Inflação, compensações felizes e absolutamente inexplicáveis
Sabemos que a inflação é sentida de forma diferente por cada pessoa e que variações de 1% ou 2% não são percebidas de forma homogénea. Porém, quando estamos perante variações da ordem dos 20% ou superiores e na generalidade das transacções torna-se impossível não aceitar a evidência! O mesmo acontece quando estamos perante qualquer outra variação qualitativa de preços.
Todas as evidências empíricas apresentadas pelas mais diferentes publicações apontaram para uma efectiva descida dos preços até Setembro de 2022 (deflação)! Por conservadorismo, corrigimos estes meses de 2022 para 0%! As mesmas evidências empíricas unânimes mostraram, em Junho de 2023, uma subida excepcional de todos os preços muito superior a 20%, que, mais uma vez por conservadorismo, corrigimos para 20%.
Observe-se o Gráfico 1 da inflação mensal corrigida pelo CINVESTEC. Note-se que colocámos a inflação de Junho de 2023 fora da escala para se poder apreciar melhor a variação dos preços nos restantes meses.
Com estas correcções, a inflação mensal cresce moderadamente a partir de Agosto de 2022, passando do patamar de 0,8% para 0,9% até Maio de 2023. Em Junho dispara de forma excepcional para 20%, regressando imediatamente aos valores "normais", mas subindo relativamente ao patamar de Maio de cerca de 1% para 2%, passando posteriormente a apresentar uma subida gradual que estabiliza em 2024 e apresenta uma inversão marcada da tendência em Maio.
Estranhamente, em Maio de 2024, a inflação mensal da rubrica de alimentação e bebidas não alcoólicas desce de uma média anual de 3,07% até Abril com um pico de 3,13% nesse mês, para 1,24% em Maio!
A inflação nesta rubrica, que tem um peso de mais de 55% na inflação, desce do seu valor mais alto para o seu valor mais baixo desde Maio de 2023, exactamente no momento em que a rubrica de transportes sobe 11%!
Com esta verdadeira dádiva dos céus, a inflação mensal em Maio desce de uma média anual de 2,56% para 2,49%, regressando ao patamar de Janeiro!
Felizmente há compensações felizes e absolutamente inexplicáveis nas nossas subidas de preços!
A variação trimestral do IPCN após o início da legislatura (3.º Trimestre de 2022) apresenta um comportamento convexo crescente, sendo estável entre o 4.º Trimestre de 2022 e o 1.º Trimestre de 2023 (2,5% e 2,6%, respectivamente) e fortemente crescente no 2.º Trimestre (3,3%); depois, apresenta um crescimento muito acentuado no 3.º Trimestre de 2023, saltando de 3,3% para 5,9% e posteriormente para 8% em Março de 2024 com tendência para estabilizar neste valor.
Um valor de 8% por trimestre corresponde a uma inflação anual de 36%!!
Efectivamente o valor homólogo da inflação com as correcções do CINVESTEC assume a forma do gráfico 2, onde se pode observar que a inflação desce de 20% para praticamente 0%, em 2022, depois inverte em 2023 para uma forte subida gradual, com um salto em Junho, e uma subida ainda mais acentuada em 2024, que atinge 54% em Maio!
Com os cálculos do INE, a variação acumulada dos preços nesta legislatura (desde Setembro de 2022), ou seja, em 1 ano e 8 meses, foi de quase 40% no total nacional, mas 52% em Luanda!
Com as correcções do CINVESTEC foi de 65% no total nacional! Claramente, as políticas de combate à inflação não resultaram neste período!
Causas da inflação em Angola
A causa determinante das variações dos preços continua a ser o fluxo de Moeda Externa (ME) para a economia, nomeadamente o proveniente dos rendimentos petrolíferos.
Contudo, se, até Setembro de 2023, esta influência se manifestou através da pressão sobre os preços de importação devido à desvalorização cambial, a partir dessa data foi a escassez provocada pela redução da importação de bens alimentares e medicamentos que determinou uma inflação crescente.
A taxa de câmbio estabilizou desde Julho de 2023, mas a taxa de inflação acelerou a partir de Setembro. A causa mais provável foi a escassez de bens alimentares e a protecção dos preços dos piores produtores internos provocada pela política: "se produz não se importa", consubstanciada no DP 213/23.
As importações de bens alimentares passam de um pico de 910 milhões de USD no 4.º Trimestre de 2022 para um mínimo de 430 milhões, no 4.º Trimestre de 2023 (-53%), sem descontar a inflação mundial de 6,9%. Esta redução das importações em cerca de 50% não foi evidentemente compensada pela produção interna de bens, que atinge 2,3% em volume para o conjunto da produção agrícola, pecuária, das pescas e da indústria transformadora (também maioritariamente alimentar). É esta redução absurda do volume de alimentos disponíveis que está a pressionar os preços para valores incomportáveis, sem qualquer fundamento económico, apenas pela prossecução de uma política económica excessiva. Alivie-se a importação de bens alimentares de grande consumo e reduza-se a importação de bens supérfluos e a inflação abrandará.
Leia o artigo integral na edição 781 do Expansão, de sexta-feira, dia 21 de Junho de 2024, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)