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África

Morreu Abdelaziz Bouteflika, aos 84 anos. Presidente João Lourenço já exprimiu condolências

Uma longa história de vida que se confunde com a história da Argélia independente

Addelaziz Bouteflika governou a Argélia, que depende quase exclusivamente da receita petrolífera, que é cerca de 95% das exportações do país, durante 20 anos. Numa breve nota, o Presidente João Lourenço já exprimiu "profundas condolências ao Governo, ao Povo e à família enlutada, convicto de que o legado de Abdelaziz Bouteflika continuará a inspirar as gerações de patriotas da nação argelina."

Afastado do poder em 2019, após vinte anos no cargo, o homem que participou na luta da independência da Argélia, na década de 1950, e liderou uma brutal guerra civil, na década de 1990, morreu com 84 anos. A televisão estatal argelina deu a notícia sem grandes detalhes.

Ainda jovem, muito jovem, com 20 anos, Abdelaziz Bouteflika juntou-se ao Exército de Libertação Nacional na luta pela independência da Argélia contra o domínio colonial francês, na década de 1950, mais tarde, na década de 1990, viria a participar na sanguinolenta guerra civil que assolou o país. Seria depois eleito Presidente da Argélia, em 1990, e manteve-se no cargo por mais de 20 anos, contra tudo e contra todos e contra o seu próprio corpo que adoecia de forma visível.

Antes de ser eleito Presidente da Argélia, ascendeu logo após a independência, em 1962, ao cargo de ministro da Juventude e Desportos no governo de Ahmed Ben Bella, o primeiro Presidente eleito da Argélia. Chefiou as delegações argelinas nas negociações com os franceses e, em 1963, é nomeado ministro das Relações Exteriores, tinha 26 anos. A sua passagem por esse cargo ficou marcada por acusações de corrupção, de acordo com o Tribunal de Contas argelino, Bouteflika desviou milhões de dólares do Orçamento do Ministério, foi condenado ao exílio. Esteve seis anos fora da Argélia.

Voltou à Argélia em 1987, e voltou para o Comité Central da Frente de Libertação Nacional, o partido político que saiu do movimento de libertação. E é a partir daí que liderou o processo que impediu umas eleições que dariam a vitória ao partido islâmico, a Frente de Salvação Islâmica (FIS). A seguir, o país mergulhou numa brutal e cruenta guerra civil, em que morreram cerca de 200 mil argelinos.

Em 1999, ascendeu ao cargo de Presidente numas eleições muito contestadas. No entanto, nos primeiros anos do seu mandato promoveu a "reconciliação nacional", promovendo a amnistia para todos os antagonistas da guerra civil.

Em 2013 sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) em consequência do qual passou dois meses e meio num hospital francês e uns tantos meses para se recuperar, mantendo-se na presidência do país, mesmo que raramente fosse visto em público, deixando ao seu círculo íntimo o governo do país, assolado por vários escândalos de corrupção.

Em Abril de 2014, e apesar da sua debilidade física, Bouteflika decidiu concorrer a um quarto mandato para a presidência, e, nessa altura, a elite que governava o país, entre militares e elementos dos serviços de informação, divide-se. Ao mesmo tempo, os principais partidos da oposição recusam-se a apresentar os seus candidatos às eleições, e quando Bouteflika ganha com 81% dos votos, eles não reconhecem o resultado.

No entanto, Bouteflika assumiu o quarto mandato e permaneceu no poder. Até que em Fevereiro de 2019, os protestos subiram de tom, nessa altura, Bouteflika insiste em candidatar-se a um quinto mandato. A elite dividida em Abril de 2014, estava agora menos dividida e contra o presidente, e as ruas de Argel encheram-se de manifestantes em protesto contra a candidatura de um homem frágil e doente, que viajava para Genebra, para fazer exames médicos.

Os protestos de Abril nas ruas de Argel, e uma elite que não conseguia mais manter o decrépito presidente no cargo, funcionaram. Bouteflika foi afastado do cargo do Presidente da Argélia, ele que nasceu em 2 de Março de 1937, em Oujda, Marrocos, na altura também um protectorado francês, detalhe, o de ser marroquino, que Bouteflika suprimiu da sua biografia oficial.

O país que Bouteflika liderou durante duas décadas é hoje um país numa situação socioeconómica muito difícil, relacionada com a queda acentuadas das receitas provenientes da exportação de hidrocarbonetos, que representam cerca de 95% das exportações do país, e das restrições à actividade económica devido à pandemia da covid-19.

Números de 2020 dão uma taxa de inflação média de 2,6% e menos cerca de 500 mil empregos devido à paralisação da economia.

A Argélia, e à semelhança de outros países que vivem muito dependente dos seus recursos naturais, tem inúmeros problemas de transparência, com diversos monopólios e redes clientelares que põe em causa da distribuição da riqueza. Os anos mais recentes têm sido marcados por uma profunda crise social e económica, e esse também é o legado de Abdelaziz Bouteflika.