas paira algum cepticismo devido à falta de confiança no governo nigeriano e como isso pode afectar a adopção e evolução do eNaira

Com o lançamento do eNaira em 25 de Outubro, o Banco Central da Nigéria (CBN) ultrapassou muitos bancos centrais em todo o mundo e colocou-se ao lado da Alemanha, França ou China no que se refere à utilização da moeda digital, numa altura em que o desenvolvimento das moedas digitais oficiais estão a ganhar ritmo.

E na Nigéria, a iniciativa pode ser considerada como muito bem-sucedida, fontes oficiais referem-se mesmo ao assunto como um "sucesso retumbante".

De acordo com uma fonte do banco central nigeriano, foram registadas 400 mil novas carteiras em dezenas de países, com mais de 12.500 transações no valor de 46,3 milhões de nairas, o equivalente a cerca de 113.000 dólares, e isto apesar de algumas dificuldades no processo de inscrição e dos alertas de fraude.

Os analistas questionaram se a versão digital do naira - que tem o mesmo princípio da tecnologia blockchain, mas não é uma criptomoeda - pode cumprir os objectivos do banco central: reduzir os custos de transação, impulsionar os fluxos internacionais, em especial as remessas da diáspora, trazer mais pessoas para o sistema financeiro e permitir gastos sociais e de bem-estar mais direccionados.

"A questão é que tudo isso já pode ser tratado de forma adequada usando o sistema de pagamentos financeiros existente", disse Adedayo Ademuwagun, analista da Songhai Advisory, citado pelo Financial Times, e que acrescentou que a "Nigéria é a capital fintech de África, então conta já com tantas opções, tantas formas de pagamento, e tudo muito rápido."

No lançamento oficial do eNaira, o presidente nigeriano Muhammadu Buhari disse que a iniciativa poderia aumentar o produto interno bruto da Nigéria - que foi de 432 mil milhões de dólares em 2020 - em 29 mil milhões de dólares nos próximos 10 anos.

Mas mais da metade dos nigerianos não tem conta bancária formal, a economia informal representa mais da metade do PIB e 95% das transações ainda são feitas em dinheiro.

E há outras questões. O lançamento do eNaira ocorreu nove meses depois que o banco central nigeriano ter banido as criptomoedas, incluindo as Bitcoin, que foram usadas para financiar os protestos #EndSARS (um movimento da sociedade civil contra a brutalidade policial que varreu o país no ano passado), com o argumento de que colocavam em risco o sistema financeiro e poderiam ser usadas para financiar o terrorismo.

A Nigéria rapidamente se tornou um dos maiores mercados de criptomoedas do continente africano, com os nigerianos usando-as para contornar o controle de capitais, para obter alguma renda num país em que o desemprego é galopante ou para se protegerem do Naira que se deprecia todos os dias.

Pensa-se que o empenho do governo na moeda digital controlada pelo banco central faz parte de um plano mais vasto de maior controlo financeiro dos cidadãos.

Entretanto, os G7 estabeleceram no mês passado directrizes que visam assegurar o desenvolvimento do dinheiro digital sem provocar danos ao sistema monetária e financeiro tradicionais.

Razia Khan, economista-chefe para África e Médio Oriente do Standard Chartered Bank, opinou que os bancos centrais estavam só a reagir à "necessidade evidente de adoptar canais de pagamento digital" após a pandemia, e tentando "permanecer no comando do processo", até para que não se corra o risco de uma forma não regulada na adopção das moedas digitais.