Transparência
Ouvimos frequentemente aos nomeados para os cargos de topo a expressão, "Agora é a minha vez!". As famílias deliram, os copos de champanhe enchem-se de sonhos e desejos consumistas, afinal vão ter acesso à "panela da sopa" e, no limite, o que lhes pode acontecer é serem exonerados por "conveniência de serviço".
Na semana em que começou o julgamento dos generais "Dino" e "Kopelipa", com a sombra de Manuel Vicente a pairar no ar, o FMI avança com um relatório muito crítico face ao que Angola está a fazer em termos de transparência e combate à corrupção nos últimos três anos, uma ideia que já foi escrita por vários especialistas nos media internacionais que acompanham o nosso País. O facto de não haver condenações, de os processos serem mais nas redes sociais do que nos tribunais, do trabalho do Tribunal de Contas não se sentir no controlo da gestão das instituições públicas, de não haver consequências da gestão danosa que muitos relatórios evidenciam contribui para este facto.
Para nós que vivemos neste mundo, não na cloud da propaganda instituicional e da comunicação social pública, ouvimos frequentemente aos nomeados para os cargos de topo a expressão, "Agora é a minha vez!". As famílias deliram, os copos de champanhe enchem-se de sonhos e desejos consumistas, afinal vão ter acesso à "panela da sopa" e, no limite, o que lhes pode acontecer é serem exonerados por "conveniência de serviço".
Um dia destes olhava tranquilamente para os relatórios e contas de algumas empresas públicas e perguntava-me, apenas a mim claro, porque como angolano também sinto uma vergonha colectiva: "Como é que uma empresa que dá sistematicamente prejuízo ainda distribui todos os anos bónus aos administradores, troca de carros de dois em dois anos (leia-se viaturas de luxo), aumenta o quadro de pessoal regularmente, tem não sei quantos consultores estrangeiros, etc., etc., etc..."
Dei comigo a pensar que quando alguém entra nestes cargos de topo raramente faz uma auditoria ao passado, nunca responsabiliza o seu antecessor, um pacto estranho, "se não fizer aos outros não me vão fazer a mim". Também nunca aproveita o que está para trás. Troca de equipa, troca de projectos, nomeia novas pessoas e muitos trocam mesmo de secretária, de cadeiras, de cortinados e de sala. Não vá ter mau olhado, explicou-me um dia um governante.
Este excessivo e prejudicial culto da personalidade, que vem de cima para baixo, valorizando as personalidades (leia-se os chefes) e desvalorizando as pessoas enquanto equipa, é claramente um obstáculo sério ao desenvolvimento. Os problemas de produtividade que temos em toda a nossa economia tem muito a ver com isto, quer se queira quer não. Esta falsa ideia do profeta, que saltou das igrejas para a gestão da coisa pública, permite que se faça tudo. E desresponsabiliza todos, porque os profetas perdoam a quem os adora e lhes é fiel. Podem ficar desiludidos, mas passa. Na verdade, acabam sempre por nos colocar num novo caminho (leia-se nomeação) para melhorarem o comportamento e poderem continuar a adorá-los...